Ao longo dos anos, os vencedores do Rooney Prize têm se tornado alguns dos autores mais famosos da Irlanda.| Foto: Eoin RaffertyEoin Rafferty

A Trinity College Dublin entregou para Caitriona Lally o Rooney Prize For Literature (Prêmio Rooney Para Literatura Irlandesa, em tradução livre), um dos prêmios literários mais importantes da Irlanda. 

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O comitê enalteceu seu livro, "Eggshells" (Cascas de Ovo, em tradução livre), como "um trabalho de impressionante alcance imaginativo, bem humorado, misterioso e imprevisível". Nos últimos três anos e meio, Lally trabalhou como faxineira na universidade.  

No dia que recebeu a ligação do comitê, Lally ficou tão chocada – e a experiência pareceu tão fora de contexto – que pediu à pessoa que contou sobre o prêmio para lhe explicar novamente. 

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Claro, ela já conhecia há muito tempo a reputação do Rooney Prize – uma enorme honraria concedida anualmente pela Trinity College a um escritor com menos de 40 anos que mostra grande talento e enorme potencial. 

"Mas, na hora, não conseguia entender o que representava", disse Lally, de 39 anos, em um email ao The Washington Post, destacando que seu livro havia sido publicado três anos atrás. "Foi a surpresa mais feliz da minha vida", completou. 

Rotina

Toda manhã, ela acorda às 4:45, veste sua roupa e vai até a faculdade, onde trabalha das 6 às 9:30. Então, retorna pra casa para tomar conta de sua filha de pouco mais de um ano, Alice. No dia que recebeu a informação que havia vencido o prêmio, Alice estava agitada: "Estava tendo um dia difícil – acordar cedo para o meu trabalho, voltar pra casa para cuidar do bebê, e ela não dormia e não parava de chorar", Lally contou à Trinity College.  

Assim que percebeu que havia vencido o prêmio – e que ele vinha com um cheque de 10 mil euros (cerca de R$ 45 mil na cotação atual), ela descreveu o momento como "simplesmente mágico".  

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Ao longo dos anos, os vencedores do Rooney Prize têm se tornado alguns dos autores mais famosos da Irlanda, como Anne Enright (com algumas obras publicadas no Brasil, como “A Estrada” e “O Encontro”) e Frank McGuinness . 

O patrocinador do prêmio é Peter Rooney, que por sua vez tomou o papel de seu tio, Dan Rooney, ex-embaixador americano na Irlanda e dono do Pittsburgh Steelers (time de futebol americano).

Pés no chão

Lally planeja usar o dinheiro do prêmio para pagar contas e os estudos de Alice, além de comprar uma caixa d'água para o seu sótão. "Preferia dizer que estou me banhando em champagne e viajando de primeira classe para Las Vegas, mas essas coisas mais práticas são prioridade", conta. 

Seu caminho até o sucesso literário, porém, foi marcado por muita rejeição e mudança de empregos. Lally estudou inglês na própria Trinity College Dublin, mas para ajudar nas despesas ela também trabalhou como zeladora: 

Passei alguns verões trabalhando como faxineira em Trinity. Limpava as casas dos estudantes quando eles as deixavam, e depois trabalhei como camareira quando os alunos ficavam na universidade nos meses de verão. A limpeza na primavera era um trabalho duro – um ano inteiro de sujeira não sai tão fácil! 

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Lally ficou próxima das outras camareiras e diz ter aproveitado a experiência na faculdade estudando literatura. Após se formar em 2004, ela trabalhou como professora de inglês no Japão durante um ano, e depois viajou muito. 

De volta à Irlanda, teve vários empregos, incluindo um trabalho como editora, passando até mesmo por um período em Nova York como ajudante doméstica. Em 2011 ela se viu desempregada, período em que teve a ideia de escrever "Eggshells". 

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“O livro é sobre uma pessoa isolada que não se encontra, e que anda vagando por Dublin procurando padrões e significados em grafites, ou nomes de lugares que soam mágicos, ou ainda pequenas portas que podem levar a um outro mundo", escreveu a autora.

"Em 2011 passei boa parte do ano divagando por Dublin quando estava desempregada. Havia sido demitida e andava pelas ruas procurando por cartazes de ‘estamos contratando’. E então tive a ideia da minha personagem, Vivian, que quer fazer parte de algo e se conectar com alguém", diz. 

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Lally finalmente conseguiu um trabalho, e decidiu desenvolver sua personagem para escrever o livro. Assim que terminou de escrevê-lo, entrou em alguns concursos e venceu; o prêmio foi a oportunidade de tentar vender sua obra a agentes e editoras. Ela então conseguiu um agente e um acordo para que “Eggshells” fosse publicado. 

Foram muitas rejeições, mas depois de centenas delas no mercado de trabalho, acho que me acostumei a ouvir ‘não’. 

Seu livro foi publicado em 2015, quando novamente se viu desempregada. Ela havia mantido a amizade com algumas pessoas de Trinity, e elas lhe disseram que a universidade estava contratando governantas. "Então eu voltei", conta.

Ela diz encontrar paz quando limpa espaços grandes e vazios, especialmente as belas livrarias da universidade. "Na minha área atual, eu, felizmente, não tenho que limpar banheiros – apenas escritórios, auditórios e uma biblioteca". 

Ela e seu marido, que possui um emprego público, vivem em Dublin e tiveram sua filha no ano passado. Lally diz que seu trabalho como faxineira se adequa bem à sua rotina. Ela está terminando seu segundo romance – e não planeja largar seu trabalho matinal: 

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Funciona bem com minha vida de escritora. Já tive trabalhos pagos como editora antes, mas era difícil me motivar a sentar e escrever um livro após terminar um trabalho.

Seu conselho para interessados em escrever um livro? Tenha um emprego que não seja estressante. 

É bem difícil escrever quando você está esgotado emocionalmente após o trabalho, ou tem um trabalho que odeia. Sei que limpar pode parecer o inferno para algumas pessoas, mas funciona para mim. As contas devem ser pagas e, até que aquele cheque gordo bata na sua porta, todo mundo precisa de um trabalho durante o dia.

Tradução: Rafael Baltazar.