O último Censo do Ensino Superior, divulgado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), mostra mais uma vez a concentração de mulheres e homens em diferentes cursos de graduação. Com base em dados de 2016, a pesquisa deixa clara a preferência do sexo feminino por cursos voltados para atuação profissional na área da sáude e bem-estar social e educação. No primeiro segmento, a presença feminina chega a ultrapassar os 70%, de acordo com um levantamento realizado pelo portal Nexo.
Os cursos de Estética e Cosmética, Pedagogia e Serviço Social lideram a lista das preferências das mulheres, enquanto que Engenharia Mecânica, de Controle e Automação e a área de Computação são dominados pelo sexo oposto. A pesquisa também mostra que a predominância masculina nas áreas de ciência, matemática e computação continua acentuada.
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Parte da explicação para isso tem origem em constatações biológicas. Um grupo de estudo liderado pelo pesquisador e professor da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, Simon Baron-Coehn publicou novas descobertas de genes relacionados à empatia - habilidade que as mulheres, em média, são superiores aos homens, o que poderia explicar a predileção do sexo feminino por cursos que exigem maior relação interpessoal, como Serviço Social. “Existem mais de mil genes no cromossomo X. Uma vez que as mulheres têm dois cromossomos X, mas os homens só têm um, essa diferença genética tem um impacto”, afirmou em um artigo publicado no jornal inglês The Guardian.
Segundo Baron-Coehn, uma de suas pesquisas concluiu que é o tipo de cérebro - e não o sexo - que influencia no comportamento humano. Alguns tipos de cérebro, no entanto, são mais comuns em um gênero do que em outro. Nos homens, por exemplo, é mais comum encontrar funções cerebrais mais voltadas para “sistematizações”, que seria a capacidade de compreender como algumas coisas funcionam em programas de computador, engenharia de carros ou equações matemáticas.
“Nós ainda não sabemos se a forte sistematização está associada a determinados genes ligados ao sexo, mas devemos manter uma mente aberta sobre essa possibilidade, já que apenas 10% dos professores de matemática são mulheres”, ponderou.
O pesquisador inglês afirma que os trabalhos ligados ao determinismo biológico não descartam a relevância da influência cultural, mas tentam mostrar que a interação entre as duas tentativas de explicação podem ser o caminho mais seguro.
“O determinismo biológico não é necessariamente sexista. Pode ser sexista, se é usado para afirmar que todas as mulheres fazem ‘x’ e todos os homens fazem ‘y’ ou se é usada para perpetuar desigualdades sociais. Tais aplicações sexistas de teorias deterministas biológicas são abomináveis”, afirmou no mesmo artigo.
Baron-Choen também é autor de um estudo intitulado “A diferença essencial: cérebro masculino e feminino”, no qual mostra a influência do fator cerebral nas preferências ocupacionais e funcionais.
Em análises práticas, o pesquisador constatou que homens têm maior facilidade em desenhar mapas de locais que foram visitados apenas uma vez. Em outro teste, o resultado apontou que o sexo masculino teve pontuação mais alta na montagem de um aparelho mecânico 3-D e na construção de edifícios de blocos de 2-d. “A preferência masculina por se concentrar em sistemas são evidentes muito cedo”, diz.
No estudo, o autor afirma que o cérebro feminino possui uma predileção à empatia, cuja marca registrada é a capacidade de identificar as emoções e pensamentos de outra pessoa e, de uma certa maneira, reagir de forma apropriada a esses sentimentos.
Segundo Baron-Cohen, o cérebro “empatizador”, de forma intuitiva, descobre como as pessoas estão se sentindo e sabe a melhor forma de tratar as pessoas com cuidado e sensibilidade. Esta constatação foi o embrião da teoria da Empatia-Sistematização (E-S).
“O mesmo tipo de padrão é visto no local de trabalho adulto. Algumas ocupações são quase inteiramente masculinas, como trabalho com metais, fabricação de armas, elaboração de instrumentos musicais ou na indústrias de construção. O foco dessas ocupações é a construção de sistemas. Profissões como matemática, física e engenharia, que exigem alta sistematização, também são em grande parte disciplinas escolhidas pelos homens”, analisa o pesquisador.
Pesquisa
Em uma de suas pesquisas voltadas para a distinção entre os gêneros, Richard Lippa, professor de Psicologia da Universidade do estado da Califórnia, examinou as diferenças entre os sexos em quatro características, entre elas a preferência ocupacional. Com dados de mais de 200 mil participantes de 53 países, o pesquisador norte-americano constatou que homens e mulheres divergiam “significativamente” em todas as análises realizadas. O seu estudo indicou que as diferenças entre meninos e meninas já aparecem no primeiro dia de vida.
De acordo com Lipp, os resultados encontrados na sua análise sugerem que os fatores biológicos podem contribuir para as diferenças sexuais de personalidade. E vai além. Mais radical, o pesquisador afirma que a “cultura desempenha um papel insignificante e pequeno na moderação das diferenças sexuais na personalidade”. Em seu livro “Gender, Nature and Nurture” (Gênero, Natureza e Criação, em tradução livre), ainda sem tradução para o português, Lipp aprofunda o conteúdo dos resultados de suas pesquisas.
Outro estudo de análise biológica e comportamental - essa focada em crianças de diferentes faixas-etárias - também ajuda a explicar as decisões tomadas no momento de escolher o rumo acadêmico e profissional. O trio de pesquisadores Brenda Todd, John Barry, Sara Thommessen constatou algumas diferenças biológicas que proporcionam aos meninos um interesse e habilidade maior no processamento espacial. Já as meninas estão mais interessadas em olhar para rostos, possuem mais domínio das atividades motoras finas e na manipulação de objetos.
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Eles também estudaram a preferência das crianças por brinquedos em um ambiente sem a presença dos pais - e as diferenças percebidas foram semelhantes às aptidões biológicas. Embora houvesse variabilidade entre crianças, os pesquisadores descobriram que, entre as crianças entre nove e 17 meses, a bola era uma escolha favorita para os meninos, e as meninas preferiam a panela.
Professor do Núcleo de Neurociências da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Bruno Rezende afirma que há diferenças cerebrais entre os gêneros, mas que as partes que mostram ser distintas não são relevantes a ponto de interferirem em comportamentos como a escolha profissional.
Segundo Rezende, que tem estudos na diferenciação biológica de gênero, o que a ciência mostrou até hoje é que os locais que se distinguem não influenciam na parte emocional e intelectual - o que poderia ser um fator importante na decisão do rumo universitário. “É um tema muito difícil, qualquer afirmação a respeito seria desonesta”, afirma.
No Brasil, grande parte dos estudos acadêmicos seguem a linha da construção cultural para explicar as diferenças comportamentais entre os gêneros. Uma parcela dos pesquisadores, no entanto, considera os fator biológico um elemento relevante nessa distinção.
De acordo com Denise Zancan, coordenadora pós-graduação em Neurociência Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), há bastante tempo a ciência conclui que homens têm uma disposição maior para a área de exatas e organização espacial, mas que é perigoso generalizar neste assunto. “Uma parcela é genética, mas o ambiente influencia” diz.
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