Como era previsível, a tentativa de retorno às aulas presenciais em todo o Brasil está longe de ocorrer com segurança e tranquilidade. Alguns estados e municípios chegaram a retomar as atividades escolares, mas tiveram que cancelar a medida dias depois, por causa de decisões judiciais ou, mais recentemente, por causa da explosão de novos casos de Covid-19 registradas após o carnaval. Com essa constatação não quero tomar partido nesse debate, mas sim apontar para um fator esquecido por quase todas as autoridades envolvidas e que, se não daria fim ao problema, com certeza amenizaria a angústia dos pais que temem pela contaminação dos filhos.
Se a educação domiciliar estivesse legalizada em todo o país, essa seria a escolha óbvia de muitos pais e mães dispostos a fazer tudo que for preciso para proteger suas crianças da doença, o que inclui abrir mão de uma renda para dar conta do acompanhamento. Para alguns, seria uma opção temporária, para outros, definitiva, mas o importante é que seria uma opção.
Hoje, ela não existe, e se algum pai ou mãe revela o desejo de tirar o filho da escola para educá-lo em casa, imediatamente é alertado, por vezes em tom de ameaça, que a instituição acionará o Conselho Tutelar. Essa cena tem se tornado especialmente frequente nas escolas privadas, que passam por uma grave crise financeira e, ao que parece, têm apelado a tudo para não perder mais alunos.
Se o direito à educação domiciliar estivesse em vigor hoje no Brasil, prefeituras e governos estaduais poderiam contar com redução na demanda por vagas em escolas públicas que, agora, fazem malabarismos para garantir distanciamento de alunos em salas de aula. Certamente, um drama comum enfrentado por muitos diretores é como colocar de 25 a 40 estudantes numa sala, garantindo um metro de distância entre carteiras que, até o início do ano passado, eram praticamente grudadas umas nas outras?
É importante esclarecer que quando me refiro à educação domiciliar, estou tratando da modalidade que garante aos pais o direito de assumir o protagonismo na educação formal de seus filhos, e não ao ensino remoto escolar, cheio de limitações, adotado de improviso pela maioria dos municípios em 2020 e que, inevitavelmente, em algum momento, seria extinto com o retorno presencial dos alunos, mesmo que as condições sanitárias objetivas para o retorno sejam, no mínimo, discutíveis. É nessa etapa que estamos.
Contudo, aqueles pais que não querem nem correr o risco de ver seus filhos entrando saudáveis, mas saindo infectados de uma sala de aula, não têm o direito de educá-los da forma como consideram mais seguro. Ainda que algumas redes e instituições tenham aberto a possibilidade dos pais escolherem se seus filhos voltam ao sistema presencial ou permanecem no remoto, o direito de educar em casa ainda lhes é negado. A única escolha que podem fazer é entre correr o risco de contaminação ou aceitar aulas monótonas e improdutivas por videoconferência. A opção dos próprios pais fornecerem aulas melhores, por si mesmos, é rechaçada pelo Estado.
Não é segredo para ninguém no meio educacional o quanto o ensino remoto imposto pelas redes de ensino, especialmente nas redes públicas, em muitíssimos casos, é de baixa qualidade e resulta em fraco desempenho. O número de professores aptos ao desafio das videoaulas, sejam gravadas ou ao vivo, é pequeno. Muitos estão aderindo a contragosto, por mero receio de represálias, portanto sem motivação.
Mesmo assim, sem lei do homeschooling, é a esse ensino que as famílias são obrigadas a sujeitar seus filhos. Moramos num país que coage os cidadãos a aceitarem educação ruim e processa aqueles que se atrevem a fazer diferente, alegando “abandono intelectual”. É um cenário insano.
Jônatas Dias Lima é jornalista e presidente da Associação de Famílias Educadoras do Distrito Federal (Fameduc-DF). E-mail: jonatasdl@live.com.
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