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Como os presidenciáveis querem melhorar o ensino básico no Brasil

Candidatos prometem salários maiores para os professores, mais recursos e melhorias na gestão. Dá para confiar? | Marcelo Andrade
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Candidatos prometem salários maiores para os professores, mais recursos e melhorias na gestão. Dá para confiar? (Foto: Marcelo Andrade Gazeta do Povo)

Em época de eleições, a educação invariavelmente aparece entre os temas mais comentados pelos candidatos – muitos divergem nas ideias, mas algumas propostas costumam se repetir nos programas. 

Hoje, uma das posições próximas do consenso é a ideia de que o Brasil parece inverter sua prioridade no investimento na área: enquanto o ensino superior é foco da maior parte dos projetos e investimentos, o ensino básico ainda patina. A questão que se impõe é: como, exatamente, possibilitar a melhoria das escolas para além do discurso genérico de aumentar recursos? 

Abaixo, listamos algumas das ideias que se repetem – com pequenas variações – nos discursos de campanha, bem como os problemas que elas tentam combater e os efeitos possíveis dessas medidas na rotina do ensino básico.  

Escola em tempo integral  

No Brasil, a escola de tempo integral é definida como aquela em que o estudante passa uma média de sete horas diárias em aulas e atividades relacionadas à rotina educacional. Aumentar esse tempo tem sido uma bandeira de governos municipais e estaduais, e também do federal – a maioria dos candidatos em 2018 inclui trechos em seus programas prometendo aumentar substancialmente a permanência dos jovens em seu local de estudo, e alguns prometem que 100% das matrículas serão de tempo integral até o fim de seus mandatos.  

A realidade, porém, mostra que se trata de um desafio gigantesco. Segundo dados do Ministério da Educação (MEC) divulgados no início deste ano, o Brasil segue muito abaixo da média estabelecida nacionalmente – a ideia é que 13% dos estudantes de ensino médio já frequentasse escolas com carga horária elevada em 2018, mas, naquele momento, ao final de 2017, o número de alunos que efetivamente encontravam essa oportunidade ainda estava em 7,9%. 

Os dados preliminares para o ano letivo atual, que consideram a matrícula inicial (mas podem cair ao longo do ano), indicam que esse número chegou a cerca de 10%, em 2018. O Censo Escolar, elaborado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), mostra que os avanços têm ocorrido gradativamente, mas a um ritmo lento: em 2012, eram 3,5% os jovens que tinham acesso a escolas de tempo integral no ensino secundário.  

Apesar de difícil e dependente de uma articulação com os estados e municípios, a escola integral tem razão para aparecer nas propostas de tantos candidatos – diferentes estudos demonstram os efeitos positivos que a jornada escolar maior tem sobre os estudantes. No Rio Grande do Sul, um levantamento feito entre os jovens matriculados em escolas de tempo integral do estado revelou que 90% dos alunos consideraram ter melhorado sua aprendizagem.  

Mais do que a percepção dos próprios estudantes, os resultados também aparecem na prática. Uma pesquisa realizada na Colômbia demonstrou que um acréscimo de 2 a 3 horas diárias melhorava o desempenho dos estudantes em avaliações de linguagem e matemática. “Como em muitas outras intervenções feitas em países em desenvolvimento, o impacto das escolas de tempo integral é maior entre as escolas mais pobres e aquelas localizadas em áreas rurais”, concluía o estudo.  

Disciplina e investimento  

Combater o absenteísmo de alunos e professores, barrar a evasão escolar e garantir a melhoria das notas em avaliações nacionais e internacionais são objetivos que todas as campanhas incluem, de alguma forma, em seus programas ou discursos. A maneira de chegar lá, porém, é diferente entre elas. Há quem aposte no modelo da disciplina, apontando o sucesso das escolas militares – o caso citado costuma ser o estado de Goiás, onde a gestão de vários centros de ensino públicos têm sido compartilhada com a Polícia Militar, com uma melhora no desempenho dos estudantes.  

