Cerca de 20% dos 3,7 milhões de crianças e adolescentes que trabalham no Brasil não frequentam a escola. Entre os 80% que estudam, o trabalho afeta diretamente a frequência e o desempenho escolar. É o que afirma o estudo "Trabalho infantil e adolescente: impacto econômico e os desafios para a inserção de jovens no mercado de trabalho no Cone Sul", encomendado pela Fundação Telefônica e apresentado ontem, durante o 4.º Encontro Internacional Contra o Trabalho Infantil, em São Paulo. Conforme a pesquisa, a evasão escolar pode chegar a 40%, no caso de jornadas de 36 horas semanais. Já a queda no rendimento, para a mesma carga de trabalho, varia de 10% a 15%, dependendo da série.
Alunos da 8.ª série do ensino fundamental que trabalham quatro horas por dia têm queda de cerca de 4% no desempenho em Português e Matemática, se comparados aos que não trabalham. Já na 4.ª série, quatro horas diárias de trabalho representam defasagem de 7% no desempenho escolar.
Círculo vicioso
Consultor responsável pelo estudo, o professor de Economia da Universidade de São Paulo (USP) Fernando Botelho explica que, além de afetar de maneira significativa o desenvolvimento físico e mental dos jovens, o trabalho infantil cria um círculo vicioso, ao diminuir as chances de o indivíduo atingir um nível maior de escolaridade, que lhe proporcionaria melhores salários. "A escolaridade dos pais também está diretamente relacionada à questão. Quanto mais os pais estudaram, menor a chance de o filho trabalhar na infância. O trabalho infantil é um ciclo que se retroalimenta."
Entre os atrativos da contratação da força de trabalho entre 5 e 17 anos está o baixo custo, já que a mão de obra infantil chega a custar, mensalmente, 42% menos que a adulta. "A grande maioria desse tipo de trabalho está na informalidade e, por isso, é difícil ser atingido pela fiscalização. Além de combater a informalidade, é preciso criar condições para que a família decida não inserir essa criança no mercado de trabalho, o que se faz, sobretudo, pela educação de qualidade", ressalta Botelho.
Segundo o estudo, o investimento em políticas públicas nesse sentido, durante uma década, custaria US$ 29 milhões, mas traria um benefício de US$ 77 milhões no mesmo período. Isso porque, crianças melhores formadas, se tornariam adultos melhores remunerados, o que impactaria diretamente na economia do país.
Embora o levantamento não traga dados estaduais, a presidente da Fundação Telefônica, Françoise Trapenard, afirma que, no Paraná, a mazela do trabalho infantil é a agricultura familiar, sobretudo, de tabaco. "A mãozinha pequena é ideal para colher as folhas. Isso é abafado por toda uma cadeia produtiva, mas traz consequências terríveis, como a perda da impressão digital das crianças. É a perda da identidade."
A jornalista viajou a convite da Fundação Telefônica.