Eu preparava o jantar uma noite quando percebi que pairava no ar um silêncio perturbador, com o único ruído vindo do hambúrguer na frigideira. Meu marido e minha filha estavam a apenas uns seis metros de distância de mim, mas ninguém dizia uma única palavra. Estavam ambos envolvidos no que eu gosto de chamar de sua hora de silêncio. Meu filho, por outro lado, é outra história. Ele estava do lado de fora, falando sozinho enquanto brincava com os caminhõezinhos na terra. Quando ele e eu estamos no mesmo cômodo, é uma tagarelice sem fim, e tenho certeza que isso incomoda a outra metade da família.
O que aprendi em meu casamento com um homem introvertido e sendo mãe de uma menina introvertida é bem simples: às vezes eles só querem ficar em paz, na deles. Não tem nada a ver com timidez, depressão, ansiedade ou arrogância, mas sim com aquilo que os deixa confortáveis, bem como sua necessidade de estar num ambiente com menos estímulos. Quando eles decidem conversar, as palavras são carregadas de sentido, as perguntas são importantes, e os pensamentos que eles compartilham, inestimáveis. Aprendi a interpretar sua linguagem corporal para entender quando estou invadindo o seu espaço – recuar em relação às minhas necessidades e respeitar as deles.
Em resumo, o introvertido recarrega suas energias passando um tempo sozinho, enquanto o extrovertido gera energia a partir das suas interações. Os introvertidos têm uma preferência pelo silêncio, no lugar de atividade e barulho. O nosso mundo pode ser um desafio para eles. Dizemos às crianças o tempo inteiro que elas precisam ser mais sociáveis e que precisam sair mais, compartilhar seus sentimentos e se expressar verbalmente. Encorajamos o aprendizado cooperativo, em equipes e comunidades. Ficamos preocupados quando vemos uma criança solitária que fica sentada sozinha todo dia.
O mundo está cheio de extrovertidos, e os introvertidos têm consciência disso – tanto que até dói. Muitas vezes há a crença injusta de que essas crianças têm uma menor habilidade social. Assim, em vez de compreendermos e respeitarmos o seu mundo, tentamos obrigá-las a mudar para que se encaixem no nosso.
A maioria das crianças (e adultos) tem um pouco de ambas as coisas e revelam aspectos diferentes de si mesmos em situações variadas. As crianças que costumam ter mais qualidades introvertidas se veem diante de muitos desafios na escola porque, com muita frequência, as qualidades das crianças extrovertidas são mais valorizadas do que as delas.
Através de tentativa e erro, eu aprendi algumas coisas que me permitiram fortalecer a relação com minha filha, em vez de só tentar preencher a lacuna entre nós. Descobri que, quando eu lhe dou tempo para responder a alguma pergunta, em vez de esperar uma resposta rápida, ela se sente mais respeitada. Os introvertidos costumam parar para pensar nas coisas e não abrem a boca até saberem exatamente o que é que querem dizer. Também aprendi a não terminar as suas frases por ela, que é algo com que eu ainda tenho dificuldades. Nas conversas em que eu peço para que ela reflita sobre alguma coisa, eu descobri que é melhor para ela quando conto alguma história ou falo de mim mesma, que assim ela pode se situar num ponto em que se sente segura e que lhe parece certo. Fazer perguntas demais para uma pessoa introvertida só faz com que ela se afaste ainda mais.
Minha filha me ensinou muito sobre o mundo quieto e maravilhoso dos introvertidos: o poder da reflexão e da consciência; a beleza do espaço e de se fazer menos barulho. Descobri que é possível vislumbrar o seu mundo se eu não exigir mais do que ela pode dar, com revelações incríveis como resultado.
Recentemente eu encontrei a professora da minha filha, que está na segunda série, e conversamos sobre como ela interage na sala de aula. A professora me confidenciou que, na metade das vezes, ela prefere trabalhar sozinha e que parece estar bem assim. Essa escolha pelo espaço e pelo silêncio precisa ser respeitada pelos pais e educadores. Minha filha tem sorte de ter uma professora que a conhece bem e compreende sua necessidade de trabalhar sozinha. Ela entende que não é uma questão de ser tímida ou antissocial, que é apenas o jeito da minha filha atuar no mundo. Os introvertidos se comportam assim por conta de seu temperamento natural. Quanto mais acolhermos essa natureza, mais felizes eles serão.
Aqui seguem nove dicas que aprendi para lidar com crianças introvertidas:
1. Aceite que o problema não é você. Não leve a natureza quieta da criança para o lado pessoal ou como indicativo de que ela está lhe ignorando.
2. Apresente a criança a pessoas e situações novas com calma.
3. Ensine às crianças introvertidas que elas podem dar um tempo nas situações sociais, se se sentirem esgotadas ou exaustas por causa delas.
4. Ajude a criança a encontrar os lados positivos de ser introvertida.
5. Não rotule os introvertidos como tímidos – e os encoraje a corrigir esse rótulo quando os outros o utilizarem.
6. Converse com os professores da criança. As parcerias que eu criei com os educadores da minha filha acabaram fazendo toda a diferença para ela. Suas primeiras experiências na escola vêm sendo positivas por causa do respeito e da compreensão que eles demonstram. Além disso, quando a professora está ciente de que a criança é introvertida, ela pode ajudá-la a lidar com desafios como interações com amigos, participação em trabalhos em grupo e apresentações em sala.
7. Ajudem-nas a serem ouvidas. Os introvertidos “vivem internamente, e precisam que outras pessoas as tragam para fora”, escreve Marti Olsen Laney em seu livro “The Hidden Gifts of the Introverted Child” [“Os dons ocultos da criança introvertida”, em tradução livre, ainda inédito no Brasil]. “Sem pais que deem ouvidos e rebatam de volta o que elas estão pensando, como um eco, elas podem acabar se perdendo dentro de suas próprias cabeças”, acrescenta Laney.
8. Adote a ideia de que elas podem ter poucas amizades por vez. Pais muito sociáveis e que têm muitos amigos às vezes sofrem quando veem que seus filhos não se socializam do mesmo modo. Com frequência, crianças introvertidas aproveitam melhor o seu mundo tendo apenas alguns poucos amigos próximos.
9. Entenda que é possível que elas não venham pedir ajuda.
Acredito que a coisa mais importante que aprendi foi a apreciar o silêncio, e você também pode fazer o mesmo e reconhecer que muito pode ser dito com menos barulho. Podemos aprender com os dons ocultos e a natureza quieta de nossos filhos introvertidos.
*** Sara Lindberg é conselheira escolar, mãe de dois filhos e autora de um blog sobre a experiência da maternidade. Seu perfil no Twitter é @FitMomWay.