Calouros universitários indígenas e quilombolas de todo o país correm o risco de abandonar seus estudos porque o governo federal interrompeu novas bolsas do PBP (Programa Bolsa-Permanência), ajuda mensal de R$ 900 para moradia, alimentação e material escolar.
Segundo representantes de alunos, pelo menos 2.500 estudantes foram prejudicados até aqui, mas o número pode atingir 5.000 até o final do ano.
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Desde o início das aulas, em março, os novos universitários não receberam nenhuma parcela da bolsa nem conseguiram inserir seus nomes no sistema do PBP como candidatos à ajuda, segundo comissão de estudantes.
Criado em 2013 pelo Ministério da Educação, o PBP já permitiu acesso a mais de 18 mil estudantes que deixaram suas aldeias e quilombos, às vezes localizados a centenas de quilômetros, para fazer cursos superiores em instituições federais, além de jovens "em situação de vulnerabilidade socioeconômica".
Para ter acesso ao valor, os novos alunos devem se cadastrar no sistema do PBP no MEC. Contudo o sistema está bloqueado, segundo diversas denúncias dos representantes dos alunos, que procuram o MEC desde abril na tentativa de resolver o problema.
Em uma audiência no dia 29 com o novo ministro da Educação, Rossieli Soares, os representantes ouviram que a proposta do ministério é de apenas 800 novas bolsas neste ano. O mesmo número foi confirmado por e-mail, à Folha, nesta terça-feira (5).
"Esse número é totalmente abaixo das necessidades. O mais grave ainda foi que o ministério pediu que a comissão de alunos escolhesse esses 800 nomes, o que repudiamos. Se a gente fizer isso, vai penalizar centenas de alunos, não tem sentido", disse Kâhu Pataxó, 27, aluno de direito da UFBA (Universidade Federal da Bahia), onde há 155 novos alunos aguardando a bolsa.
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Segundo Kâhu, os calouros passam dificuldades em Salvador (BA) e sobrevivem com a ajuda dos alunos veteranos, que têm dividido o valor de suas bolsas. "Tem colegas dividindo um quarto, sala e banheiro com cinco alunos. Você pode imaginar as condições da habitação."
De forma emergencial, a UFBA conseguiu para os alunos uma verba de R$ 400 mensais, com recursos do orçamento da instituição. A pró-reitora de ações afirmativas e assistência estudantil da UFBA, Cassia Virginia Bastos Maciel, diz que acompanha com apreensão o assunto porque uma concessão de apenas 800 bolsas para mais de 68 instituições federais "configura na prática o fechamento do programa".
"Os alunos estão vindo de várias regiões, atendemos 417 municípios na Bahia. Estão longe de suas famílias, de suas aldeias e de suas comunidades. A não concessão dessas bolsas significa de fato a expulsão dos alunos da universidade", disse a professora.
Em Belém (PA), só na UFPA (Universidade Federal do Pará) há 400 novos quilombolas sem bolsa, ou seja, metade do acenado pelo MEC para todo o país, segundo o aluno de direito Aurélio dos Santos Borges, 43.
"Já estamos no mês de junho e ninguém recebeu nada. Os alunos conseguem chegar à universidade com apoio de amigos, da comunidade, até bingo estão fazendo, mas logo o dinheiro vai acabar. O que vai acontecer é que eles vão desistir dos estudos."
Indígenas e quilombolas programam uma série de atos de protesto contra o corte nas bolsas e pretendem reunir 300 pessoas em Brasília para novas reuniões com autoridades do MEC até o final do mês.
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Em nota, o MEC confirmou que o ministro "anunciou a oferta de 800 novas bolsas" e que "aguarda a conclusão das tratativas em andamento com as lideranças".
O MEC disse que as novas inscrições para ingresso no PBP "são abertas em janelas específicas". O ministério informou ainda que os outros 18 mil alunos que já entraram no programa em anos anteriores estão recebendo as bolsas sem corte ou descontinuidade. Em 2017, segundo o MEC, o PBP pagou R$ 172 milhões. De janeiro a abril deste ano, R$ 56 milhões, "portanto não há queda na execução mensal ou anual do programa".