Em meados dos anos 1990 a norte-americana Virginia Walden Ford discutia frequentemente com o filho mais novo, William, sobre seu desempenho escolar.
Ao contrário dos irmãos mais velhos, que conseguiram se formar na escola pública do bairro onde moravam em Washington sem grandes problemas, o caçula frequentemente entrava em brigas, faltava às aulas, desrespeitava professores e flertava com pequenos delitos.
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O ambiente educacional também não ajudava: professores desmotivados, materiais deteriorados, facções dominando o território e uma região dominada pelo tráfico de drogas.
O destino da família, porém, mudou em uma noite despretensiosa, quando Virginia foi desabafar com um vizinho. Ele trabalhava em um colégio católico do distrito e se propôs a conseguir uma bolsa de estudos para William.
“O menino tem talento, só está um pouco perdido”, disse ele para Virginia.
Retribuindo
Foi então que ela percebeu que o acolhimento é um fator fundamental para amenizar os índices de evasão escolar.
“Meu filho era apenas mais uma das milhares de crianças e adolescentes que estavam abandonando a escola porque não estavam se adaptando”, lembra.
“Não era uma questão sobre escola pública versus escola particular, mas sim sobre envolvimento entre aluno, pais e instituição. Era isso que precisávamos mudar”, segue.
Nos Estados Unidos a escolha da escola era feita através do CEP da residência (exceto em colégios particulares), o que acaba delimitando tanto bairros como escolas por critérios socioeconômicos.
Mas Virginia percebeu que era possível reverter esse quadro. Em 1998 ela ajudou a criar a D.C. Parents for School Choice (“Pais de Washington pela escolha escolar”, em tradução livre ), organização que tem como objetivo unir pais para que possam lutar por melhores oportunidades para seus filhos: seja a possibilidade por matriculá-los em outras escolas, obter bolsas de estudo ou batalhar por melhorias dentro das instituições de seus bairros.
“Se os pais souberem o que está acontecendo na escola dos filhos e souberem como lutar por eles, seus direitos e deveres, podemos finalmente ter a reforma educacional que precisamos”, defende.
Virginia conseguiu uma reunião com membros do Congresso. “Decidimos falar com estes políticos para explicar nossa situação”, relembra. Em 2003 ela foi chamada para assessorar a redação da legislação de escolha escolar e, um ano depois, conseguiu a aprovação da Parents Public School Choice, política pública que define que pais podem escolher escolas públicas que vão além das limitações do CEP de sua residência.
O programa
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Desde então, quase 20 mil crianças foram contempladas com bolsas escolares. O requisito é que as famílias tenham uma renda anual inferior a 22 mil dólares, algo em torno de R$ 73 mil. No ano passado foram inscritos 3.898 alunos (81,3% negros e 15,9% latinos).
“Ao ganhar uma bolsa, o estudante não muda apenas sua realidade, mas também de sua família e comunidade, que passam a ter outras referências. Os papos durante o jantar mudam, por exemplo, assim como a perspectiva em seu entorno”, explica.
“Por outro lado, a realidade das crianças e adolescentes que estudam com o bolsista também muda: ela passa a entender de forma mais crua e natural como é a realidade de outros norte-americanos”, completa.
Luta diária
Hoje Virginia atua em três organizações. Além da DC Parents for School Choice, onde é diretora executiva, também é membro-fundador da The Black Alliance for Educational Options (“Aliança negra para opções educacionais”) e participa da DC Advisory Committee of the US Civil Rights Commision (“Comissão de direitos civis dos Estados Unidos”).
“Minha luta é a educação”, diz ela, que relembra o papel dos pais, William Harry Fowler e Marion Virginia Fowler Armstrong, ambos educadores do sistema público, em sua formação.
O pai foi o primeiro diretor em uma escola pública em Little Rock, Arkansas, e a mãe a primeira professora em uma escola fundamental somente para brancos, nos anos 50.
“Até o final do ensino fundamental estudei em escolas segregadas. Por conta da decisão da Suprema Corte tive a oportunidade de estudar na Little Rock Central High School, antes uma escola exclusiva para brancos e com melhores condições de ensino”, conta.
“A segregação não era como se mostra nos filmes. Era pior. Tive a oportunidade de ter melhores condições de ensino mesmo sem ser rica, mesmo sem ser branca. Eduquei meus filhos nas mesmas condições e fui uma mãe solteira. Se não desisti dessas batalhas, não vou desistir da reforma educacional nos Estados Unidos”, conclui.
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