Confira o relato de um disléxico, que conseguiu superar as dificuldades do transtorno
“Sou Cristian, formado em Engenharia da Computação, trabalho numa empresa multinacional e estou terminando meu mestrado em Inteligência Artificial. Muitos me perguntam se disléxico continua sendo disléxico depois de adulto. Respondo que essa é uma característica herdada, assim como a cor dos olhos. Será que dá para mudar a cor dos olhos depois de adulto? Não. Da mesma forma não se deixa de ser disléxico. Quando se é míope, dá para usar óculos para corrigir. O disléxico também pode desenvolver estratégias para compensar suas dificuldades.
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Ser disléxico, porém, não significa ser a-léxico. Ele tem dificuldade para ler de forma rápida e para escrever corretamente, mas é possível ler e escrever relativamente bem, quando isto é trabalhado na infância.
Lembro-me, na faculdade, que certa vez um professor entrou em sala esbravejando com uma pilha de provas na mão: quem foi o energúmeno que escreveu “pontifícia” com “S”. Ele não citou nomes, mas claro que eu sabia que havia sido eu.
Quando entrei na primeira série, tive alguma dificuldade para adquirir fluência na leitura. Lembro-me de minha “tia Lane”, que ficava muito preocupada que meus colegas já conseguiam ler um texto e eu apenas silabava. Quase toda semana ela chamava minha mãe e juntas construíam estratégias para melhorar minha leitura. A “tia Lane” teve muita paciência comigo, e, se hoje sou o que sou, devo muito a ela, pois teria sido muito fácil destruir minha autoestima, pela minha dificuldade.
Na segunda série, recordo da minha professora Solange. Ela também foi um encanto e soube compreender minha dificuldade. Nesta fase eu escrevia muito errado. Acho que tinha mais erros que palavras. Mas ela tinha uma enorme paciência e procurava sempre interpretar o que eu tinha escrito, para valorizar o conteúdo e não apenas chamar a atenção sobre meus erros. Também ela foi fundamental em minha vida, mostrando-me minha capacidade e estimulando-me a progredir. Apesar de meus escritos sempre parecerem ter varicela, de tão pintados que estavam, ela me tranquilizava e dizia que minhas ideias eram muito boas e que um dia eu conseguiria escrever com menos erros. Até no segundo grau eu ainda a encontrava pelos corredores e ela vinha me abraçar e perguntar como eu estava.
Sofrimento eu tive na terceira série. A professora chamava a minha atenção a cada cinco minutos. Ou porque eu estava sonhando (afinal tinha déficit de atenção) ou porque não tinha compreendido adequadamente uma questão que tinha lido ou porque minhas respostas tinham erros demais, ou ainda porque minha letra estava horrível (eu tinha dificuldade de motricidade fina). Por mais que minha mãe explicasse a ela minha dislexia, parece que ela esperava de mim sempre a perfeição. E esta eu não conseguia apresentar, por mais que me esforçasse. Lembro-me que comecei a ficar quieto, triste e não tinha mais vontade de ir para a escola. Nada que eu fazia estava bom para ela.
Aceitei contar isto para vocês, porque acho importante passar esta mensagem, de um disléxico adulto: vocês, professores, são muito mais importantes na vida de seus alunos do que podem imaginar!
Minha mãe, após muitas conversas com a professora e a escola e convencida que o mais importante para mim era a autoestima, trocou-me de turno, solicitando à escola que sugerisse uma professora com muita sensibilidade. Em agosto, passei a estudar pela manhã, em outra turma e a Professora Terezinha era um amor. Compreendeu que eu era capaz, que podia aprender, mas que sempre teria dificuldade com a tal da ortografia. Não me lembro de ela ter me chamado a atenção por causa disso. Claro que meus erros sempre foram corrigidos e que tinha apoio extraclasse, mas eu não era mais massacrado por causa disso.
Depois disso, voltei a gostar da escola e posso dizer que muito dos meus bons resultados atuais devo à postura da escola de total aceitação de minhas dificuldades. Investiram muito em mim, mas sempre me respeitaram como eu era.
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O filme “Como estrelas no céu, toda criança é especial” é um belo relato de um professor que ajuda e entende um estudante com dislexia
Leia a matéria completaNo período de quinta a oitava, nem todos os professores queriam acreditar que minhas dificuldades eram por causa da dislexia. Às vezes, sugeriam que não era possível que naquela fase eu ainda cometesse tantos erros, questionavam se isso não seria má vontade ou preguiça. Mas aí minha mãe entrava como uma leoa em minha defesa. Falava com os professores, levava material para eles lerem e insistia sempre no mesmo ponto: que jamais atacassem minha segurança emocional.
Como sempre soube que sou disléxico, era capaz de me defender quando alguém ria de mim por causa de meus erros. Com o tempo, comecei a rir junto. Quando escrevo devagar e releio o que escrevo, sou capaz de escrever, atualmente, quase sem erros. Mas, quando quero anotar algo com pressa, os erros reaparecem de montão. Entretanto, isto hoje em dia não é grave. O computador tem corretor de texto e em minha profissão não preciso escrever muito.
Lembro-me, na faculdade, que certa vez um professor entrou em sala esbravejando com uma pilha de provas na mão: quem foi o energúmeno que escreveu “pontifícia” com “S”. Ele não citou nomes, mas claro que eu sabia que havia sido eu. E daí? Minha nota na prova foi boa, apesar dos erros cometidos.
Aceitei contar isto para vocês, porque acho importante passar esta mensagem, de um disléxico adulto: vocês, professores, são muito mais importantes na vida de seus alunos do que podem imaginar! Procurem lembrar como vocês os gostariam de ver quando adultos e façam o que puderem para apoiá-los. O mais importante para isso é manter a segurança emocional. Lembrem-se, disléxico será sempre disléxico, mas poderá ser um adulto seguro e de bem consigo mesmo, apesar da dislexia.”
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