Um grupo de professores e pesquisadores preferiu ficar bem longe das ruas nesta quarta-feira (15), dia em que protestos ocorrem por todos o país contra cortes na ciência e na educação. Eles afirmam que o contingenciamento é necessário para reorganizar as finanças e atingir as metas fiscais do governo e também defendem melhor eficiência no uso dos recursos.
Segundo eles, como o país vem passando por uma crise econômica importante é necessário reorganizar os recursos. E o contingenciamento, que não é um corte absoluto, pode ser revertido.
"O rombo é enorme, a economia parou de crescer. Estamos reféns da aprovação da reforma da Previdência. Se ela passar, os recursos poderão voltar", diz Ricardo Costa, pesquisador de história da arte na UFES (Universidade Federal do Espírito Santo) e assessor no MEC.
Costa relata que 70% das bolsas de pesquisa do programa de pós-graduação do qual participava na UFES foram cortadas porque a nota do programa na Capes (agência de fomento ligada ao MEC que avalia a pós-graduação no país) não melhorou.
Segundo ele, o efeito do congelamento de verbas nas pesquisas em andamento em sua área é menor, mas em outras, como biologia e medicina o impacto é imediato.
Convidado no início do ano para ser cedido ao MEC e virar assessor especial do ex-ministro Ricardo Vélez Rodríguez, Costa passou a ser assessor na gestão Abraham Weintraub com a mudança na chefia da pasta.
Eficiência
Para Luis Fabiano Farias Borges, analista de ciência e tecnologia da Fundação Capes, falta eficiência nos gastos em educação. Ele afirma que há um contraste considerável entre o baixo impacto da ciência brasileira e o de países que investem proporção similar ou inferior de seu PIB (Produto Interno Bruto) em pesquisa, como o Chile ou a Estônia.
Tal como o Brasil, a Estônia despendeu 1,3% de seu PIB na área em 2016. No entanto, nesse mesmo ano, os artigos publicados pelos pesquisadores desse país da Europa Oriental ocuparam o quinto lugar entre os mais citados (portanto, mais influentes), em média, no mundo. Já o impacto médio dos estudos brasileiros ficou em torno de 40% do dos estonianos.
"O Chile, gastando 0,5% de seu PIB com pesquisa e desenvolvimento, também tem conseguido um impacto superior ao brasileiro em suas pesquisas. Isso sugere que a eficiência econômica do gasto no Brasil está aquém do desejado."
Em sua opinião, o problema é estrutural e só poderá ser resolvido a longo prazo, com mudanças profundas na maneira como funciona o orçamento da área no país.
Impacto
Já o físico Ildeu de Castro Moreira, presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), diz que é preciso considerar que o impacto da ciência feita no Brasil não se mede apenas pelas citações de artigos científicos nacionais em periódicos especializados, mas também pelos reflexos positivos na economia e na sociedade.
"Por um lado, de fato, nós precisamos aumentar os nossos índices de cooperação internacional, o que faz muita diferença na questão do impacto. Também temos um certo problema de foco e de governança nas agências de fomento e nos sistemas de avaliação, que não podem apenas incentivar a produção de 'papers' [artigos científicos] como um fim em si mesma."
Moreira diz ainda que é um erro esperar que as universidades públicas sejam exclusivamente responsáveis tanto pela ciência básica quanto pela inovação tecnológica - esse segundo elemento também depende do interesse e dos investimentos do setor produtivo.
"Agora, isso não significa que esse impacto econômico esteja ausente do que a ciência brasileira produziu até hoje, muito pelo contrário. Já fizemos algumas apostas importantes na geração de conhecimento, lá atrás, que se transformaram em crescimento econômico. Foi o que aconteceu com a adaptação da soja ao cerrado, por exemplo - a Embrapa já demonstrou que cada R$ 1 investido na pesquisa agropecuária no Brasil se reverte em R$ 12 para a sociedade. O mesmo vale para as pesquisas sobre tecnologias de petróleo e gás, que nos renderam o pré-sal, ou para pesquisas na área da saúde."
O risco, para o físico, é que essas possibilidades sejam destruídas por cortes de verba draconianos demais. "O problema é que o país vive de espasmos nessa área. E agora parece que se deseja desmontar algo que foi construído ao longo de décadas."
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