A Universidade Federal do ABC (UFABC) incluiu no curso de licenciatura em Matemática o ensino obrigatório de afro-etnomatemática, definida como o estudo de contribuições africanas e afrodescendentes à matemática. Com a mudança, o curso passa a ter duas novas disciplinas: Seminários em Modalidades Diversas em Matemática e Estudos Étnicos Raciais.
“Inúmeros estudos de grande credibilidade (...) atestam as contribuições milenares da África para a formação do conhecimento científico que se desenvolveu no resto do mundo, como por exemplo a construção das pirâmides do antigo Egito”, diz a proposta de criação da disciplina, que foi apresentada pelo Coletivo Negro Vozes e aprovada pela universidade.
A justificativa também inclui críticas à “supervalorização do pensamento de matriz europeia em detrimento da produção intelectual de origem africana”.
Cotas para quem? Classificação racial esbarra em critérios subjetivos https://t.co/5tZl5YSBjY pic.twitter.com/8b3uVCPgJl
â Ideias (@ideias_gp) July 3, 2017
Um dos objetivos da disciplina é “Problematizar e desenvolver metodologias e percepções que busquem a dialogar entre a educação e as relações sociais, buscando romper com os moldes da educação reprodutorado racismo”.
Cleyton Hércules Gontijo, professor da Universidade de Brasília (UnB) e mestre em Educação, afirma que a proposta atende uma das funções das universidades: atender às demandas da sociedade.
“Elas devem corresponder aos anseios, não só do mercado de trabalho, mas da sociedade como um todo. É interessante quando a comunidade se convence que essas temáticas específicas são importantes para serem discutidas nos programas de formação de professores”, diz.
Mas a adição de disciplinas à grade curricular é um ponto de controvérsia: com mais conteúdos a serem trabalhados, surge a possibilidade de não aprofundá-los com a qualidade necessária para a formação de professores.
“Em geral, a grade curricular dos cursos de graduação no Brasil está muito carregada. O pessoal estuda muita coisa, mas não estuda direito”, ressalta Adonai Schlup Sant'Anna, professor do Departamento de Matemática da Universidade Federal do Paraná (UFPR). “Simplesmente incluir novas disciplinas, principalmente se forem obrigatórias, é algo que, sem uma reavaliação da proposta do curso, não vai resolver nada.”
De acordo com Gontijo, o volume da grade curricular dos cursos de formação de professores deve suportar esse tipo de mudança. “A legislação brasileira estabelece uma carga horária bastante extensa para poder ter um vasto campo de elementos para além do conhecimento específico e técnico.”
Uso político?
A abordagem de temas relacionados ao combate ao racismo é outro ponto polêmico. “O que me preocupa nessa disciplina específica de afro-matemática é que na sua ementa está incluída a questão de combate ao racismo. Ali não existe uma preocupação apenas com o desenvolvimento matemático, mas existem também questões sociais”, aponta Sant’Anna.
Segundo ele, a atenção a temas de cunho social, pode levar a um ensino ideológico. “A matemática é tradicionalmente ensinada de uma maneira que os alunos são expostos a um ensino por si só já doutrinário, mas não necessariamente ideológico. O problema é se transformarem essa disciplina em caráter ideológico, o que não é muito difícil de acontecer”, conclui.
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