Não é de hoje que educadores e neurocientistas têm batido nessa tecla: dormir bem é imprescindível para um bom desempenho escolar. Horas reduzidas de sono não só afetam a capacidade de concentração, influenciam o humor e alteram a disposição: elas também prejudicam a consolidação do que é aprendido em sala de aula. Um novo estudo da Universidade de Zurique, na Suíça, traz mais detalhes sobre essa relação.
Em parceria com Nicole Wenderoth, docente do Instituto Federal Suíço de Tecnologia, o professor Reto Huber conduziu um experimento que manipulou o sono de seis mulheres e sete homens. "Desenvolvemos um método que nos permite reduzir a profundidade do sono em uma determinada parte do cérebro e, portanto, provar a conexão causal entre sono profundo e eficiência de aprendizagem", afirma Huber em artigo publicado pela revista Science no último dia 23.
No estudo, as cobaias tiveram que aprender três tarefas motoras diferentes ao longo de alguns dias. A atividade cerebral foi monitorada por eletroencefalograma durante o sono. No primeiro dia, todos dormiram sem interrupções. No dia seguinte, sem que os participantes do experimento soubessem, houve estimulação sonora direcionada para o córtex motor, responsável pelo aprendizado das tarefas ensinadas na experiência.
A pesquisa suíça conseguiu demonstrar os efeitos de um sono de má qualidade: a manipulação do sono teve como consequência o aumento dos erros nas tarefas propostas e o enfraquecimento da aprendizagem. "Na região fortemente estimulada do cérebro, a eficiência de aprendizagem estava saturada e não podia mais ser alterada, o que inibiu a aprendizagem de habilidades motoras", detalha Nicole Wenderoth. Com o método, os pesquisadores pretendem avançar também em outros estudos, como o da epilepsia.
A falta de sono compromete o desempenho escolar, entre tantas atividades, porque não dá chance para um “relaxamento” para as sinapses – ligações entre os neurônios – que são estimuladas intensamente enquanto estamos acordados. Grosso modo, precisamos de uma fase de recuperação, em repouso completo, para que novas informações sejam fixadas pelo cérebro. “É importante dormir bem antes de aprender para estarmos de prontidão a novos estímulos. Mas também é pelo sono que consolidamos a memória recente, daí a importância do sono profundo após uma aula”, diz o neurocientista Fernando Louzada, professor do Departamento de Fisiologia da UFPR.
Sem bocejo
Não é lenda: as necessidades de sono variam de idade para idade, de pessoa para pessoa. “Por isso passamos a falar em uma faixa desejada de horas de sono e não uma duração específica”, explica Fernando Louzada (veja abaixo o número recomendado de acordo com a fase da vida).
Na adolescência, adormecer cedo e assim evitar o cansaço extremo na manhã seguinte fica mesmo mais difícil – e não é apenas questão de se privar voluntariamente do sono por atividades excessivas ou pelas muitas horas dispensadas a aparelhos eletrônicos. “As mudanças no organismo durante a puberdade tornam o sono mais complicado. O adolescente não consegue antecipar a hora de deitar”, conta o professor da UFPR.
Adaptações nas escolas propostas pela neurociência
Sesta para crianças
Algumas crianças não precisam de sono diurno, enquanto outras sim. Por isso, é recomendado que se insira dois espaços dentro da escola: um para cochilo depois do almoço e outro para atividades lúdicas ou de leitura para quem não sentir sono.
Reconhecer ritmo dos adolescentes
Paradoxalmente, enquanto os adolescentes naturalmente passem a atrasar o sono, muitos começam a estudar de manhã e saem da cama antes de cumprir suas necessidades de sono. É fortemente recomendado que as escolas mudem o horário de início das aulas para mais tarde para essa faixa etária. Horários flexíveis
Para atender matutinos e vespertinos, aulas começariam e acabariam duas horas mais cedo para um grupo de alunos. Por exemplo, considerando-se uma carga horária de cinco horas (corresponde à realidade brasileira), aqueles com tendências matutinas iriam à escola das 7h às 12h; vespertinos, das 9h às 15h. A proposta é baseada em uma década de estudos do Laboratório de Cronobiologia Humana da UFPR.
Fonte: Fernando Louzada, professor do Departamento de Fisiologia da UFPR.
Tempo de sono por idade
Até 3 meses
RECOMENDADO: 14 a 17 horas
PREJUDICIAL: abaixo de 10 horas
4 a 11 meses
RECOMENDADO: 12 a 15 horas
PREJUDICIAL: abaixo de 9 horas
1 a 2 anos
RECOMENDADO: 11 a 14 horas
PREJUDICIAL: abaixo de 8 horas
3 a 5 anos
RECOMENDADO: 10 a 13 horas
PREJUDICIAL: abaixo de 7 horas
6 a 13 anos
RECOMENDADO: 9 a 11 horas
PREJUDICIAL: abaixo de 6 horas
14 a 17 anos
RECOMENDADO: 8 a 10 horas
PREJUDICIAL: abaixo de 6 horas
18 a 25 anos
RECOMENDADO: 7 a 9 horas
PREJUDICIAL: abaixo de 5 horas
26 a 64 anos
RECOMENDADO: 7 a 9 horas
PREJUDICIAL: abaixo de 5 horas
Acima de 65 anos
RECOMENDADO: 7 a 9 horas
PREJUDICIAL: abaixo de 4 horas
Fonte: Fernando Louzada, professor do Departamento de Fisiologia da UFPR.