O homeschooling parecia perto de se tornar uma realidade no Brasil, desde que o governo anunciou, no início deste ano, que iria regulamentar a prática através de Medida Provisória. Nesta quinta-feira (11), no entanto, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) assinou um Projeto de Lei com a proposta tornar legal o exercício, desistindo da medida mais rápida que poderia amparar famílias que praticam o ensino em casa.
Leia também: Por que o homeschooling cresce nos EUA
DIÁRIO DE CLASSE: O mínimo que você precisa saber para entender o que acontece dentro de escolas e universidades
Em 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o ensino domiciliar não é inconstitucional, falta apenas que seja criada uma lei regulamentando a prática. No Congresso, já tramitam quatro propostas sobre o assunto.
Caso aprovado algum desses projetos, será um alívio para as 7 mil famílias que já ensinam seus filhos em casa e, atualmente, estão sujeitas a ter que brigar na Justiça por este direito. Será também um incentivo para quem quer adotar a prática, mas não tomou a iniciativa até hoje por culpa da insegurança legal que cerca o assunto.
Mas o homeschooling é para todos? Em sua tese de doutorado, o advogado Édison Prado de Andrade descreve uma pesquisa realizada com 57 famílias adeptas. “Os pais que optam pela prática são maduros, com idade compreendida predominantemente entre trinta e cinco e cinquenta anos”, ele descreve em seu texto. “A maioria dos pais possui o ensino médio completo e superior. Nenhum dos pais pesquisados estudou em homeschooling”.
Já Albert Cheng, professor de política educacional da Universidade de Arkansas, explica que, num país em que o número de adeptos é maior, como os Estados Unidos, o perfil varia mais: “As famílias que adotam o homeschooling têm perfis socioeconômicos e culturais muito variados, e fazem essa escolha por motivações diversas”.
O que é necessário saber – e fazer – para garantir que os filhos recebam a melhor educação possível, longe do ambiente escolar? Confira abaixo sete atitudes essenciais para que o ensino domiciliar seja bem-sucedido.
1. Dedicação integral
É inevitável: um dos pais terá que deixar de trabalhar fora de casa. Por isso, antes de aderir ao homeschooling, é preciso fazer algumas contas. Por um lado, em famílias em que os dois têm emprego, a renda tende a cair.
Os gastos com alimentação aumentam, já que as crianças vão fazer todas as refeições em casa. Mas desaparecem as contas com transporte, uniforme e mensalidades (no caso de quem mantém os filhos em escolas particulares). Feita a programação financeira, decidido quem vai ficar em casa, é preciso se preparar para uma rotina intensa com as crianças. Afinal, passar o dia inteiro com elas demanda atenção integral, não só para os estudos como para todos os outros momentos do dia, incluindo o lazer.
“Em geral, se as crianças são pequenas, o ensino doméstico exige que um dos pais fique em casa”, afirma Peter Gray, professor do departamento de psicologia do Boston College e autor do livro Free to Learn: Why Unleashing the Instinct to Play Will Make Our Children Happier, More Self-Reliant, and Better Students for Life. “Mas isso não significa que apenas famílias ricas possam fazer homeschooling. Existem casos de famílias pobres, que consideram que a prioridade é aproveitar o tempo com as crianças, e não acumular bens materiais”.
2. Disciplina
Uma das maiores vantagens do ensino domiciliar é o respeito ao ritmo de cada criança. Afinal, é possível educá-las sem forçar ninguém a acordar cedo demais, tomar café correndo e pegar uma van que vai demorar horas para chegar à escola.
Mas isso não quer dizer que cada filho possa fazer o que bem entende. É essencial que todos tenham horário para acordar e uma programação básica para cada dia. Além de estabelecer uma rotina, é importante que a família defina um calendário anual de estudos, que preveja, inclusive, períodos de folga. “Não existe um perfil de família. O único pré-requisito é bastante disposição e dedicação”, afirma André Uliano, procurador da república, professor de direito constitucional e articulista da Gazeta do Povo. “É necessário estudar as matérias, preparar atividades e aplicá-las”.
