A Universidade de São Paulo (USP) voltou atrás e resolveu confirmar a matrícula de candidatos aprovados no vestibular da instituição que cursarem o ensino médio em colégios militares efetivamente mantidos pelas Forças Armadas. A decisão da USP de cancelar matrículas de estudantes de escolas militares aprovados no vestibular pelo sistema de cotas sociais, por meio do Sistema de Seleção Unificado (Sisu), mobilizou na última quinta-feira (14) o Comando do Exército e o Ministério da Educação. As Forças Armadas identificaram na medida da universidade uma retaliação ao governo de Jair Bolsonaro. O sistema de cotas garante a vaga a estudantes de escolas públicas.
O Exército já foi informado pela USP da confirmação das matrículas.
Em nota, a USP comunicou que, “face às afirmações que se tornaram públicas e para garantir a lisura de seu processo de matrícula, todos os candidatos aprovados oriundos de colégios militares, vinculados e mantidos efetivamente pelas Forças Armadas, que se inscreveram no vestibular optando pela ação afirmativa para egressos de escolas públicas, tiveram a sua matrícula aceita, uma vez que atendem plenamente ao regramento estabelecido para o concurso vestibular 2019”.
LEIA TAMBÉM: 12 perguntas e respostas para entender o novo projeto Escola sem Partido
USP alega que havia suspeita de escolas privadas que se autodenominam militares
A USP explicou ainda que este ano decidiu analisar “caso a caso” as matrículas relativas a esse público em virtude de questionamentos recebidos pela Comissão de Acompanhamento do Vestibular da instituição. Segundo a nota, havia informações que davam conta da existência de instituições denominadas militares, mas que, na verdade, seriam administradas por entidades privadas e mantidas por mensalidades. “Por essa razão, os candidatos aprovados no vestibular, oriundos de escolas militares, tiveram a sua matrícula analisada caso a caso.
Os poucos casos de indeferimento de matrícula estão em análise, em função de recursos apresentados”, diz a USP no comunicado. Quanto à publicação da reportagem semana passada, a Pró-Reitoria de Graduação da USP havia alegado que as 12 escolas mantidas pelo Exército não se enquadrariam no sistema de cotas por serem mantidas por contribuições e quotas mensais pagas por pais de alunos.
ENTREVISTA: Por que as universidades devem defender a liberdade de expressão
Na reunião fechada no câmpus, que se estendeu ao longo da tarde da quinta, um representante do Comando do Exército do Sudeste, sediado em São Paulo, tentou convencer dirigentes da universidade a reverter a decisão, que afeta mais de 20 alunos, nas contas do Exército, ou dez, na estimativa da USP.
O governador de São Paulo, João Doria, foi acionado pelo Comando Militar, pois a universidade é mantida pelo estado. Ao mesmo tempo, os militares telefonaram para Brasília. Uma operação foi deflagrada à noite na capital federal pelos militares. O ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodriguez, também foi chamado e entrou para interferir a favor dos alunos.
Na quinta-feira, a universidade enviou e-mail aos estudantes para informar sobre o cancelamento da matrícula dos aprovados no concurso de acesso da instituição por meio das cotas de escolas públicas. Numa mensagem obtida pela reportagem, a universidade informa a um aluno aprovado no curso de Medicina que cancelou sua matrícula para não “burlar” a “finalidade das políticas de inclusão”.
O texto foi elaborado pela Comissão para o Monitoramento Operacional do Processo de Ingresso. O pró-reitor de Graduação, Edmund Chada Baracat, assinou a mensagem.
Procurada na ocasião, a direção da Universidade de São Paulo afirmou que o caso dos alunos ainda estava sob avaliação.
SAIBA MAIS: Lava Jato da educação: ministro pede ajuda de Moro para apurar desvios no ProUni
Exército destaca que STF reconheceu colégios militares como públicas
Ainda durante a reunião, o representante do Exército lembrou que, em outubro do ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que os colégios militares são escolas do ensino oficial. Um documento preparado pela direção do Comando do Sudeste citou que o plenário do Supremo julgou, por unanimidade, improcedente uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5082 contra a cobrança de contribuição obrigatória nos colégios militares.
O relator, ministro Edson Fachin, considerou que essas contribuições não configuram ofensa à regra constitucional da gratuidade do ensino e ratificou as escolas mantidas pelo Exército como estabelecimentos do ensino oficial.
Os militares afirmam que a medida da USP se trata de uma atitude inédita no país, pois o Exército nunca encontrou barreira semelhante por parte de outras instituições.
As aulas na universidade começam amanhã e os alunos aprovados e “desmatriculados” estavam sendo prejudicados.
STF inicia julgamento que pode ser golpe final contra liberdade de expressão nas redes
Plano pós-golpe previa Bolsonaro, Heleno e Braga Netto no comando, aponta PF
O Marco Civil da Internet e o ativismo judicial do STF contra a liberdade de expressão
Putin repete estratégia de Stalin para enviar tropas norte-coreanas “disfarçadas” para a guerra da Ucrânia