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graduação a distância

Conselhos barram alunos de EAD. Preocupação com qualidade ou reserva de mercado?

Fachada do Conselho Federal de Enfermagem. Foto: Divulgação. (Foto: )

Atualizada em 24 de abril de 2019, às 21h40.

Há uma década, quando os cursos de graduação a distância começaram a se popularizar no Brasil, uma série de categorias profissionais reagiu, alegando que a formação resultante não teria a mesma qualidade. Agora, enquanto 1,8 milhão dos 8,2 milhões de estudantes matriculados em cursos superiores no Brasil fazem uma graduação a distância, vários conselhos profissionais estão se mobilizando para barrar a concessão de registros formados nesse modelo.

Em fevereiro deste ano, por exemplo, o Conselho Federal de Odontologia (CFO) divulgou a resolução 197, que informa: estudantes da modalidade a distância formados em Odontologia por instituições de ensino a distância não receberão registro profissional. Decisões parecidas foram adotadas recentemente por outros conselhos profissionais da área da saúde, como Farmácia, Veterinária e Enfermagem, e também pelo Conselho Federal de Arquitetura e Urbanismo. Por quê? Qual o problema com os cursos a distância?

“Caráter preventivo”

A resolução 197 do CFO explica a decisão. Cita “a expansão das autorizações para realização de cursos de graduação com conteúdos na modalidade de ensino à distância, colocando em risco a qualidade da formação dos profissionais de saúde e, principalmente, colocando em risco a qualidade dos serviços ofertados à sociedade”. E também alega que existem projetos, tramitando no Congresso Nacional, para proibir a oferta de cursos de graduação na modalidade de ensino à distância para formação de profissionais de saúde.

Procurado pela reportagem, o CFO alegou, via assessoria de imprensa, que “não é contra a utilização da tecnologia EaD em até 20% dos cursos de graduação presencial como um todo”. Mas que, no caso específico da Odontologia, assim como de outros cursos da área de saúde, segue a resolução 515 do Conselho Nacional de Saúde, que se posiciona contrário à autorização de todo e qualquer curso de graduação da área da saúde, ministrado totalmente na modalidade educação a distância.

“A missão do CFO por meio dessas resoluções é preservar qualidade e segurança da assistência da população”, alega a entidade. Existem casos registrados de má prática profissional da parte de alunos de ensino a distância? “No caso da Odontologia, em específico, o trabalho do CFO é em caráter preventivo”, responde a instituição. Já o Conselho Federal de Farmácia organizou um estudo em que aponta, com preocupação, o aumento exponencial da quantidade de vagas ofertadas na área da saúde na graduação a distância: são atualmente 913 vagas em 11 profissões (veja os dados no quadro).

Já o presidente do Conselho Federal de Biomedicina, Silvio José Cecchi, afirmou que o problema não é a realização de parte das disciplinas a distância, mas a falta do mínimo do número de aulas em laboratórios, presenciais. "Somos a favor do ensino a distância, não tem como ser contra", diz. "O que nós somos contra é o curso 100% online. Por isso criamos um grupo qualificado para definir a quantidade de tempo de uma graduação de biomedicina precisa ser realizada de forma presencial. Quando o estudo estiver pronto, publicaremos uma resolução sobre o assunto."

Reação na Justiça

Em reação, duas entidades, o Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp) e a Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED), notificaram judicialmente os conselhos que vetaram profissionais oriundos do ensino a distância.

“O Semesp ingressou em juízo contra os conselhos profissionais de diferentes áreas, notadamente de Saúde, Arquitetura e Engenharia, que desde o início de 2019 publicaram resoluções que proíbem a inscrição e o registro de alunos egressos de cursos da modalidade ensino a distância (EAD)”, informa a instituição em nota. “O Semesp notificou todos os conselhos, solicitando a revogação imediata das resoluções, e ingressaram em juízo contra os que mantiveram a publicação que impede o acesso ao registro profissional de profissionais devidamente formados”.

Para os alunos da modalidade a distância, o Semesp recomenda que deem “continuidade, dentro da absoluta normalidade, aos seus cursos, se atentando ao fato de que, devidamente autorizado e reconhecido pelo MEC, esse curso goza de todas as atribuições do curso presencial, sem qualquer distinção”.

A instituição alega que normalmente os cursos “são ofertados em instituições que já oferecem esses mesmos cursos presencialmente e que contam com toda a infraestrutura necessária para as práticas. Pois é importante ressaltar que todos os cursos superiores citados, independente da modalidade, devem obedecer as DCNs (Diretrizes Curriculares Nacionais) que estabelecem toda a carga horária prática necessária, assim como os estágios curriculares, dependendo da área”.

Para Carlos Longo, diretor da ABED e pró-reitor acadêmico da Universidade Positivo, a decisão dos conselhos é “injusta” e “corporativista”. “Não é verdade que um enfermeiro formado em EAD nunca viu um paciente. As diretrizes obrigam o curso, EAD ou presencial, a fornecer 20% da carga horária com estágio, monitorado por um profissional da área. O estágio prático é exatamente igual ao do aluno presencial”, ele alega.

Limites

“Os conselhos profissionais estão se assustando com a oferta dos cursos a distância porque, se tiver muito profissional formado, a remuneração vai cair”, diz Longo, que informa que o total de vagas ofertadas não significa que elas tenham sido preenchidas. “Em geral, as instituições registram mais vagas do que de fato preenchem, porque as diretrizes do Ministério da Educação são rígidas, não permitem alterações rápidas na oferta de vagas”. Para o diretor, “não existe evidência de que a modalidade presencial seja melhor ou pior do que a modalidade a distância. O importante é garantir uma formação de qualidade”.

Mas os conselhos profissionais podem, em termos legais, barrar profissionais formados por cursos reconhecidos pelo MEC? A advogada Alyne Nunes, que atua na área educacional, responde: “Para ofertar cursos da área da saúde, o MEC, obrigatoriamente, deve ouvir previamente o Conselho Nacional de Saúde, mas sua decisão é autônoma. Ou seja, o MEC é que decide, de acordo com a regulação, sobre a autorização, supervisão e reconhecimento dos cursos superiores. No caso dos cursos de Arquitetura, não é necessária a manifestação prévia do conselho de classe”.

Por isso, diz Nunes, as normas barrando o registro de graduados a distância podem ser questionadas juridicamente. “Isso porque o Decreto n. 9.237/17, que trata do ensino superior, veda a identificação da modalidade do ensino (se presencial ou a distância) na emissão e no registro dos diplomas. Ou seja, se o critério para ingressar no Conselho é o diploma reconhecido pelo MEC, este requisito terá sido atendido, e o Conselho de Classe não pode criar distinções entre graduados a distância e presenciais”.

Essa legislação, diz ela, está mudando. “Esses temas, dada sua natureza, precisam ser debatidos amplamente pela sociedade, uma vez que é necessário estabelecer quais são os limites da educação a distância”.

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