Pais de alunos, professores e diretores de escolas cívico-militares pelo Brasil lamentaram a notícia, divulgada nesta quarta-feira (12), de que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pretende encerrar o Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (Pecim), criado pelo Ministério da Educação (MEC) durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O sentimento de decepção foi unânime entre os consultados pela reportagem da Gazeta do Povo em colégios dos estados de Minas Gerais, Paraná e Mato Grosso do Sul. A parceria cívico-militar é avaliada, por quem vê de perto, como um caso incontestável de sucesso – algo raro no campo das políticas públicas de educação no Brasil.
Diretores civis de colégios que integram o Pecim afirmam que a parceria com militares trouxe benefícios significativos sob os pontos de vista de desempenho acadêmico, disciplinar, psicológico e de envolvimento das famílias e das comunidades no ambiente escolar. Um gestor que preferiu não se identificar garante que a parceria com os militares ajudou até mesmo a afastar o tráfico de drogas de sua escola.
Com a mudança, segundo os diretores, a procura por matrículas nas instituições aumentou consideravelmente.
Roseli Nery de Andrade Bento, diretora da Escola Municipal José de Souza Damy, em Corumbá (MS), conta que os profissionais que trabalham no colégio e os pais de alunos ficaram "chocados e muito tristes com a decisão do governo federal". A instituição integra o Pecim desde 2020.
Com a presença dos militares, segundo ela, o desempenho dos alunos melhorou notavelmente, e os problemas disciplinares mais graves praticamente desapareceram. "Não tem mais violência, não tem mais brigas aqui na escola, não temos evasão escolar. Mesmo na pandemia, nós tivemos um índice mínimo de evasão de alunos, e não teve reprovação. Os militares ajudaram muito", afirma Roseli.
Além disso, segundo ela, "houve uma adesão muito grande da comunidade". "Todos os pais apoiaram. A escola cívico-militar trouxe para a nossa comunidade a importância de trabalhar os valores, o espírito de liderança, de organização", diz.
Escolas antes violentas se tornaram atraentes para alunos e professores
Diretor-geral do Colégio Estadual Cívico-Militar Beatriz Faria Ansay, em Curitiba, Sandro Francisco Mira Junior conta que, por muito tempo, a instituição foi considerada uma das piores da capital paranaense, e que isso mudou após a parceria com os militares, que começou em 2019.
"Neste pouco tempo, a gente notou mudanças significativas, tanto na questão da aprendizagem quanto na questão da postura dos alunos. É um colégio que não atingia a meta do Ideb [Índice de Desenvolvimento da Educação Básica] nem no ensino fundamental, nem no médio, e a gente conseguiu isso em 2021. Também sofríamos muito com a questão de violência, tanto a violência física quanto a questão da depredação da escola, e hoje em dia esses índices de violência praticamente zeraram. Só temos notícias boas a respeito do programa e lamentamos muito essa decisão do governo federal", comenta.
A mudança, de acordo com ele, se reflete no número de pais interessados em matricular seus filhos. "Nós tínhamos um colégio que funcionava em três turnos e ele tinha cerca de 640, 650 matrículas. Hoje, nós temos um colégio que funciona em dois turnos, temos cerca de 1.450 alunos matriculados, e mais de 500 alunos em fila de espera", relata.
O representante comercial Wallace Silva, que é pai de aluno e atua no colegiado de pais da Escola Cívico-Militar Estadual Padre José Maria de Man, em Contagem (MG), relata que o envolvimento da comunidade aumentou consideravelmente com a presença dos militares.
O colégio, segundo ele, chegava a ocupar as páginas dos jornais locais pelo excesso de violência. Havia casos, por exemplo, de estudantes que soltavam bombas dentro da escola.
A parceria com os militares acabou com casos do tipo. Com a mudança, a instituição passou de 412 alunos a 897, e a procura por matrículas quase triplicou. O interesse de professores em integrar o corpo docente do colégio também aumentou, já que a formação humana em valores e a melhora no aspecto disciplinar facilitaram o processo pedagógico.
Além disso, como parte do Pecim, estudantes do ensino médio têm sido formados para o mercado de trabalho: cerca de 300 alunos do Padre José Maria de Man já participaram de programas para jovens aprendizes em empresas da região.
Ideia da "militarização" da escola é preconceituosa, dizem diretores
Os relatos dos professores são confirmados pelos números apresentados pelo MEC no fim de 2022: segundo o órgão, as escolas atendidas pelo Pecim tiveram uma redução de 82% nos casos de violência física, uma diminuição de 75% nas denúncias de violência verbal, e uma redução de 82% nos casos de depredação do patrimônio da escola. Além disso, a evasão e o abandono escolar diminuíram em quase 80%.
Os gestores consultados pela Gazeta do Povo rechaçam de pronto a ideia de que a melhora no aspecto disciplinar se deva a um excesso de rigidez ou a um processo de "militarização" das escolas. Eles garantem que o caráter civil do colégio permanece evidente, ainda que alguns militares façam parte do dia a dia das escolas.
"Os militares ouvem os alunos. Eles não trazem uma rigidez na atitude deles. São pessoas sérias, mas não é aquela questão de ficar vigiando se o aluno chiou ou não chiou. Não é isso o que funciona. Eles trabalham valores como o respeito, a responsabilidade, a organização, mas não para o aluno obedecer cegamente. De forma alguma. Aqui os alunos têm liberdade e são levados ao questionamento, são despertados para isso", afirma Roseli Nery.
Segundo Meira Junior, "a relação que nós temos dos alunos com os monitores militares é uma relação de amizade". "Você vê os monitores aconselhando os alunos, buscando o melhor para os alunos, e a recíproca também acontece. No final do ano passado, um monitor [militar] teve que sair do colégio, não teve o contrato renovado, e os alunos prepararam uma homenagem que levou todo mundo às lágrimas. Essa relação de amizade que foi construída é que faz com que o programa tenha o sucesso", garante ele.
Um segredo do êxito do programa, segundo o diretor, é a participação dos monitores militares na coordenação de atividades extracurriculares gratuitas – o colégio conta hoje, por exemplo, com clube de xadrez, banda musical e aulas de jiu-jitsu e taekwondo. "Hoje nós temos seis atividades que são voluntárias dentro do colégio, sendo que três delas são conduzidas por militares. Eles vêm aos sábados de forma voluntária para trabalhar com os alunos", relata.
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