Desde abril, o Brasil tem um guia pormenorizado do que espera da educação: a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) aponta os conteúdos mínimos que devem ser trabalhados nas escolas em todos o país. Com a implementação da base, que o Ministério da Educação (MEC) espera realizar em dois anos, o texto será referência obrigatória na elaboração dos currículos feita pelas escolas para ensino infantil, fundamental e médio. No entanto, em um país de formação tão diversa como o Brasil, um currículo unificado será mesmo a melhor abordagem? Conceder mais autonomia aos estados não seria mais acertado?
A BNCC, na verdade, já prevê a inclusão de conteúdos regionais. Em um currículo, 60% do que será apresentado em sala de aula será definido pela base – o restante vai ficar a cargo dos estados e municípios, que vão escolher os demais componentes, conforme as demandas.
Nos Estados Unidos, todos os estados têm autonomia para direcionar suas políticas educacionais – assim como todas as outras. O modelo federalista impediu inclusive uma adesão maior no Common Core State Standards, a proposta de BNCC norte-americana, firmada em 2009 por 48 estados. Gradativamente, a proposta foi perdendo força. “Lá, alguns estados perceberam que o common core era bem inferior ao modelo próprio. Foi o caso de Massachussetts. Por outro lado, havia estados que não conseguiam acompanhar esse mínimo”, diz Priscila Cruz, presidente-executiva do movimento Todos pela Educação.
O novo ensino médio brasileiro vai seguir itinerários propostos por um currículo unificado. É sobre esta etapa de ensino que as discussões têm se concentrado, embaladas pela polêmica da reforma. Língua portuguesa e matemática são conteúdos fixos e há ainda cinco opções de aprofundamento: linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas e formação profissional.
Polêmicas à parte, uma ‘modernização’ que atenda aos jovens é muito importante, diz Priscila Cruz. “Hoje temos um modelo muito anacrônico. É preciso respeitar projetos de vida e até estimular esses projetos”, afirma.
Os resultados disso, porém, são controversos. Para Sandra Garcia, ex-coordenadora geral do Ensino Médio no MEC e professora na área de Políticas Educacionais na Universidade Estadual de Londrina (UEL), esse modelo vai limitar bastante as especificidades regionais. “A base também vai orientar esses 40% de estados e municípios. Mas com as áreas específicas, que serão escolhidas, na verdade, pelas escolas, de acordo com as disciplinas que vão poder oferecer”, afirma.
Já José Matias-Pereira, professor de administração pública da UnB, tem uma visão mais otimista sobre a descentralização dos currículos, mesmo com a adoção da base. “O currículo não é rígido. As partes flexíveis vão permitir que o aluno busque sua vocação e áreas de interesse”, aposta.
Competição
Nos EUA, a descentralização permite que famílias americanas optem por mudar de estado para oferecer mais oportunidades educacionais aos filhos. No Brasil, isso não seria tão simples, diz José Matias-Pereira. “Nosso modelo de federação foi copiado dos Estados Unidos, mas é preciso um nível de amadurecimento da economia, da política e da própria área de educação para avançar nesse sentido”.
Uma tentativa de nivelamento entre os estados poderia alavancar inovações importantes – primeiro localmente e, depois, para o país inteiro. “Educação tem uma conexão muito forte com a economia. Acredito que se as regiões mais desenvolvidas começarem a buscar mais autonomia, os outros estados também vão procurar se alinhar a isso”, afirma.
Modernizar
Atualmente, as unidades federativas definem seus currículos, norteados pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), criados nos anos 1990. Mesmo assim, estabelecer objetivos de aprendizado, o que a base faz de maneira bem mais detalhada, é algo necessário. Assim como a reforma do ensino médio, avalia Priscila Cruz. “Deu um impulso à trajetória de diversificação dos itinerários formativos dos jovens e, de forma acertada, induz mais fortemente a adoção pelos estados de itinerários formativos diferenciados.”
Já a professora Sandra Garcia acredita que a base, junto com a reforma do ensino médio, traz um engessamento de consequências muito negativas. “A base, junto com a reforma, está apontando o conteúdo necessário. Tudo é muito amarrado: do Enem, que vai direcionar, até a formação dos professores”, afirma. “A falta de autonomia limita o modelo formativo dos alunos. Quando falamos em ‘conteúdo mínimo’, deveria ser compreendido como algo a acrescentar muito mais elementos. Mas o que acaba acontecendo é que só se trabalha com esse mínimo”, completa.
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