Há pouquíssimas universidades particulares na Dinamarca, na Finlândia, na Islândia, na Noruega e na Suécia. Mesmo as que existem, e que atendem a menos de 5% do total de alunos, não cobram mensalidades – é o governo que repassa os valores para as instituições privadas. E mais: nos países nórdicos, com exceção da Finlândia, os alunos que não vivem com os pais e não trabalham recebem ajudas de custo mensais.
É assim, altamente subsidiado e totalmente gratuito, que funciona o sistema de ensino superior na região conhecida pela qualidade de vida, pela qualidade do sistema educacional e pelos baixos índices de corrupção.
LISTA: Veja características do sistema educacional dos países nórdicos
O pagamento é concedido para garantir que os estudantes recebam o mínimo necessário para se sustentar enquanto estão na faculdade. Os valores variam de valores equivalentes US$ 350 a US$ 1000 mensais, dependendo do país. Na prática, quem recebe a ajuda costuma demorar dois anos a mais, em média, para se formar – sinal de que o incentivo acaba por diminuir a disposição do estudante de concluir o curso.
Tornou-se comum, entre esses alunos, tirar um ano sabático no meio da graduação, ou fazer matrícula em poucas disciplinas em alguns semestres, com o objetivo de reduzir o ritmo e adiar a formatura. Na Dinamarca, essa parcela de alunos ganhou um apelido: são os evighedsstuderende, ou “eternos estudantes”.
Recentemente, as maiores universidades norueguesas vêm fazendo campanhas junto a seus alunos, para convencê-los a não adiar a conclusão da graduação. Algumas restrições já existem: se o aluno passar mais de dois anos além do prazo mínimo para se formar, ou tirar notas muito baixas, ou aceitar um emprego, ela perde o benefício.
Empréstimos complementares
Tentativas de mudança no sistema educacional podem esbarrar na reação popular: se a Dinamarca e a Suécia conseguiram aprovar leis que autorizam o governo a cobrar mensalidades de alunos estrangeiros com nacionalidade de países de fora da União Europeia, na Noruega uma proposta de lei parecida provocou uma série de manifestações populares, e acabou engavetada.
Mesmo com os incentivos, é comum, nestes países, que os estudantes, seja os que vivem com os pais ou não, peçam empréstimos para complementar a renda. São valores utilizados durante a vida escolar, e pagos depois da formatura, a taxas baixas. Na Finlândia, onde o pagamento de benefícios para quem não vive com a família não é utilizado, cada estudante empresta, em média, o equivalente a US$ 1300 mensais. Na Dinamarca, a mesma renda é alcançada, mas os alunos que não vivem com os pais recebem em média US$ 880 e complementam o restante com empréstimos. Na Suécia, o dinheiro que o governo paga para os estudantes responde por 20% de sua renda – o restante vem de empréstimos. Na Noruega, o pagamento mensal cobre 34% da renda total.
“A gratuidade é um direito que deve ser preservado no limite, para eles é um orgulho e uma prioridade que toda educação e todos os direitos sejam gratuitos”, explica Gregório Grisa, doutor em educação e professor do Instituto Federal do Rio Grande do Sul. “A carga tributária deles é muito elevada e o retorno dos serviços públicos, altamente qualificado”.
De fato, o ensino, nos países nórdicos, é tratado como um serviço público bancado pelo contribuinte, e não como uma commodity. O grau de financiamento público do ensino superior é de 95,9% na Finlândia e na Noruega, 94,5% na Dinamarca, 90,6% na Islândia e 89,5% na Suécia. Nos Estados Unidos, por exemplo, o nível de financiamento público é muito menor: 34,8%. Na Inglaterra, 30,2%.
O acesso às universidades, garantido pelo Estado, faz com que, na região, em geral, um terço dos adultos tenham diploma de ensino superior – no Brasil, para efeito de comparação, são apenas 15%. Segundo o levantamento anual da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico ou Econômico (OCDE) sobre a educação nos países-membros, na Dinamarca, a cultura do ensino continuado está introjetada na população, a ponto de 32% dos jovens de 25 a 29 anos continuarem estudando, o dobro da média dos países-membros do grupo.
Já na Finlândia, chama a atenção o aumento do acesso à educação superior de uma geração para outra: 35% dos adultos cujos pais não completaram o ensino médio concluíram uma faculdade. Na Islândia, 39% dos jovens com 18 a 24 anos trabalham e estudam, um índice duas vezes maior do que a média dos países da OECD – o trabalho ajuda a financiar os estudos.
Funcionaria por aqui?
Por sua vez, a Noruega gasta mais, por aluno da educação básica, do que qualquer outro país do grupo. E 48% dos jovens de 25 a 34 anos estão cursando faculdades. Na Suécia, por fim, 90% das crianças de dois a cinco anos estão na escola e a educação vocacional para estudantes do ensino médio recebe um alto investimento: US$ 16.873 por estudante, por ano.
Mas pagar para os alunos estudarem funciona? Na avaliação do professor Gregório Grisa, no Brasil, faria sentido pagar para os estudantes em dois casos. “Quando realmente são carentes e precisam de auxílio para se manter em seus cursos; e quando se quer atrair jovens para profissões específicas”. Ele exemplifica: “Por que não pagar um auxílio para alunos com altas notas no ENEM para que eles façam licenciaturas, já que temos sérios problemas de atratividade na carreira docente?”
Leia também: Com seis vezes mais alunos, Ensino Básico recebe um terço dos recursos do Ensino Superior
Números expressivos
As características do sistema educacional dos países nórdicos
DINAMARCA
* Ranking de democracia The Economist: 5ª posição, de 167 países avaliados
* Ranking do PISA: 21ª posição, de 72 países avaliados
* População: 5,7 milhões
* População com menos de 14 anos: 16% do total
* Taxa de alfabetização: 99%
* Investimento em educação: 7,6% do PIB
FINLÂNDIA
* Ranking de democracia The Economist: 8ª posição, de 167 países avaliados
* Ranking do PISA: 5ª posição, de 72 países avaliados
* População: 5,5 milhões
* População com menos de 14 anos: 16% do total
* Taxa de alfabetização: 99%
* Investimento em educação: 7,1% do PIB
ISLÂNDIA
* Ranking de democracia The Economist: 2ª posição, de 167 países avaliados
* Ranking do PISA: 39ª posição, de 72 países avaliados
* População: 338 mil
* População com menos de 14 anos: 20% do total
* Taxa de alfabetização: 99%
* Investimento em educação: 7,7% do PIB
NORUEGA
* Ranking de democracia The Economist: 1ª posição, de 167 países avaliados
* Ranking do PISA: 24ª posição, de 72 países avaliados
* População: 5,2 milhões
* População com menos de 14 anos: 18% do total
* Taxa de alfabetização: 99%
* Investimento em educação: 7,6% do PIB
SUÉCIA
* Ranking de democracia The Economist: 3ª posição, de 167 países avaliados
* Ranking do PISA: 28ª posição, de 72 países avaliados
* População: 9,9 milhões
* População com menos de 14 anos: 18% do total
* Taxa de alfabetização: 99%
* Investimento em educação: 7,6% do PIB
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