O Fórum Social Mundial (FSM) 2018, em Salvador (BA), incluiu debates sobre temas como identidade de gênero, “lesbianidades” e “desenfeitiço”, com presenças de personalidades como os ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff, Pepe Mujica, do Uruguai, e Cristina Kirchner, da Argentina.
De acordo com a organização, o objetivo do evento era “debater e definir novas alternativas e estratégias de enfrentamento ao neoliberalismo, aos golpes antidemocráticos e genocidas que diversos países estão enfrentando nos últimos anos”.
A programação também incluiu o painel “As tarefas da Esquerda frente ao Golpe no Brasil”, com participação da Senadora Fátima Bezerra, dos Deputados Federais Arlindo Chinaglia, Marco Maia e Maria do Rosário , e do Deputado Estadual Marcelino Galo. Todos, claro, filiados ao PT.
LEIA MAIS: Onda de cursos sobre “golpe” expõe domínio “acachapante” da esquerda nas universidades
Ainda de acordo com a programação oficial, outras ações foram a Frente Desenfeitiça Brasil, evento composto por mesas temáticas sobre a saúde de “uma sociedade biocentrada” e o “direito à diversidade” na medicina, e a Oficina de Envelhecimento e Gênero, que buscou promover discussões sobre gênero em todas as etapas da vida, “do nascimento ao envelhecimento”.
Além disso, “as lesbianidades” no cinema foram discutidas no seminário “Quando lésbicas filmam lésbicas: Lesbianizando as produções audiovisuais”; os hackers brasileiros foram valorizados na oficina “Hacker: porque você precisa se tornar um(a)”; a dimensão política das festas foi debatida por três pesquisadores na mesa redonda “A Festa como Resistência Cultural” e até mesmo a cerveja teve destaque no “Primeiro Festival de Cerveja Artesanal e Culturas de Resistência”, composto por oficinas, debates e shows voltados para a produção de cerveja artesanal como uma forma de resistência ao capitalismo e... captação de recursos.
As edições anteriores do FSM não foram menos polêmicas. Desde a primeira, em 2001, o evento reúne temas comuns da esquerda com aval da comunidade universitária.
No 1º Fórum Social Mundial, realizado em Porto Alegre (RS), foram tratados temas como distribuição de renda, democracia, neoliberalismo e globalização. O objetivo era criar um contraponto ao Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça, realizado na mesma data.
Na ocasião, a Prefeitura de Porto Alegre foi criticada pelo presidente Fernando Henrique Cardoso por destinar R$ 1 milhão para o evento. Com essa verba, foram feitas ações como a “Marcha contra o Neoliberalismo e pela Vida” e conferências “Como garantir o caráter público dos bens comuns à humanidade, sua desmercantilização, assim como o controle social sobre o meio ambiente?”.
Já na edição seguinte, em 2002, o fórum teve participação do presidente Lula, que na época ainda era candidato recorrente à presidência, e de outras lideranças partidárias de esquerda. Um dos destaques daquele ano foi o seminário “Novos sujeitos sociais e perspectivas socialista: protagonismo proletário no movimento anti-globalização”, com o dirigente nacional do PSTU, Valério Arcary.
LEIA MAIS: Por que cursos sobre “golpe” não têm espaço nas universidades particulares?
Se as tendências a abordar apenas um viés ideológico eram nítidas desde sua concepção, em 2010 essa intenção foi escancarada: movimentos sociais passaram a defender uma radicalização do FSM para transformá-lo não só em um palco de articulações da esquerda, mas em um movimento mundial contra o neoliberalismo e o imperialismo.
“Vou comparar a um jogo de futebol: o FSM tem sido o vestiário, a concentração. O jogo se decide no campo; é lá que nós, os movimentos, estamos. Agora o Fórum precisa nos ajudar mais, para não perdermos o jogo”, disse João Pedro Stédile, do Movimento Sem Terra, durante a edição daquele ano.
As mudanças começaram a acontecer logo em seguida: em 2012, o tema do fórum foi “Crise Capitalista – Justiça Social e Ambiental”; em 2013, foi realizado na Tunísia, que havia acabado de passar um processo de revolução na Primavera Árabe; em 2017, de volta a Porto Alegre, teve o eixo temático “Fórum Social das Resistências — Democracia e Direitos dos Povos e do Planeta”.
Para a edição de 2018 foram investidos R$ 2,2 milhões em verbas públicas da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), dos quais RS 1,2 milhão foi destinado para uma empresa contratada sem licitação.
A universidade defendeu a contratação dispensada de licitação, afirmando que foram seguidos os procedimentos legais após chamada pública divulgada no Diário Oficial do Estado.
A Uneb também chegou a afirmar que os gastos não têm impacto no orçamento da instituição e que o recurso é proveniente de suplementação orçamentária do Governo do Estado da Bahia. “Cabe a universidade a execução destes recursos para cumprimento das atividades estritamente relacionadas ao FSM”, justificou.
Já governador da Bahia, Rui Costa (PT), afirmou em entrevista à rádio Sociedade que a decisão do que fazer com a verba de mais de R$ 2 milhões é exclusiva da Uneb. “A decisão do que fazer ou não [com o dinheiro] pertence à universidade e não ao governo do Estado. Na minha opinião, a decisão da Uneb foi correta”, disse Rui.
A explicação lógica para a facilidade de propagação desses ideais específicos passa pela apropriação dos ambientes de ensino público: essa tomada de espaço é significativa nas universidades públicas, onde existem partidos políticos e correntes ideológicas atuando por interesses próprios.
Mas o problema não está só no Brasil. Uma pesquisa recente da Universidade da Califórnia mostrou que os acadêmicos das principais universidades americanas também são mais propensos a se identificar com ideologia de esquerda; em 2008, 56% deles se declaravam de esquerda ou de extrema-esquerda. Em 2011, a parcela subiu para 63%.
Essa influência que precisa ser equacionada, porém, têm se revelado restrita a ambientes específicos; desde a primeira edição do FSM, na América Latina, governos eleitos com apoio da esquerda foram sistematicamente derrotados.
A Argentina elegeu Maurício Macri após mais de uma década de Kirchnerismo; no Brasil, Dilma Rousseff deixou o governo após processo de impeachment e na Venezuela Nicolás Maduro perdeu completamente o controle das instituições democráticas. Ou seja, por mais que universidades estejam aparelhadas à esquerda, isso não siginifica que a sociedade aceite seguir o mesmo caminho.
Justiça do Trabalho desafia STF e manda aplicativos contratarem trabalhadores
Parlamento da Coreia do Sul tem tumulto após votação contra lei marcial decretada pelo presidente
Correios adotam “medidas urgentes” para evitar “insolvência” após prejuízo recorde
Milei divulga ranking que mostra peso argentino como “melhor moeda do mundo” e real como a pior
Deixe sua opinião