Mudar o horário do começo das aulas em 55 minutos é o suficiente para melhorar as notas e reduzir as faltas de estudantes. Essa foi a conclusão a que chegou um estudo realizado com duas escolas de ensino médio de Seattle, nos Estados Unidos.
Publicado em dezembro de 2018, o trabalho monitorou os alunos em 2016, antes da mudança, e logo no ano seguinte, quando a hora de início das aulas mudou, de 7h50 para 8h45.
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Realizada por sete pesquisadores, ligados à Universidade de Washington e ao Instituto Salk para Pesquisas Biológicas, da Califórnia, a análise concluiu que, com a mudança, os estudantes dormiram 34 minutos a mais, o suficiente para saltar de 6h50 para 7h24 de sono, mais próximo das nove horas ideais para um adolescente e tempo suficiente para aumentar o desempenho nas notas em 4,5%, em média.
Em um dos dois colégios pesquisados, o número de faltas diminuiu de 15,5 dias, por aluno, para 13,6. E os atrasos registrados, de 6,2 para 4,3 por aluno, por ano. Os pesquisadores não identificaram diferenças significativas nos resultados por sexo ou por idade, o que sugere que os benefícios são amplos e atingem todos os alunos.
“Esses resultados demonstram que adiar o horário de início das aulas traz os estudantes mais perto do tempo de sono recomendável e revertem uma tendência centenária de perda gradual do tempo de sono”, afirmam os autores da pesquisa chamada "Sleepmore in Seattle: Later school start times are associated with more sleep and better performance in high school students".
Por que meia hora a mais de sono faz tanta diferença? A resposta é simples, dizem os pesquisadores: quanto mais perto do tempo de repouso recomendado, mais os alunos experimentam um ciclo de sono mais adequado, o que reduz o chamado “jet leg social” e reduz a sonolência matinal. “Estudantes mais descansados e alertas têm melhor performance acadêmica”, afirma a pesquisa. Além disso, a mudança no horário reduz as faltas – afinal, alunos que perdem a hora desistem de aparecer, o que faz com que percam todo o dia de estudos.
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Mudança hormonal
Mas os adolescentes não poderiam simplesmente dormir mais cedo? Não. Mudanças hormonais mudam o padrão de sono e fazem com que os alunos, principalmente do ensino médio, encontrem grande dificuldade em fechar os olhos no horário adequado.
Respeitar esse ciclo, com o objetivo de maximizar o desempenho dos estudantes, é tão importante quanto o cuidado que as escolas têm com alimentação deles. É o que afirma Fernando Louzada, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) que há mais de duas décadas estuda a conexão entre sono e aprendizagem.
“Existe uma série de mudanças hormonais que fazem com que o adolescente tenha dificuldade de dormir cedo. Ele precisaria dormir às 21h se tiver que acordar às 6h para ir para a escola, e geralmente não consegue”, afirma. “O sono garante a consolidação da memorização e do aprendizado. Por isso existe um movimento, principalmente nos Estados Unidos, para que as escolas não comecem as atividades antes das 8h30”.
Medida "polêmica"
Mesmo nos Estados Unidos, a medida, que conta com o apoio da Academia Americana de Pediatria, ainda provoca polêmica. Na Califórnia, por exemplo, uma lei obrigando as instituições a abrir as portas só depois das 8h30 para alunos acima de 12 anos foi aprovada pelo poder legislativo, mas posteriormente vetada pelo governador.
O foco das propostas, em geral, é nos adolescentes, porque, em teoria, crianças menores não teriam a mesma dificuldade em dormir mais cedo. Mas Fernando Louzada afirma que crianças menores precisam de 9 a 12 horas de sono e também se beneficiariam de um horário diferente para o início das aulas.
No Brasil, essa ainda é uma discussão tímida, ainda que, desde 2017, a Associação Brasileira do Sono (ABS) atue como defensora da mudança de horário para estudantes do sétimo ao nono ano do Ensino Fundamental e dos três anos do Ensino Médio. “Muitas vezes o adolescente precisa acordar às 5h30 para chegar à escola às 7h. Depois cochila à tarde, o que dificulta dormir cedo à noite”, afirma a neurologista Márcia Assis, membro da diretoria da regional da ABS no Paraná.
“Esse adolescente que dorme mal é mais irritadiço, tem mais dificuldade para prestar atenção nas aulas, tem imunidade mais baixa, é menos ativo e tende a ganhar peso. É um ciclo vicioso. Nossa proposta é as escolas começarem as aulas um pouco mais tarde”, diz. Enquanto as escolas não mudam, afirma a neurologista, as famílias poderiam fazer um esforço adicional para melhorar a qualidade do sono. “Dormir mais cedo, afastar o celular, tirar cochilos mais curtos, teria um impacto muito positivo para os estudantes”.
Para o professor Fernando Louzada, o ideal seria oferecer opções para os alunos. “Como já acontece no mundo corporativo faz tempo, os estudantes poderiam escolher o melhor horário para começar as aulas”, propõe. “Essa mudança envolve toda a comunidade, os pais, os professores e funcionários, mas é possível, principalmente com a mudança no currículo do ensino médio, que é mais flexível. Com o avanço do mundo digital, não vai fazer sentido as crianças ficarem tanto tempo juntas nas escolas, e a diminuição das atividades presenciais permitiria respeitar a rotina pessoal de cada estudante”.
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