Superdotação: ponto de controvérsia | Foto: Pexels

Enquanto colegas ainda rabiscam as primeiras palavras, o garoto lê e escreve. Os amigos ainda aprendem a somar e subtrair, mas ele já divide e multiplica. Mães e pais, naturalmente, logo acreditam estar diante de uma criança superdotada. Mas na verdade, o mais provável é que ela seja apenas inteligente. 

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Nem sempre é fácil identificar um superdotado, em parte pelo método antiquado para medir níveis de inteligência, baseados em testes de QI; pesquisas realizadas nas últimas décadas em desenvolvimento e formação do intelecto indicam que inteligência vai além de pontuação em testes padronizados. A formação do cérebro é flexível, por isso o QI de um indivíduo varia com o tempo.

“Por quase um século, escolas usaram testes de QI como uma única medida”, diz Steven I. Pfeiffer, professor do departamento de psicologia educacional da Florida State University.  Ele afirma que o teste de QI, apesar de funcionar, tem muitas limitações.

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O termo “superdotado”, aliás, não está mais em voga – hoje, especialistas trabalham o conceito de “altas habilidades”, ideia que começou a ser difundida na década de 1980, com o livro “Estruturas da Mente - a Teoria das Inteligências Múltiplas”, do psicólogo Howard Gardner. 

No livro, Howard propõe a teoria de que existem pelo menos sete tipos de inteligência, cada uma independente das demais. Assim, uma pessoa que é considerada comum em um contexto pode ter altas habilidades em outro. 

O lado oposto dessa flexibilidade é uma abertura do que hoje é considerado altas habilidades. “Não existem mais crianças comuns”, aponta Devra Renner, assistente social e autor do livro “Mommy Guilt” (Culpa de mãe, em tradução livre), que trata sobre a nova relação entre mães e filhos. “É como se a palavra ‘bom’ fosse o novo ‘ruim’. Por que se contentar com ‘esperto’ quando você pode chamar seu filho de ‘superdotado’?”, indaga.

O início 

Crianças que apresentam altas habilidades durante a primeira fase escolar precisam ser encorajadas a desenvolvê-las, tanto na escola quanto em casa: estudo realizado no Reino Unido durante quinze anos mostra que o envolvimento dos pais nas atividades educativas dos filhos durante a pré-escola se reflete em resultados superiores nos testes nacionais ao final do ensino médio. Esse desempenho foi observado em todas as camadas sociais, com melhorias mais acentuadas entre estudantes de famílias de baixa renda. 

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“Elas apresentam padrões de desempenho superior ao de pessoas da mesma faixa etária e contexto social”, diz Solange Jacob, especialista em Intervenção Cognitiva e Aprendizagem Mediada. “Mas é preciso que haja constância de tais capacidades ao longo do tempo”, completa.

Efeito reverso 

Por outro lado, crianças com conhecimentos acima da média podem não ter o melhor desempenho na sala de aula. Em muitos casos, a falta de desafios no aprendizado leva a um estado de tédio que pode se transformar em problemas de comportamento e de desempenho. 

De modo similar, esse estado de tédio leva também ao abandono dos estudos. Pesquisas realizadas desde a década de 1990 nos Estados Unidos indicam que até 25% dos alunos com altas habilidades abandonam a escola antes do final do ensino médio. Esse índice é mais expressivo entre estudantes de baixa renda, que dependem de escolas públicas. 

“Crianças muito inteligentes geralmente ficam entediadas na escola pública tradicional, que costuma ser marcada por uma educação falha e informações descontextualizadas. Esse tédio pode se manifestar em crianças com altas habilidades como um comportamento disperso, falta de envolvimento com a aprendizagem ou uma apatia social”, diz Catherine M. Brighton, professora da Curry School of Education na Universidade da Virginia. 

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Habilidades distintas e múltiplas inteligências 

Além das diferenças de perfil, crianças podem expressar altas habilidades em áreas distintas. Enquanto os testes de QI focam em habilidades como matemática, linguagem e pensamento lógico, os estudantes podem ter desempenho superior em uma área de conhecimento e abaixo da média em outra. 

“Nenhuma criança com altas habilidades é igual a outra. Por exemplo, uma criança pode ter desempenho excepcional no aprendizado de vocabulário complexo, mas ter dificuldade com habilidades motoras ou em seguir uma rotina de organização”, explica Brighton.