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Meritocracia e colégios militares

Ensino médio público continua estagnado no Brasil. Menos em Goiás. Entenda por quê

Educação em Goiás deu um salto nos últimos dez anos (Foto: Soraia Sakamoto/ Gazeta do Povo/ Arquivo)

O que faz um estado saltar, em dez anos, de 16.º para o primeiro lugar no ranking dos melhores ensinos médios do Brasil? Esse foi o feito alcançado por Goiás entre 2007 e 2017. Nesse período, a nota do Ideb do ensino médio estadual goiano saltou de 2,8 para 4,3 – um aumento de 1,5 ponto, enquanto que a média do Brasil variou, neste mesmo período, apenas 0,3 ponto, de 3,2 para 3,5. Essa melhora expressiva garantiu uma mudança drástica na posição entre todas as unidades da federação. Outros estados também avançaram, mas nenhum alcançou a velocidade de evolução dos goianos. Qual o segredo do estado?

O Ideb é calculado a partir da taxa de rendimento escolar (em outras palavras, o percentual de aprovação, obtido a partir do Censo Escolar) e as médias de desempenho nos exames aplicados pelo Inep, em especial a Prova Brasil e o Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), aplicado a cada dois anos. Avalia, portanto, as notas dos alunos, mas também as taxas de reprovação e repetência. Para alcançar bons resultados, Goiás agiu, em primeiro lugar, em duas frentes: desempenho e frequência. E, depois, também no aumento do número de escolas militares: das 615 unidades de ensino médio, hoje 53 são administradas por militares, com professores civis e ingresso dos estudantes por meio de sorteio.

Meritocracia e escolas militares

Uma decisão que influenciou na qualidade do ensino no estado é a parceria firmada entre a Secretaria de Estado de Educação, Cultura e Esporte (Seduce-GO) e a Secretaria de Segurança Pública, aliança que permitiu a instalação de 53 colégios militares em todo o estado (eram 16 colégios em 2013, com expansão que chegou a 53 em 2018). A disciplina e o desempenho acadêmico dos alunos atraem a atenção dos pais, que formam filas de espera para colocar seus filhos nestas escolas. Aliás, as melhores nota do estado dos anos finais, tanto do ensino fundamental (7,5 no Ideb) quanto do ensino médio (6,2), foram recebidas pela mesma escola, o Colégio Estadual da Polícia Militar de Goiás de Anápolis Dr. Cesar Toledo.

Inicialmente instaladas para atender aos dependentes de policiais militares, essas instituições, que atendem alunos do 6.º ano do ensino fundamental até o terceiro do ensino médio, se tornaram referência no estado e ajudam a elevar a nota média do Ideb goiano. O ingresso dos alunos, que era feito antes por meio de uma prova de seleção, após um pedido do Ministério Público de Goiás (MP-GO), passou a ser feito por meio de sorteio em 2017.

Nas escolas militares do estado, os melhores alunos são premiados, mas também recebem a tarefa de auxiliar os colegas com notas mais baixas. Os professores são concursados, não militares, e participam de todas as atividades realizadas pela Secretaria de Educação, junto com docentes de outras escolas da rede estadual de ensino, o que ajuda a difundir boas práticas.

A meritocracia, aliás, é aplicada para a rede pública estadual em geral: a secretaria de educação oferece bonificações para os professores da rede de ensino, nos locais de melhor desempenho.

A valorização do alto desempenho se disseminou pelo estado, a ponto de diversas escolas estaduais goianas instalarem, na entrada, placas exibindo a nota da instituição no Ideb.

O orgulho em exibir o desempenho se estende para colégios de ensino fundamental – aliás, os alunos goianos do 9.º ano também alcançaram a maior nota do Brasil, 5,2, acima dos 4,8 da meta estabelecida pelo Ministério da Educação para a edição de 2017 do exame. No ensino médio, a nota 4,3 de Goiás ficou um décimo acima da meta. A média nacional foi de 3,8 pontos. O ensino fundamental I alcançou nota 6,6, quando a meta era 5,6, e o ensino fundamental II alcançou 5,2, contra 4,8 da meta.

