• Carregando...
Cidade Mirim do Colégio Opet: da esquerda para direita, o “prefeito” Giullio Marquetto, Gustavo Guimarães, Antônio Scaramal Mazzo, João Pedro e Ingrid Grimm | Antônio More/ Gazeta do Povo
Cidade Mirim do Colégio Opet: da esquerda para direita, o “prefeito” Giullio Marquetto, Gustavo Guimarães, Antônio Scaramal Mazzo, João Pedro e Ingrid Grimm| Foto: Antônio More/ Gazeta do Povo

Entrevista

Mário Sérgio Cortella, professor da PUC-SP

Um dos maiores especialistas no assunto educação e política, o filósofo Mário Sérgio Cortella, professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP), considera que alguns problemas ainda insistem em travar o bom diálogo sobre política em sala de aula. Em entrevista à Gazeta do Povo, ele aponta alguns dos principais, como o tratamento errado dos termos política e cidadania. Acompanhe:

Tratar de política dentro da escola ainda é algo pouco comum no Brasil. É possível determinar os principais motivos disso?

Em primeiro lugar, temos uma democracia ainda muito jovem. O país tem 511 anos e sua democracia plena não tem nem 25 anos, sendo seu marco a Constituição de 1988. Durante esse tempo, tivemos momentos rarefeitos de inclusão da sociedade nas decisões. E um modelo com participação restrita acaba tendo reflexos dentro da escola, onde o debate sobre esses temas acabava não acontecendo. Se formos lembrar, a geração anterior teve aulas de Educação Cívica, que eram impostas e se tornaram indesejadas. Com isso, os pais dos alunos de hoje também valorizam pouco a discussão da política no cotidiano.

Em alguns textos, o senhor comenta sobre a confusão que é feita com os termos "política" e "cidadania" no ensino. Qual a sua visão sobre eles e o que essa definição errada acaba acarretando?

A confusão é usar esses termos como coisas separadas. Essas palavras têm origens em locais diferentes, mas seus significados são os mesmos e têm a ver com a noção de comunidade, convivência. Ao entender e promover sentidos diversos, muitas vezes a ideia que fica é a de que política se limitaria apenas à prática partidária, o que não é correto. Sem levar isso em conta, por vezes apostam no ensino do funcionamento dos três poderes, por exemplo, acreditando que se está ensinando política, o que é errado e totalmente insuficiente.

E o que deveria ser ensinado, então? E de que forma?

Justamente a convivência: seu significado, seu respeito à democracia, o que demanda e em que resulta. E isso não deve ser encarado como um componente curricular, que são as disciplinas, mas como conteúdo curricular, estando presente e orientando o ensino desses valores nas matérias. Assim, isso deve acontecer desde a educação infantil, com noções de partilha e respeito recíproco. E no ensino médio já se pode pensar em aliar essa prática ao conteúdo, dentro da teoria das matérias.

O Brasil estaria próximo de alcançar esta condição? É possível ser otimista?

Eu sou extremamente otimista. Nosso país vem decolando fortemente na educação e na escolarização nos últimos 20 anos. Com novas tecnologias e ferramentas de interatividade, como as mídias sociais, isso só aumenta, promovendo a participação, como deve ocorrer dentro da sala de aula.

  • Mário Sérgio Cortella, professor da PUC-SP

No contexto geral das escolas brasileiras, o ensino e a promoção de atividades ligadas à política ainda caminham de modo confuso. Os desdobramentos dessas falhas no ensino, e, principalmente, suas causas são apontadas pelo professor Mário Sérgio Cortella, da Pontifícia Uni­versidade Católica de São Paulo (PUCSP), que vê problemas semelhantes na educação de uma geração anterior. "O erro começa quando se tenta impor esse assunto. O importante é aprender as noções de comunidade e isso tem início na prática", afirma Cortella.É justamente a ideia de co­­munidade que deve ter o lugar central no debate nas escolas, de acordo com o professor. Para ele, mais do que ensinar o funcionamento do estado e da administração pública, a necessidade é promover o convívio e o respeito recíproco como pontos comuns dentro dos componentes curriculares já existentes. "Esses elementos não devem vir como o que hoje está disseminado como conteúdos ‘extracurriculares’. Isso dá a ideia de um penduricalho, algo à parte da educação", diz ele.

O professor ensaia algumas explicações para esta carência na educação brasileira. O fato de a democracia ainda ser muito recente no país, assim como o equívoco de reduzir o tema apenas à questão partidária seriam alguns dos frequentes tropeços dados pelo Brasil no tema. Como consequên­cia, muitas vezes a escola acaba por afastar crianças e jovens do assunto – distância que em vários casos se mantém por boa parte da vida adulta.

Cidade Mirim

Incluir noções práticas de participação e cidadania no dia a dia dos alunos é o que busca o projeto da Cidade Mirim, desenvolvido há 41 anos pelo Colégio Opet de Curi­tiba.

A estrutura é uma réplica em escala menor de uma cidade comum, com ca­­sas, comércio e órgãos públicos, e tudo isso dentro de uma escola. A experiência da Cidade Mirim tem como objetivo dar as primeiras noções de política para seus alunos, em um exemplo raro de como a questão poderia ser conduzida nacionalmente. Segundo sua coordenadora, Sônia Sillas, a ideia é acompanhar o processo de aprendizagem, ao mesmo tempo em que se tenta despertar o interesse pela comunidade. "Os alunos conseguem viver essa metáfora, percebendo e pensando nos problemas das cidades e podendo trabalhar em cima deles", conta.

Além de elegerem seus representantes, os estudantes sugerem projetos para serem debatidos. Como resultado, a professora aponta mudanças positivas na postura dos alunos, entre elas a melhoria no relacionamento com colegas, assim como uma primeira atenção a temas mais amplos relacionados à sociedade. "Eles discutem e apresentam propostas de temas ligados à saúde pública, ao trânsito, à violência, e depois pensam em possíveis soluções para fora da escola", diz Sônia.

Câmara Federal

Alunos experimentam dia a dia de deputados

No final de setembro, 78 estudantes de ensino médio, público e privado de todo o país se reuniram em Brasília para, durante cinco dias, simularem o dia a dia de um deputado federal. Chamado de Parlamento Jovem Brasileiro, o projeto é promovido anualmente pela Câmara desde 2004, e tem como objetivo introduzir o funcionamento do congresso para os jovens.

Os pequenos deputados foram escolhidos pelas secretarias de educação de cada estado, depois de apresentarem um projeto de lei baseado em áreas como agricultura e meio ambiente, e saúde e segurança pública. Cinco estudantes paranaenses participaram do projeto este ano, três deles de Laranjeiras do Sul, um de Cianorte e outro de Toledo.

* * * * *

Interatividade

O ensino de política e cidadania é pouco valorizado pelas escolas?

Escreva para leitor@gazetadopovo.com.br

As cartas selecionadas serão publicadas na Coluna do Leitor.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]