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Há 15 anos, Márcia Cristina Santana, 39 anos, não botava os pés numa sala de aula. Sem condições para bancar um preparatório para o vestibular, a universidade lhe parecia um sonho distante. Mas, no começo de 2005, ela ficou sabendo do cursinho para afrodescendentes, ofertado pela Associação Cultural de Negritude e Ação Popular (Acnap). "Nunca fui desse negócio de defender a minha raça, mas senti uma identificação ali", comenta. Sem o clima de competição dos pré-vestibulares tradicionais, Márcia sentiu-se à vontade para retomar os estudos.

Como resposta à desigualdade social, os chamados cursinhos alternativos têm se multiplicado pela cidade. Surgindo aqui e ali, na maioria das vezes pela iniciativa de ONGs, esses empreendimentos apostam na qualidade, no baixo custo e, principalmente, na proximidade das relações humanas.

O empenho dos alunos – muitos trabalham e por isso as aulas geralmente são à noite ou nos fins de semana – é recompensada com atenção redobrada dos mestres, a maioria voluntários. "O pessoal dizia ‘você vai perder o domingo, é louca’", conta Ana Cláudia Bento, 18, que ingressou no pré-vestibular que funciona na Vila Nossa Senhora da Luz, na Cidade Industrial de Curitiba.

Numa das regiões mais violentas da capital, a ação dos voluntários traz esperança para 25 jovens que nunca imaginaram fazer faculdade um dia. É o caso de Magda de Andrade Ferreira, 19, colega de Ana Cláudia. "Descobri que assimilo fácil os conteúdos", conta a estudante. "É preciso quebrar esse paradigma. Fazer o pessoal acreditar que pode", sentencia Alex Otto, 30, presidente da ONG Instituto Nação da Luz, promotora do cursinho.

André Luís dos Santos, 23, é aluno do curso de História da UFPR e dá aulas como voluntário no cursinho. Segundo ele, o objetivo não é somente aprovar no vestibular, mas também transformar os integrantes em agentes de transformação social. "O aluno tem que se ver como um membro da classe trabalhadora e ver no outro um companheiro, não um concorrente", destaca. Por isso, a integração de todos, incluindo a comunidade, é fundamental. Os estudantes participam de oficinas de teatro, montam grupos de estudo e outras ações bacanas.

As aulas de cidadania também costumam ser uma constante nos cursinhos alternativos. Na Vila das Torres, por exemplo, onde funciona o Cursão da Vila, especialistas dão palestras para os alunos e para a comunidade. Os temas são os mais diversos. De transgênicos a direitos humanos. "Nos quatro anos em que existe o cursinho passamos 21 alunos", orgulha-se Luiz Fernando Young, coordenador do Centro de Formação Santo Dias, onde funciona o pré-vestibular.

No caso do cursinho para afrodescendentes, o trabalho de preparação para ingressar no ensino superior público inclui um trabalho de militância. "Queremos que o aluno ajude outros negros quando estiver na universidade", diz Jaime Tadeu da Silva, coordenador do curso. Ele lembra que hoje em dia a maioria dos afrodescendentes se forma por instituições particulares. "Só em 2004 foram 575 ingressantes na UFPR. Há dez anos não chegavam a 50 por ano", afirma.

Aos poucos, os índices de aprovação dos cursinhos alternativos vão melhorando. De 90 alunos, o pré-vestibular da Acnap aprovou 25 alunos na primeira fase da UFPR em 2005. Outros 20 estudantes passaram na segunda etapa. No curso da Vila Nossa Senhora da Luz, foram dois aprovados num total de dez alunos. É trabalho de formiguinha: devagar e sempre.

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