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Estudo com 21 países: aulas presenciais não têm correlação com alta de casos de Covid-19

Estudo com 21 países mostra que aulas presenciais não contribuíram para alta de casos de Covid
Crianças norte-americanas no primeiro dia de aulas presenciais na segunda-feira, 1º de março, em Chicago (Foto: AFP)

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A 2ª edição do Levantamento Internacional de Retomada das Aulas Presenciais, que analisou os resultados da reabertura de escolas em 21 países de diferentes continentes durante a pandemia de Covid-19, concluiu que na maioria desses países o retorno às aulas presenciais não impactou a tendência das curvas de contágio. O aumento de casos identificados a partir da reabertura das escolas, segundo os pesquisadores, deu-se por causa do relaxamento de outras medidas de distanciamento, porém os focos de transmissão não foram os espaços escolares.

O estudo – realizado pela consultoria Vozes da Educação em parceria com a Fundação Lemann e o fundo Imaginable Futures – traz outras conclusões como, por exemplo, que profissionais da educação não correm maior risco de infecção quando comparados a outras profissões (embora o risco aumente em casos de contato entre muitos adultos e jovens a partir de 16 anos) e que o fechamento das escolas deve ser utilizado como último recurso de contenção da pandemia.

Realidades diferentes, resultados semelhantes

As experiências de reabertura são muito diferentes entre os países. Na Europa, por exemplo, houve uma segunda onda de contágio que atingiu a população com mais força entre outubro e novembro de 2020; em muitos lugares, verificou-se a chegada de novas variantes da Covid-19. Além disso, cada país teve uma postura distinta diante da crise de saúde. De qualquer forma, levando-se em conta os resultados de contágio nesses locais, chegou-se à conclusão de que a volta às aulas não foi o fator responsável pelo aumento dos casos.

A África do Sul, que autorizou a reabertura total das escolas no final de agosto, quando a curva de casos estava em queda, observou um declínio de casos nas semanas seguintes à retomada até alcançar a estabilização, que durou até dezembro. Naquele mês, com as festas de fim de ano e o surgimento da nova variante do vírus, identificou-se um aumento de casos. Os estudantes sul-africanos entraram em férias em 16 de dezembro, quando a curva já estava em crescimento. Em janeiro, com os alunos em férias, o país passou pelo pior momento desde o início da pandemia. Com isso, o retorno às aulas, que estava previsto para janeiro, foi adiado.

Na Alemanha, as aulas presenciais retornaram no início de agosto, após as férias de verão, período em que a curva de contágios estava em leve ascensão. Nos meses de agosto e setembro, os casos se mantiveram estáveis, porém a partir de outubro – com a chegada da segunda onda de contágio na Europa – vários países passaram a registrar aumentos expressivos no número de casos, e a Alemanha também passou por aumentos significativos no número de contaminações diárias. Ao avaliar o caso germânico e de países que viveram situações semelhantes, o estudo aponta que a alta de casos não esteve relacionada com a retomada das aulas presenciais, considerando que as escolas estiveram abertas mais de dois meses sem gerar aumentos expressivos nas curvas de contágio.

O prosseguimento da análise em outras nações reforça o argumento da consultoria: a Índia, por exemplo, que reabriu parcialmente suas escolas em 15 de outubro, teve queda significativa nas transmissões nos meses seguintes. Da mesma forma ocorreu no Peru que, desde sua reabertura parcial em agosto, passou por uma redução nas contaminações que durou vários meses, sendo revertida a partir de janeiro. Os casos não indicam que escolas diminuam contaminações, mas endossam que as instituições de ensino não contribuem para o aumento de casos de Covid-19.

Já na Itália, a chegada da segunda onda de contágio na Europa aconteceu cerca de duas semanas depois da reabertura das escolas, o que fez com que os novos casos fossem atribuídos às aulas presenciais. Entre setembro e dezembro, o Istituto Superiore di Sanità monitorou os surtos de contágio no país e identificou que apenas 2% do total de notificações tiveram origem no ambiente escolar. Como o país não passou por aumento significativo de casos no final de 2020, as aulas foram retomadas de forma parcial em 6 de janeiro.

Carolina Campos, especialista em educação e fundadora da Vozes da Educação, explica que a experiência de fechar e reabrir escolas conforme os números da pandemia oscilam é algo que os países deverão aprender a lidar. “A própria Unesco vem dizendo que as pessoas precisam se acostumar com as múltiplas aberturas e fechamentos, e de tudo o que vimos, sabemos que isso será o ‘novo normal’. É importante que as pessoas entendam que abrir e fechar as escolas é algo esperado, e que isso não significa insucesso na retomada presencial das aulas”, afirma.

Nos casos dos países em que a reabertura total das escolas foi considerada satisfatória não houve evolução nas curvas de contágio, ou seja, não se identificou correlação entre a reabertura das instituições de ensino e o aumento de casos de Covid-19. Se a curva estava em tendência decrescente ou estabilizada, essa tendência se manteve; se estava com tendência ascendente, a abertura das escolas não acelerou o processo de aumento de casos. “Os casos podem ter continuado a subir, mas na mesma proporção de antes da reabertura”, cita o relatório do levantamento.

Quanto aos quatro países com reabertura classificada como “indeterminada”, foi registrada evolução na curva de contágio do país em até dois meses após a retomada das aulas presenciais. “Isso não significa, no entanto, que as escolas foram as responsáveis pelos novos contágios. O aumento dos casos pode ter sido ocasionado por um relaxamento das medidas de distanciamento na sociedade ou pela chegada de uma nova variante, por exemplo”, aponta o relatório.