Goiás, atualmente o estado com maior número de escolas administradas pela PM (48), planeja instalar outras 30, que já foram aprovadas e aguardam implementação. O modelo, porém, esbarra em dificuldades práticas. Além de discrepâncias ideológicas a respeito dessas escolas entre políticos, professores e pais de alunos, a impossibilidade de universalizar a militarização do ensino já foi reconhecida até mesmo por seu maior defensor, o candidato Jair Bolsonaro. Mesmo ampliadas, as escolas sob administração militar – por parte da PM ou do próprio Exército – seguiriam sendo a minoria.  

Outro caminho diz respeito a uma intensificação geral dos investimentos na educação básica. Ela passaria por destinar recursos para estados e municípios que permitissem às escolas locais se aproximarem dos resultados daquelas que, hoje, são as instituições públicas mais bem avaliadas no país – aquelas diretamente ligadas à esfera federal, que com frequência obtêm resultados superiores no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem); até comparadas às escolas militares.  

No último Enem, sete das dez escolas públicas mais bem avaliadas nas provas objetivas eram colégios técnicos e de aplicação vinculados a universidades federais, ou então institutos federais independentes – os IFs lideraram o Enem em 14 estados. A escola mais bem avaliada na prova objetiva foi o Colégio de Aplicação da Universidade Federal de Viçosa (MG). 

A diferença fundamental não era tanto no aspecto disciplinar, mas sobretudo nos investimentos: com mais recursos, as escolas federais dispõem professores mais qualificados, equipamentos e infraestrutura superiores. O desafio do próximo presidente será fazer essa qualidade chegar também às outras escolas, afetadas de forma menos direta pelos recursos federais.  

Qualificação da gestão 

Um questionário aplicado pelo MEC em 2015 a 55 mil diretores de escolas da rede pública revelou que mais de 45% deles afirmavam ter chegado ao cargo graças a indicações – que, com frequência, ocorrem mais por razões políticas do que técnicas. Segundo especialistas, um dos entraves para uma melhor gestão do ensino no Brasil é a proeminência de indicados em cargos que envolvem tomada de decisão e administração dos recursos para a área.  

A qualificação dessa gestão, hoje sujeita a interesses eleitoreiros, também tem entrado em cena nos debates sobre educação ao longo da campanha presidencial. Embora não exista consenso sobre o melhor caminho a ser seguido – há quem proponha a escolha de diretores principalmente por eleições junto à comunidade escolar –, diferentes candidatos vêm defendendo a realização de concursos ou provas seletivas para avaliar os postulantes a cargos diretivos.  

No Ceará, que vem ocupando a maioria dos postos entre as cem melhores escolas brasileiras nas últimas avaliações do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), a seleção de gestores através de concursos é apontada como uma das razões para a evolução do estado.  

Valorização dos professores  

A cada campanha eleitoral, valorizar quem educa nossas crianças reaparece entre as pautas dos postulantes a ter seu nome escolhido pelas urnas – mas, quando chega a hora, as dificuldades orçamentárias acabam se sobrepondo e os aumentos são tímidos. 

O Brasil é um dos países com os piores salários do mundo para professores da educação básica. Segundo dados da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o salário inicial oferecido aos professores do ensino médio no país equivale a pouco menos de 14 mil dólares anuais – um número baixo não apenas quando comparado a países ricos (na Suíça, o valor chega a 71 mil dólares), mas também a nações em desenvolvimento: um professor de ensino secundário no México ganha mais que o triplo de um brasileiro, em torno de 49 mil dólares anuais.  

Embora reconheça que os números não refletem exatamente a realidade, uma vez que outros fatores como a carga horária e premiações por desempenho podem alterar a remuneração, a OCDE faz o alerta: os números são um indicativo de quão atrativa é (ou deixa de ser) a carreira no magistério. 

Quanto piores os salários, menos professores qualificados insistem nesse caminho profissional, levando a um círculo vicioso de piora da educação. No Brasil, esses resultados já são sentidos quando se pergunta aos jovens sobre suas aspirações profissionais. Na OCDE, a média de estudantes que dizem querer ser professores, em declínio, bate nos 4,2%, um número que é ainda menor entre os brasileiros: 2,4%.  

Como em outras questões relacionadas à educação, a valorização da carreira no magistério também depende de articulação com os outros níveis de governo – muitos estados ainda impõem entraves até mesmo ao pagamento do piso salarial. De acordo com o levantamento mais recente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), divulgado no final de 2016, 14 estados no país ainda não cumpriam algum aspecto da Lei do Piso.

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