Nos últimos 50 anos, a média de filhos por família passou de seis para menos de dois, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Hoje, a cada três mães, uma tem filho único. Há duas décadas, essa era a realidade de apenas uma mulher em um grupo de dez. Isso não significa que a vontade de ter uma família maior tenha diminuído: questões financeiras e de tempo para a educação se tornaram fundamentais na hora de os pais programarem quantos filhos terão.
A designer Gisella Conci Pereira e o publicitário Gustavo Gasparin, ambos de 31 anos, avaliaram tanto essas questões que ficaram com uma única filha Rafaella, de 12 anos. "Quando ela nasceu, éramos muito novos. O tempo passou e nos estabilizamos, mas mesmo assim decidimos não ter mais filhos. Educar está cada vez mais difícil, em todos os sentidos", conta Gisella.
Sem problemas
O casal conta que a filha não tem problemas de adaptação, egoísmo ou fragilidade, o que seria consequência da educação recebida com regras e limites. "O único ponto negativo de a família ficar pequena é que, no futuro, toda a responsabilidade vai ficar para a Rafaella", diz a mãe.
Segundo a empresária Milene Patrão Antonievicz, 33 anos, mãe de Níccolas, 8, apesar de a questão financeira ser determinante, a liberdade que os pais vão ganhando à medida que o filho cresce também interfere na decisão. "Com a liberdade que já recuperamos com o crescimento dele, desistimos totalmente de encomendar outro", afirma.
Dificuldades
Há mais de um século, o psicólogo norte-americano Granville Stanley Hall publicou em um livro que filhos únicos seriam pessoas mimadas, pouco sociáveis e problemáticas. De lá para cá, os filhos únicos deixaram de ser raridade, mas os mitos acerca deles continuam vivos. Apesar disso, há estudos que sugerem que crianças criadas sem irmãos são mais felizes, por não terem de dividir a atenção dos pais e se isentarem das brigas que podem ser diárias e por motivos corriqueiros, como a quantidade de guloseimas, o controle da tevê ou o videogame. Em outra linha, também há especialistas que afirmam que não há diferenças significativas no desenvolvimento emocional de crianças com ou sem irmãos.
Superproteção
Segundo a psicóloga Carla Cramer, mestre em Psicologia Clínica, os pais precisam cuidar para não serem superprotetores dos filhos únicos. "Estimular a autonomia, respeitando a faixa etária da criança é importante, pois, por mais prazeroso que possa ser estar perto e fazer as coisas por ela, corre-se o risco de tirar da criança a oportunidade de se sentir competente", diz.
A psicóloga lembra também que, mais importante que a configuração da família seja de um filho ou mais, pais casados ou separados , o que vale mesmo na educação dos filhos únicos é o investimento que se faz nas relações familiares. "O filho precisa ser preparado para a vida, para saber ouvir nãos, esperar e responsabilizar-se por suas ações", conta.
Envolvimento
A convivência deve ser estimulada
A questão das relações sociais de filhos únicos deixou de ser um problema. Hoje, a maioria das mães trabalha fora e as crianças entram na escola mais cedo, em um ambiente favorável ao desenvolvimento da socialização. "Como qualquer criança pequena, eles chegam à escolinha com dificuldades de dividir brinquedos, por exemplo. Esse é o espaço ideal para socializar, aprender a pedir emprestado e se controlar", conta a pedagoga e educadora brinquedista Andressa Machado Teixeira. Também é importante que os pais estimulem as crianças a conviver com primos e amiguinhos. Para a psicóloga Paula Pessoa Carvalho, não ter irmãos é bom para a criança inicialmente, pois ela se sente protegida e sem risco. "Isso pode acarretar insegurança quando não está na presença dos pais." Níccolas, 8 anos, por exemplo, às vezes precisa da ajuda da mãe para enfrentar conflitos. "Como não precisa disputar a atenção dos pais ou brinquedos, às vezes ele arruma briga com amiguinhos por sentir que estão invadindo seu espaço", diz a mãe, Milene Antonievicz.