* Não houve classificação para os países em que a reabertura das escolas foi apenas parcial.
** O levantamento não conseguiu avaliar o impacto da nova variante do vírus nos países avaliados.

Principais medidas colocadas em prática pelos países

Os países analisados lançaram mão de diversas iniciativas para minimizar os casos de transmissão nas escolas, além de medidas para lidar com contaminações identificadas no ambiente escolar. “É muito importante seguir as medidas de distanciamento social e de higiene, sem dúvidas. Inclusive, alguns países intensificaram as medidas, determinando o uso de máscaras sobrepostas (uma máscara descartável por baixo e uma de pano por cima). Mas também é essencial ter um plano de contingência, caso alguém teste positivo dentro ou fora da escola. Daí por que monitorar os alunos e os educadores é algo muito importante”, destaca Carolina Campos. “Além disso, estabelecer uma boa comunicação pode fazer toda a diferença. Países que sempre comunicaram bem suas determinações seguem tendo muito êxito”.

Com relação aos planos de contingência, a maioria dos governos apresentaram planos nacionais considerados satisfatórios para lidar com casos de Covid-19 nas escolas. Neles, foram apresentadas instruções claras sobre o que fazer em casos positivos e suspeitos nas escolas, estabelecendo quem deverá ser isolado, por quanto tempo, como deverá ser comunicado e como será a articulação com as autoridades de saúde.

Por outro lado, três países (Argentina, França e Nova Zelândia) apresentaram planos considerados pouco satisfatórios – há instruções sobre o que fazer em casos positivos e suspeitos nas escolas, mas não está claro o número de dias em isolamento e/ou as mudanças com relação às medidas que serão adotadas para públicos diversos, além de não mencionar articulação com as autoridades de saúde. Três outras nações (África do Sul, Nigéria e Suécia) apresentaram planos considerados insatisfatórios – apresentam instruções genéricas sem contemplar todas as complexidades sanitárias.

Quanto às testagens, apenas quatro países (Israel, Peru, Reino Unido e Singapura) fizeram testagem em massa da comunidade escolar. Os demais variaram entre testagem apenas de casos sintomáticos, testagem voluntária ou após o aparecimento da nova variante, por exemplo. Argentina, Bolívia, Canadá, Índia, Nigéria e Nova Zelândia não apresentaram política de testagem na comunidade escolar.

A respeito da vacinação prioritária de professores, apenas cinco países (França, Estados Unidos, Uruguai, Argentina e Reino Unido) recorreram à medida.

Outra preocupação dos governos esteve relacionada ao transporte dos alunos, professores e funcionários para as instituições de ensino. As principais medidas determinadas foram o uso de máscaras dentro dos veículos, a redução da capacidade no transporte público utilizado pelos estudantes, a recomendação para evitar diálogos e para priorizar a boa ventilação dentro dos ônibus.

O Reino Unido passou a incentivar pais, alunos e funcionários a irem para a escola a pé ou de bicicleta sempre que possível. Já estado do Mississippi, nos Estados Unidos, determinou a adoção de assentos fixos para facilitar o rastreamento em casos positivos, a disposição dos assentos com base na ordem de embarque e desembarque dos estudantes e a utilização apenas dos bancos ao lado de janelas.

Houve, ainda, outras medidas entre as nações analisadas, como a contratação de professores (a Itália, por exemplo, contratou 97 mil docentes para suprir a demanda das escolas; já Portugal contratou 900 técnicos de intervenção para as escolas e irá ofertar bolsas para professores substitutos) – e a adaptação de atividades de maior risco, como distribuição de merenda e educação física.

Relação entre reabertura das escolas e ranqueamento Pisa

O Levantamento Internacional de Retomada das Aulas Presenciais também destacou que nações em que os alunos têm boas notas no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) mantiveram as escolas fechadas por menos dias, sugerindo uma valorização da agenda educacional. São avaliados no Pisa os conhecimentos relacionados à leitura, matemática e ciências de estudantes de 16 anos de 79 países membros ou parceiros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

A título de comparação, o Brasil, que ocupa a 57ª colocação no Pisa, permaneceu com as escolas totalmente fechadas por um período dez vezes maior do que Singapura, que figura no segundo lugar do ranking. Quando comparado com os demais países do estudo, o Brasil fica em 2º lugar dentre os países com mais tempo de escolas fechadas, atrás apenas da Bolívia.

Vale destacar que, com 267 dias de escolas fechadas, o Brasil é o quinto país com maior tempo de suspensão das aula presenciais, atrás apenas de Panamá (295 dias), El Salvador (289), Bangladesh (274) e Bolívia (270).

Comunicação deve ser priorizada na retomada às aulas no Brasil, diz pesquisadora

No Brasil, a reabertura das escolas tem seguido caminhos bastante diferentes entre os estados e, sobretudo, na comparação da rede pública com a particular. Para o sucesso da retomada das aulas presenciais, Carolina Campos destaca a importância da comunicação clara sobre os protocolos que serão realizados.

“Países que se comunicam bem conseguem gerar confiança na população que, por sua vez, tende a seguir as orientações sanitárias com mais rigor. Os pais querem ouvir dos diretores de escola e dos professores quais são as regras a serem seguidas quando as escolas forem reabertas, ou como proceder caso a escola precise fechar temporariamente”, explica. “Quando Secretaria de Educação, gestores escolares e professores falam a mesma língua, os pais se sentem mais seguros e cumprem as regras com mais facilidade. Estamos diante de um problema complexo, que vai exigir unidade no discurso e nas ações”, destaca.

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