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Fachada do Ministério da Educação, o MEC
Fachada do Ministério da Educação, o MEC| Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Uma das áreas mais afetadas pela pandemia do novo coronavírus depois da Saúde, certamente, foi a Educação. Troca de ministros, escolas fechadas, atividades paralisadas e debates acerca de recursos importantes são apenas algumas das situações que pautaram o ano de 2020.

No próximo ano, Milton Ribeiro, chefe da pasta de Educação, enfrenta desafios como um inquérito no STF que apura suposto crime de homofobia por parte do ministro, a gerência do retorno às aulas e a realização de dois exames do Enem.

Procurado para falar sobre os cinco meses de gestão do MEC, Ribeiro não respondeu aos questionamentos da reportagem.

Relembre os principais acontecimentos na área em 2020

Retrospectiva da Educação
Os ex-ministros da Educação Abraham Weintraub e Carlos Alberto Decotelli, e o atual titular da pasta, Milton Ribeiro| Marcelo Camargo/Agência Brasil, Marcello Casal Jr/Agência Brasil e Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Gestão de Abraham Weintraub

Desde o início de sua gestão, Abraham Weintraub, segundo ministro da Educação do governo Bolsonaro, foi considerado pivô de muitos desgastes do Executivo com outros Poderes, partidos de oposição e, até mesmo, aliados.

Mas, além das recorrentes polêmicas nas quais Abraham Weintraub se envolveu, o ex-ministro tornou-se, sobretudo em 2020, um desafeto do STF desde a divulgação do vídeo da reunião ministerial de 22 de abril, citada pelo ex-ministro Sergio Moro no inquérito que apura suposta tentativa de interferência do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na Polícia Federal.

Na ocasião, Weintraub afirmou, entre outras coisas: "Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia. Começando no STF". A declaração gerou reação por parte do Supremo, que, dias depois, o incluiu no chamado inquérito das fake news. Ele também foi alvo de outro inquérito da Corte que apura suposto racismo por parte de Weintraub. O fato motivador da investigação foi uma publicação feita pelo ex-ministro em suas redes sociais. Em tom de sátira, ele utilizou uma imagem do gibi da Turma da Mônica, trocando R por L, para afirmar que o coronavírus é resultado de um "plano infalível" do Partido Comunista Chinês.

Essas e outras situações geraram desgaste à pasta e ao próprio governo, e o desconforto culminou no pedido de demissão de Weintraub. Ele deixou o governo em 18 de junho, e até essa, sua última decisão no MEC, foi envolvida em polêmica. Mesmo com a demissão anunciada, Weintraub se utilizou da então condição de ministro para desembarcar nos Estados Unidos e driblar as restrições de viagens para brasileiros em razão da pandemia de Covid-19. A exoneração só foi publicada após Weintraub chegar em território norte-americano. Ele assumiu um cargo de diretoria no Banco Mundial.

Entra e sai no MEC

A saída de Weintraub deu início a uma série de especulações sobre quem assumiria o cargo. A lista de cotados incluía pelo menos 10 nomes até que Carlos Alberto Decotelli, ex-presidente do FNDE, foi anunciado por Bolsonaro como novo ministro da Educação, em 25 de junho. Ele permaneceu apenas cinco dias no cargo e pediu demissão, decisão motivada pela pressão e pelos questionamentos que Decotelli vinha enfrentando acerca de suas "inconsistências curriculares". Ele não chegou a tomar posse da pasta oficialmente.

Diferentemente do que constava em seu currículo Lattes, Decotelli não obteve título de doutor na Universidade Nacional de Rosário. A Universidade de Wuppertal, na Alemanha, também negou que Decotelli tenha feito pós-doutorado na academia, como constava em seu currículo. E a Fundação Getúlio Vargas (FGV) afirmou que Decotelli não fazia parte do quadro de professores efetivos da instituição, mas atuou como "colaborador".

