O Colégio Eleitoral da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) formou, nesta quinta-feira (28), a lista tríplice que será apresentada ao Ministério da Educação, para que o presidente Jair Bolsonaro possa escolher quem será o(a) reitor(a) para o quadriênio 2020-2024. É uma lista curiosa. O primeiro nome é o do atual vice-reitor, Marcelo Carneiro Leão. Ele apresentou seu nome para a consulta prévia da instituição, na qual participaram professores, alunos e técnicos, e recebeu 83,5% dos votos válidos.
Mas os outros dois nomes escolhidos pelo Colégio Eleitoral para "concorrer" com o vice-reitor são de professores que não participaram da consulta prévia junto à comunidade acadêmica, organizada pela Associação dos Docentes da UFRPE (Aduferpe) e pelo Diretório Central dos Estudantes (DCE). E mais: na consulta à comunidade, apoiaram abertamente o nome de Marcelo Carneiro Leão. Diante da suspeita de que esses dois nomes incluídos na lista só entraram na disputa a fim de garantir a formação de uma lista tríplice com três candidatos do mesmo grupo, a concorrente do professor Marcelo na votação feita com a comunidade, a professora Mônica Folena, se recusou a apresentar seu nome ao Colégio Eleitoral que se reuniu nesta quinta.
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Mesmo grupo
“Não apresentei meu nome porque a resolução 165, que orienta a votação, exige que cada conselheiro apresente seu voto aberto, e muitos conselheiros me procuraram dizendo que não poderiam votar contra o grupo político que está no poder na UFRPE há mais de 20 anos”, explica a professora Folena, que é diretora do Departamento de Educação da instituição. A reitora atual, Maria José de Sena, está no cargo desde 2012.
Ela lembra que, durante a campanha para a votação interna, recebeu agressões. “Tentaram me taxar de fascista, utilizaram as redes sociais para me atacar. Quando, numa sexta-feira de manhã, todos os cartazes com meu nome apareceram rasgados, eu comecei a temer pela minha integridade física”. A chapa da professora foi formada a partir de um coletivo de professores, servidores e alunos, chamada Muda Rural.
“Propusemos fazer uma gestão universitária diferente, menos centralizada, com maior autonomia administrativa e financeira para os departamentos. O objetivo principal era trazer outro olhar de gestão, mais democrático, mais descentralizado”, ela explica. Seu grupo recebeu 18,9% dos votos, na eleição interna realizada entre os dias 6 e 7 de novembro. “Entramos na campanha por acreditar que era uma forma de levar nossas propostas para a comunidade acadêmica. Não apresentamos meu nome para o conselho quando percebemos que a lista tríplice seria formada por dois nomes que não participaram de debates nem apresentaram propostas”, disse. A mesma prática foi observada em outras eleições para reitor ao longo deste ano, como, por exemplo, a Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB).
“Reitor empossado”
Os dois nomes que completam a lista tríplice ao lado do professor Marcelo Carneiro Leão são os da professora adjunta Anna Paula de Avellar Brito Lima e do professor Inaldo Soares, diretor do Departamento de Letras. Ambos apoiaram abertamente o professor Marcelo. Assinaram listas de apoio ao nome dele (veja na figura abaixo), participaram de sua campanha... E, seis dias depois da votação encerrada, apresentaram ao conselho unificado seus nomes como candidatos.
O apoio foi aberto. Em sua rede social, a professora escreveu, no dia 8 de novembro, às 8h15: “Parabéns para Marcelo e Gabriel (Rivas, candidato a vice-reitor)! A comunidade acadêmica expressou o seu desejo!”.
Ela também escreveu: “Só lembramos que nenhum desfecho, além do que o que a comunidade decidiu será acatado: Reitor eleito, reitor empossado!”. Essa segunda afirmação pode fazer referência ao fato de que o governo federal tem escolhido o segundo ou o terceiro nome da lista tríplice, como aconteceu na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) e na Universidade Federal do Ceará (UFC).
Combate ao governo
O post da professora sugere, portanto, que a lista tríplice, da maneira como foi formada, impede que o Ministério da Educação exerça sua prerrogativa de escolher nomes de outros grupos políticos da instituição. Segundo uma fonte ouvida pela reportagem, a escolha do terceiro candidato da lista tríplice da Universidade Federal do Ceará estimulou este tipo de estratégia.
“Os grupos que mandam nas federais há décadas ficaram assustados com a possibilidade de perder o comando e não querem enviar para Brasília listas tríplices com nomes de membros da oposição”.
Discurso semelhante adotou um grupo de alunos do DCE da UFRPE, que gravou um vídeo (veja abaixo) logo após a escolha do professor Marcelo para encabeçar a lista tríplice. “Nós lançamos numa campanha 'reitor eleito, reitor empossado', diante dos ataques do governo federal, indicando interventores nas universidades”, eles afirmam – na verdade, o MEC tem o direito de escolher qualquer nome indicado pela lista tríplice, mesmo que ele tenha recebido menos votos na consulta interna.
A professora Anna Paula não retornou ao pedido de entrevista. Por email, o professor Inaldo Soares respondeu, na noite da última quarta-feira: “Infelizmente, não poderei conceder a entrevista que você me pede. Passei a tarde inteira em reunião e agora entrarei em aula, de onde sairei só ao final da noite”. Procurado, o professor Marcelo, que, além de atual vice-reitor, é docente do Departamento de Química, tampouco concordou em conversar com a reportagem. A universidade foi procurada, via assessoria de imprensa, tampouco se manifestou.
* Lista de apoio ao professor Marcelo, assinada pelos outros dois "concorrentes":