Opor educação domiciliar à instituição da escola é uma das estratégias favoritas dos inimigos da modalidade. Entre eles incluo não apenas os militantes mais ideologizados da esquerda, que tendem a odiar a pauta simplesmente por vinculá-la ao bolsonarismo, mas também às vertentes mais extremas dentro do próprio movimento pela legalização do homeschooling.
Os primeiros acabam assumindo o papel de profetas de um apocalipse que nunca aconteceu em nenhum lugar do mundo que tenha regulamentado a educação domiciliar, anunciando fechamento de escolas privadas e desemprego em massa para professores. Já o segundo grupo, ao promover uma demonização genérica e superficial da escola, como se a mesma fosse intrinsecamente má, sabota a própria pauta que jura defender, pois implode pontes com as sempre influentes bancadas parlamentares ligadas à educação, sem as quais é impossível aprovar qualquer lei sobre o tema, seja na versão mais liberal ou mais rigorosa.
Quando abandonamos ficções e nos atemos à realidade constatável do homeschooling em países que já o regulamentaram, notamos que, com uma legislação equilibrada, a relação entre famílias adeptas da educação domiciliar e as escolas passa a ser a de parceria. Em vários estados norte-americanos, por exemplo, famílias homeschoolers vinculadas a instituições de ensino podem fazer uso dos laboratórios de química, das quadras de esportes e das bibliotecas, sem que os pais precisem abrir mão do protagonismo que escolheram ter na educação formal dos filhos. Campeonatos esportivos, festas temáticas e competições acadêmicas promovidas pelas escolas também são acessíveis aos optantes pela educação domiciliar devidamente cadastrados junto a essas instituições. Em contrapartida, no caso das escolas privadas, essas ganham clientes que não teriam sem uma lei de homeschooling que permita às famílias esse tipo de vínculo.
Hoje, no Brasil sem lei, muitos dos pais praticantes de educação domiciliar evitam criar qualquer relacionamento com escolas por causa do medo de serem injustamente denunciados, tendo de lidar com um longo, custoso e exaustivo processo judicial, no qual terão que explicar por que seus filhos não vão à escola. Se houvesse uma alternativa benéfica tanto às famílias quanto às escolas para que essa relação conflituosa fosse evitada, certamente essa seria a opção de todos os envolvidos. As escolas ganhariam um novo tipo de cliente. As famílias poderiam dispor de estruturas inviáveis para se ter em casa e – por que não? – de uma comunidade com a qual conviver.
Os mais pessimistas podem prever prováveis desgastes na relação da família homeschooler com a direção da escola, fruto do incômodo com possíveis invasões de competência. Esse tipo de situação não é muito diferente daquela que ocorre com estudantes escolares, quando os pais se decepcionam com a instituição na qual os filhos foram matriculados. Nesse caso, se o diálogo não resolver, a transferência sempre pode ser uma opção.
É por isso que a futura lei de homeschooling do Brasil que, conforme tudo indica, envolverá o vínculo entre famílias da educação domiciliar e escolas regulares, precisa garantir a mesma liberdade de opção que os estudantes escolares têm hoje. É importante que as famílias possam optar pela matrícula na escola com a qual mais se identificam, a que respeita seus valores e a que oferece as melhores condições e serviços a esse novo público que surgirá.
Então, finalmente, pais homeschoolers poderão conversar com diretores de escola vendo-os como potenciais parceiros, e não mais como ameaça.
Jônatas Dias Lima é jornalista e presidente da Associação de Famílias Educadoras do Distrito Federal (Fameduc-DF). E-mail: jonatasdl@live.com
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