Em uma reunião conturbada nesta terça-feira (13), com protestos e gritaria, o projeto conhecido como “Escola sem Partido” teve sua votação adiada pela terceira vez, em comissão especial na Câmara dos Deputados.
O texto é um substitutivo da proposta original, apresentado nas últimas semanas, redigido pelo relator do projeto, o deputado Flavinho (PSC-SP).
O relatório produzido pelo parlamentar, ao mesmo tempo em que manteve a sugestão original, a afixação de um cartaz especificando seis deveres do professor, como “não cooptar os alunos para nenhuma corrente política, ideológica ou partidária”, inclui vetar qualquer menção aos termos “gênero” ou “orientação sexual” no conteúdo das matérias.
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Na prática, o projeto acrescenta o seguinte inciso ao artigo 3º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (lei 9.394 de 1996):
XIV - respeito às crenças religiosas e às convicções morais, filosóficas e políticas dos alunos, de seus pais ou responsáveis, tendo os valores de ordem familiar precedência sobre a educação escolar nos aspectos relacionados à educação moral, sexual e religiosa.
A sessão começou um pouco depois das 10h30 da manhã, quando o quórum de 16 deputados foi atingido, e interrompida no início da tarde. Os deputados se reuniram novamente no fim do dia, após terminarem os trabalhos no plenário da Câmara, para tentar votá-lo – mas não houve quórum.
Tumulto e tentativas de obstrução
As duas partes da discussão contaram com a presença de manifestantes favoráveis e contrários ao projeto, dentro e fora do recinto.
O vice-presidente da comissão, deputado Pastor Eurico (Patriota-PE), que presidiu a maior parte dos trabalhos da comissão pela manhã, chegou a pedir aos seguranças que afastassem o grupo que protestava ao lado de fora do plenário da comissão e ameaçou retirar quem estava dentro, caso causasse tumulto. Deputados do PSOL, PT e PCdoB apresentaram diversas questões de ordem, na tentativa de postergar a votação.
A deputada Alice Portugal (PCdoB-BA) mencionou a Constituição para dizer que o projeto seria inconstitucional por impedir o pluralismo de ideias e citou matéria jornalística que afirmava que o Supremo Tribunal Federal (STF) iria vetar a proposta. A deputada Érika Kokay (PT-DF) afirmou que nem a ditadura “ousou tanto” em tentar “amordaçar professores”.
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Em resposta, o deputado Flavinho disse que, em sua opinião, o STF não poderia considerar inconstitucional aquilo que não foi votado no Congresso. “O STF, através de um ministro de um viés ideológico de esquerda, está usurpando o que é dever do Legislativo”, afirmou.
Para ele, o projeto não impede o pluralismo de ideias, pois não criminalizaria, não tocaria a liberdade de cátedra e nem na liberdade de expressão do professor. Já o deputado Rogério Marinho (PSDB-RN) defendeu que, apesar de a Constituição assegurar a pluralidade de ideias, isso não ocorre hoje nas escolas.
“O que se estabeleceu no Brasil é uma hegemonia de uma corrente de pensamento que simplesmente impede a pluralidade”, afirmou.
“É triste que estejamos aqui discutindo esse assunto, porque a própria Constituição assegura essa pluralidade. Mas a toda ação corresponde uma reação. Alguns segmentos da sociedade se apropriaram das academias, com um efeito deletério, ríspido, forte, na qualidade da educação do Brasil. É um crime que é cometido contra as crianças por meio da negação da educação de qualidade”, argumentou.
O líder do Podemos, o deputado João Carlos Bacelar Batista (BA), contestou que o projeto de lei transforma o professor em “bode expiatório das mazelas seculares da educação no Brasil”. Ele diz que o projeto “beira ao ridículo” ao proibir o uso da palavra gênero. “É gênero musical? É gênero literário? É gênero alimentício?”, perguntou. Ele disse que era uma pena o Congresso estar discutindo esse tema ao invés de outros temas mais urgentes no campo da educação.
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