Depois de semanas de discussões acaloradas, o presidente de Comissão especial designada para apreciar o projeto do “Escola sem Partido”, deputado Marcos Rogério (DEM-RO), anunciou em reunião nesta terça-feira (11) que desistiu de marcar novas sessões para votar a proposta. Com isso, a atual legislatura será encerrada sem votar o projeto 7180/2014, sendo o mesmo arquivado, atitude que surpreendeu os deputados da base.
Em discurso no final da sessão, Rogério elogiou a oposição pelo papel realizado e criticou os colegas que se diziam favoráveis ao projeto, mas que não compareceram para apoiá-lo. Disse também ter certeza que um outro projeto do “Escola sem Partido” deverá ser apresentado pelos novos deputados em 2019.
Leia o texto que não chegou a ser votado em comissão da Câmara
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“Então eu faço esse registro para chegar ao final dessa sessão de hoje, já são 13 horas e 33 minutos, dizendo que cada um cumpriu o seu papel. E se essa matéria não será votada no âmbito dessa comissão, deputado Flavinho [relator do projeto], não será por falta de esforço de vossa Excelência, e não será também por consequência do trabalho da oposição, embora reconheço o grande papel que a oposição desempenhou aqui”, disse o deputado Marcos Rogério (DEM-RO).
“Se esse projeto não será votado nessa legislatura é por consequência da falta de compromisso dos deputados que são favoráveis à matéria. Que a oposição senta e fica sentada, ouvindo debatendo, dialogando, fazendo o papel deles no bom combate. Agora os parlamentares que são defensores desse projeto, com suas muitas tarefas (...) não conseguem ficar aqui para discutir, deliberar e votar a matéria”, continuou.
Marcada para começar às 9 horas, às 13h30 havia apenas 12 deputados dispostos a votar na sessão desta terça-feira; o quórum mínimo necessário era de 16 deputados. Esse cenário de falta de parlamentares para deliberação e votação se repetiu por várias sessões.
“Quem está sepultando o projeto nessa legislatura, obviamente que ele vai continuar na próxima, não é a oposição não. Quem não está deliberando sobre esta matéria são aqueles que têm a maioria neste parlamento e aqui não comparecem e permanecem. Digo isso com muito respeito e muita verdade. É preciso priorizar pautas. A oposição fez o papel dela, priorizou a pauta. Do nosso lado, infelizmente isso não aconteceu”.
Marcos Rogério afirmou ainda que o projeto de lei 7180/2014 era “equilibrado e coerente” e que não se poderia garantir o mesmo nível nas propostas que virão no futuro.
O projeto não votado
O projeto conhecido como “Escola sem Partido” pretendia combater a ideologização e a doutrinação na educação básica. Os meios utilizados, porém, eram bastante questionáveis pelo potencial de criar um clima policialesco em sala de aula que poderia abarrotar os tribunais de ações.
O texto original da iniciativa previa a afixação de um cartaz com os “seis deveres do professor” que estabelecem, por exemplo, que o professor não pode fazer propaganda político-partidária em sala de aula ou que respeitará o direito dos pais dos alunos a que os filhos recebam educação religiosa e moral de acordo com suas próprias convicções. Pretendia também que o professor apresentasse todas as versões existentes sobre um fato, de forma neutra – e sempre que não incluísse alguma, a proposta abriria espaço para o questionamento de pais e alunos.
No fim de outubro, o deputado Flavinho (PSC-SP) acrescentou mais uma polêmica ao texto: a proibição de ensinar em sala de aula a ideologia de gênero, “o termo ‘gênero’ ou ‘orientação sexual’”. Os livros didáticos também não poderiam abordar o tema.
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O tema rendeu discussões acaloradas na Comissão formada para analisar a proposta, especialmente depois do acréscimo das questões de gênero no texto.
Gritaria e protestos
Desde fevereiro, quando começaram os trabalhos da comissão, o clima de agressividade das sessões foi crescendo entre os deputados favoráveis e contrários ao projeto. Os favoráveis ao projeto insistiam em que o texto não trazia nenhuma inovação à Constituição, apenas clarificaria qual deveria ser o papel do professor em sala de aula. Os contrários ao projeto temiam que, caso a proposta fosse aprovada, os professores fossem punidos e perseguidos por manifestar suas opiniões, lembrando que não existe ensino “neutro”, nem à direita, nem à esquerda.
Há pelo menos seis sessões o presidente da comissão, o deputado Marcos Rogério (DEM-RO) tentava aprovar o projeto. Insistentemente, os deputados de oposição à proposta conseguiram obstruir a votação de várias formas, inclusive fisicamente.
Na última terça-feira (4), o deputado Glauber Rocha (PSOL-RJ) chegou a subir na mesa do presidente para protestar. Outros deputados se aproximaram também e começou um bate-boca com ameaças dos dois lados, o que levou ao fim da sessão.
Manifestantes de sindicatos dos professores também compareceram às sessões com cartazes como “Lei da Mordaça não”, “Não vão nos calar” ou “Marcos Rogério é machista”. Do outro lado, favoráveis ao Escola sem Partido apresentavam outros: “Ei, professores, deixem nossas crianças em paz!”, “Fascista é quem invade a reitoria”, “Educação sem ideologia de gênero. Escola sem partido, já!”.
Histórico
Fundado em 2004, o movimento que dá nome ao projeto 7180/2014, o Escola sem Partido, se dedica a reunir provas de doutrinação ideológica em sala de aula, como materiais didáticos, vídeos e testemunhos. O movimento é contrário, por exemplo, ao proselitismo político nas salas de aula e às abordagens de educação sexual nas escolas que oferecem uma disseminação da ideologia de gênero.
Esse combate passou praticamente despercebido até 2014, quando o deputado estadual Flavio Bolsonaro (PSC-RJ), eleito senador nas eleições deste ano, pelo Rio de Janeiro, apresentou um projeto de lei inspirado pelas ideias do movimento na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. A proposição, elaborada com base em um anteprojeto encomendado por Bolsonaro a Miguel Nagib, presidente do Escola sem Partido, colocou o movimento sob os holofotes e ajudou a divulgar os valores do grupo.
A consolidação do PESP desencadeou o aparecimento de uma série de projetos de lei em níveis municipal, estadual e federal. Eram 62 em agosto de 2017, de acordo com um levantamento realizado pelo portal De Olho nos Planos – dedicado a acompanhar as propostas políticas no campo da educação. Já o mapa criado pelo grupo Professores Contra o Escola Sem Partido (PCESP), que se posiciona como uma reação ao crescimento do PESP, contabiliza 124 projetos em prefeituras, 24 em estados e 12 em instâncias federais, na qual se inclui o projeto que estava sendo avaliado na comissão especial.
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