Valorização dos professores

“O caso de Goiás é interessante, porque o estado já tinha uma boa posição nos anos iniciais e finais do ensino fundamental, e agora tem avançado muito bem no ensino médio”, afirma o coordenador do núcleo de inteligência do Todos pela Educação Caio Sato.

Para o especialista, o estado adotou políticas que também têm trazido melhorias na posição de outros estados em relação ao Ideb, como Pernambuco, Ceará e Espírito Santo. “São ações com impacto rápido na educação. Provam que é possível avançar rápido nesse setor”, afirma Caio Sato.

Em primeiro lugar, Goiás promoveu uma ampla reformulação na carreira de professores.

“O estado apostou no salário e na atratividade de professores, para garantir melhores notas nas provas. E também desenvolveu um bom programa para manter equipes aptas a substituir professores que faltam, de forma a estimular os alunos e reduzir a evasão escolar”, diz o especialista do Todos pela Educação.

Além disso, o estado deu prioridade para a educação e apostou na continuidade das políticas. “A continuidade é crucial. Se você muda tudo a toda hora, não consegue dar tempo para os resultados aparecerem”, diz Sato. De fato, nos últimos 15 anos, o estado foi governado por políticos de três diferentes partidos, PP, PSDB e DEM. E as políticas públicas para a educação, em geral, tiveram continuidade.

Esforço contínuo

O uso de ferramentas próprias de avaliação também permite identificar problemas com rapidez. A cada bimestre, todas as escolas estaduais de Goiás, de ensino fundamental e médio, participam de simulados de Português, Matemática, Ciências Sociais e Ciências da Natureza. E o material didático foi inteiramente revisado, e passou a ser complementado pelo Aprender+, um conteúdo extra com revisão de conteúdo, distribuído a cada dois meses.

“Desde 2011, com a implantação da metodologia de tutoria e implantação da avaliação estadual que mede anualmente o índice de desenvolvimento da educação básica da rede estadual (o Idego), a rede estadual em Goiás vem aprendendo a trabalhar com o estabelecimento de metas, monitoramento e avaliação de resultados a curto, médio e longo prazo”, afirma Rita de Cássia Ferreira, superintendente do Centro de Estudos, Pesquisa e Formação dos Profissionais da Educação.

“A rede de modo geral aprendeu a olhar para os seus indicadores, a definir o caminho que será percorrido durante cada bimestre letivo, e o mais importante: saber onde quer chegar. Cada escola sabe a sua meta de Ideb e Idego e se esforça para alcançá-las, sabe seus percentuais de aprovação, evasão, repetência e também sabe dos seus desafios anuais”.

Essas ações são consolidadas num plano de ação anual, que, segundo a superintendente, “é constantemente revisto, monitorado, avaliado e corrigido. Com isso, a rede conseguiu diminuir a defasagem idade/série, a evasão, quase zerou a repetência e melhorou muito a proficiência em Língua Portuguesa e Matemática”.

Para ela, a existência de uma avaliação nacional ampla facilitou a instalação de medidas de monitoramento e estimulou a competitividade no setor. “Os índices de desenvolvimento da educação ganharam visibilidade e projeção nacional e nenhuma rede quer ficar para trás. Todos nós queremos avançar, queremos uma educação melhor, uma escola melhor”.

O maior desafio para o futuro, afirma Rita de Cássia, é melhorar a formação de professores. “A falta de formação é o que afeta, principalmente, a qualidade do ensino. O professor faz um bom plano de aula, o coordenador pedagógico acompanha, o gestor também, mas ainda existe um distanciamento entre o que o professor ensina e o que o estudante aprende. Creio que não tem como pensar em educação de qualidade sem investir na formação continuada dos professores”.

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