3. Acesso a conteúdos e tutores
Uma dúvida comum para quem quer entrar para o mundo do homeschooling, em qualquer lugar do mundo, é: como ensinar todos os conteúdos? A resposta é simples: existem livros, softwares e aplicativos para famílias que optaram pelo ensino domiciliar.
Além disso, para conteúdos específicos, de química orgânica a aulas de piano, é possível contratar tutores particulares – o que representa mais um investimento financeiro, mas garante que cada um dos profissionais que tiver contato com os filhos dedique atenção exclusiva a eles e esteja alinhado com a visão de mundo da família.
“A busca de conteúdo era uma das maiores dificuldades até algum tempo no Brasil, mas isso está melhorando muito rapidamente”, explica André Uliano. “Há material excelente que é possível encomendar do Canadá ou dos Estados Unidos, onde o homeschooling já está bem mais desenvolvido. Mas hoje já está sendo editada uma quantidade expressiva de material também no Brasil”.
4. Tempo para atividades extracurriculares
Ao contrário do que se imagina, uma criança educada pelos pais não passa o dia todo trancada em casa, até porque ela pode finalizar as tarefas do dia em seu próprio ritmo, e assim passar menos horas do dia sentada, estudando.
É essencial que os pais que pretendem aderir à prática estejam preparados para encontrar programas para as crianças, sejam parques próximos, museus ou aulas de natação, balé e música (sempre respeitando o interesse dos filhos por cada uma das atividades).
5. Contato maior com a comunidade
Nos Estados Unidos, é muito comum que grupos de famílias de homeschooling que moram na mesma região se reúnam para realizar aulas com o mesmo tutor.
Essa é apenas uma das muitas alternativas disponíveis para colocar os filhos em contato com a comunidade ao redor, e assim garantir uma socialização saudável, sem a competição e a agressividade comum em muitas escolas. “O homeschooling funciona melhor para famílias de casais realizados e bem conectados com a comunidade, de forma que seus filhos também socializem”, explica o psicólogo Peter Gray.
André Uliano concorda: “Os pais, de modo geral, não atuam de modo isolado. Você forma grupos na cidade ou região. Nesses grupos há, em geral, reuniões periódicas com trocas de experiências, indicação de material e metodologia”.
6. Paciência com o preconceito
O homeschooling costuma ser cercado de preconceito. As pessoas em geral não entendem por que a criança não vai para a escola e pressionam as famílias a respeito dessa escolha. Por isso, ao fazer essa opção, é importante estar preparado para responder a perguntas desagradáveis nas reuniões de família ou nos encontros com conhecidos na rua.
E, também, explicar para as crianças as vantagens dessa opção, para que elas também saibam lidar com as críticas. “A família precisa se preparar para as críticas, que são inevitáveis”, afirma Peter Gray. “Em minhas pesquisas, os pais relatam que o maior desafio é lidar com o questionamento que vem de fora de casa”.
7. Senso crítico constante
Como saber se a educação domiciliar é a melhor para as crianças? “Tentando”, responde o professor Albert Cheng. O principal critério para adotar a prática deve ser o bem-estar das crianças.
Se os pais têm a oportunidade de tentar e consideram que está funcionando, devem continuar”. Caso as crianças não estejam aprendendo ou se desenvolvendo o suficiente, diz ele, “é melhor buscar outras soluções”.
Justiça do Trabalho desafia STF e manda aplicativos contratarem trabalhadores
Correios adotam “medidas urgentes” para evitar “insolvência” após prejuízo recorde
PIB cresceu 0,9% no terceiro trimestre, diz IBGE
Milei divulga ranking que mostra peso argentino como “melhor moeda do mundo” e real como a pior
Deixe sua opinião