Apesar de não ter aderido ao programa federal de implantação de escolas cívico-militares, a Bahia foi o estado que mais avançou na militarização de escolas em 2019. Em parceria com prefeituras do estado, a Polícia Militar implementou o sistema educacional do Colégio da Polícia Militar (CPM) em 79 escolas municipais do ensino fundamental II (6º ao 9º ano) no ano passado. Com as cinco escolas municipais militarizadas em 2018, os 15 colégios estaduais da Polícia Militar e o Colégio Militar de Salvador, já são quase 100 escolas -- 99 até o momento -- com regras militares no estado governador por Rui Costa (PT).
“Temos 15 colégios da Polícia Militar estaduais. Na legislação, há a permissão para 17, tínhamos dois para serem criados. Vários municípios solicitaram ao Comando-Geral [da Polícia Militar da Bahia] a instalação de uma dessas duas novas unidades, não tínhamos como atender. Então criamos essa alternativa, aprovada pelo governador, pela Secretaria de Educação, pela Casa Civil, que deram o aval para que fizéssemos essa parceria com as prefeituras”, explica o gestor do Projeto de Implantação do Sistema de Ensino CPM nos municípios baianos, tenente-coronel Ricardo Albuquerque.
Em setembro, o Ministério da Educação abriu credenciamento para escolas estaduais interessadas em implementar o sistema cívico-militar. O governo federal tem o objetivo de instalar 216 escolas deste modelo no país até 2023, investindo R$ 1 milhão por escola. O governo da Bahia não credenciou nenhuma escola. Em nota, a Secretaria da Educação do Estado da Bahia informou que não houve adesão das escolas estaduais e que está buscando, junto ao MEC, mais informações sobre os aspectos pedagógico e financeiro do programa.
Sem discutir a decisão política de não aderir ao sistema cívico-militar federal, Albuquerque aponta as diferenças entre o modelo implantado na Bahia e o proposto pelo governo federal. “Primeiro que começamos em 2017 e implementamos a primeira em março de 2018, muito antes da iniciativa do governo federal. A grande diferença é que deixamos toda a responsabilidade da parte pedagógica com a direção da escola. Atuamos apenas na questão disciplinar”, diz.
“A participação do estado se dá através da Polícia Militar, que é o único órgão do estado envolvido no processo. Firmamos parceria com a prefeitura. A direção escolar fica com a parte pedagógica e administrativa, e nós [PM] ficamos com a parte disciplinar. Então damos todo um contexto de formação, para que os alunos sejam entregues em sala de aula prontos para receber as instruções dos professores", explica.
A militarização das escolas municipais da Bahia se dá via adesão do município e após audiência pública com a comunidade, que precisa aprovar a mudança. “Além disso, só implantamos nosso sistema em comunidades em que haja uma outra escola, "normal", para as famílias que não quiserem colocar seus filhos em uma escola com regras militares”, conta Albuquerque.
A participação militar nas escolas ocorre com a presença de três figuras: um diretor disciplinar, um coordenador disciplinar e tutores (um tutor para cada seis turmas). São todos militares da reserva, que passam por curso de capacitação para a função e são contratados pelo município, recebendo, além de seu soldo, uma remuneração de cargo em comissão que varia entre R$ 2 mil e 3 mil.
Segundo o tenente-coronel, essa atuação faz parte da missão de atuação preventiva do policiamento comunitário, promovendo “formação, convivência e civismo nos jovens para evitar a ocorrência de crimes”. Ele disse que a busca tem sido intensa por parte das secretarias municipais de educação, que relatam grandes problemas disciplinares nas escolas.
Questionado por que é necessário a presença de militares para garantir a disciplina nas escolas, o tenente-coronel resume: “Porque, até hoje, não conseguiram. Não sei se eles não sabem se impor, se não sabem controlar, mas a indisciplina reinava, e, agora, com a presença do nosso pessoal, a disciplina se se impõe com naturalidade”.
As escolas com sistema militar na Bahia possuem um rígido regimento disciplinar, que determina, inclusive questões como vestimenta, corte de cabelo, penteado e, até comportamento fora do ambiente escolar, como as redes sociais, por exemplo. Tais imposições foram vistas como abuso pelo Ministério Público Federal, que emitiu recomendação para que as escolas se abstenham de estabelecer regras estéticas e ideológicas para seus alunos.
“Temos um regimento disciplinar. Eles (alunos) têm conhecimento e têm todo um contexto do que é permitido e do que é considerado falta e quais as consequências. Fazemos sugestão de comportamento, temos padrões próprios de uniforme e controlar aparência faz parte deste contexto. Não posso colocar um boné em um cabelo demasiadamente grande, por exemplo. E o boné faz parte do uniforme e é obrigatório em alguns de nossos ritos”, justifica, dizendo que as punições são graduais e comemorando que, até hoje, não houve nenhum caso de expulsão.
Em nota enviada à Gazeta do Povo, a Secretaria de Educação da Bahia confirmou que não aderiu ao programa de escolas cívico-militares do governo federal, tendo solicitado detalhes ao MEC sobre os aspectos pedagógicos da proposta. A secretaria informa que, "a partir de uma demanda dos municípios baianos, a Polícia Militar da Bahia criou, em 2018, o Sistema de Ensino da rede dos Colégios da Polícia Militar. O projeto é realizado em parceria com os municípios baianos e a PM não arca com nenhum recurso, apenas cede os policiais militares da reserva para que atuem como tutores disciplinares nas unidades escolares dos municípios".
A secretaria destaca que as questões administrativas e os aspectos pedagógicos continuam sendo de responsabilidade dos gestores escolares e antes de atuarem nas escolas municipais do Ensino Fundamental II (6º ao 9º ano), os policiais da reserva passam por formação. "Destaca-se, ainda, que os convênios entre a Polícia Militar e os municípios para o Programa Nacional das Escolas Cívico Militares, ocorrem entre ambos, PM e as prefeituras", diz a nota.
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