A pasta permaneceu sem ministro por mais de um mês, e o ex-secretário executivo, Paulo Antonio Vogel, esteve à frente até que um novo nome fosse anunciado. Apenas em 3 de setembro, Renato Feder, secretário de Educação do estado do Paraná, foi anunciado para o posto. No entanto, antes mesmo que a nomeação fosse divulgada oficialmente, grupos começaram a pressionar para que o presidente revertesse a decisão. O que levou Feder a "recusar o convite".

"Fiquei muito honrado com o convite, que coroa o bom trabalho feito por 90 mil profissionais da Educação do Paraná", disse ele em suas redes sociais, na época. Nos bastidores, contudo, a informação foi de que o próprio presidente desistiu da nomeação por pressão da chamada ala ideológica do governo.

Até então, três ministros haviam passado pela pasta em apenas 18 meses. Na época, especialistas alertaram para os efeitos danosos que o entra e sai poderia provocar na Educação do país. Sem continuidade de políticas e com recorrentes instabilidades na pasta, reformas estruturantes acabariam ficando de lado, e a articulação da pasta junto a entes federativos seria engessada.

Um novo ministro foi anunciado em 10 de setembro. Milton Ribeiro, professor e pastor presbiteriano, segue à frente da pasta.

Pandemia, tecnologia, currículo escolar

Ribeiro assumiu a pasta em meio à pandemia do novo coronavírus, quando o MEC já vinha sendo cobrado para coordenar uma estratégia nacional contra os reflexos do coronavírus na educação.

O ensino remoto em todos os níveis de ensino já havia sido autorizado pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) e pelo MEC em abril. O CNE também aprovou a junção dos anos letivos de 2020 e 2021.

No início do ano, a pasta disponibilizou uma plataforma digital para toda a rede federal, para que pudesse ministrar aulas online. Das 69, apenas seis aderiram. Enquanto isso, sem a ajuda das instituições, alguns professores, isoladamente, despontaram e mobilizaram estudantes para seminários e aulas online. A justificativa, na maior parte das situações, para a não utilização dos recursos digitais era a falta de acesso e conectividade à internet por parte de alguns alunos.

O MEC foi amplamente cobrado para implementar estratégias nesse sentido. O uso das chamadas tecnologias da informação e comunicação (TICs) foi, inclusive, tema de questionamento do Tribunal de Contas da União (TCU) ao ministro. Em fórum online, o órgão cobrou o MEC por mais tecnologia nas escolas, ao passo que Ribeiro, quando questionado, concordou sobre a necessidade, embora tenha listado outras prioridades, como a consolidação da alfabetização no país.

Na ocasião, o ministro comentou brevemente sobre a possibilidade de distribuir tablets para alunos da rede pública de ensino e digitalizar livros didáticos. E afirmou que o governo estuda, para um "futuro próximo", um possível projeto-piloto por meio do qual poderia fornecer a ferramenta para algumas instituições. Nenhuma dessas ideias, contudo, saiu do papel.

Após meses sem aulas, iniciativas de médicos, pais e professores surgem para discutir e incentivar o retorno das aulas. Leia mais sobre a volta às aulas.

Estagnação e derrotas

Como previsto, a pandemia gerou estagnação de algumas políticas e engessamento das ações do MEC, uma vez que o próprio STF havia dado poder para que estados e municípios gerissem a crise. Projetos como o Future-se, que tramita no Congresso desde 2019, desapareceram das discussões. E a regulamentação do homeschooling - visto como potencial modelo na pandemia, em função da necessidade de isolamento social - também acabou ficando fora de pauta.

Importantes documentos como o Renabe, Relatório Nacional de Alfabetização Baseada em Evidências, da alçada da Secretaria de Alfabetização do MEC, também deixaram de ser publicados neste ano. A previsão era de que isso ocorreria em abril.

No cenário federal, apesar da maior aproximação do MEC com entes subnacionais e representantes da educação, a pasta contabilizou ao menos duas "derrotas" significativas. Após lançar a nova Política Nacional de Educação Especial (PNEE), o ministério foi criticado e sofreu pressão por parte de parlamentares. O assunto chegou ao STF, que suspendeu a política.

Por pressão de universidades e representantes da educação, a pasta também voltou atrás de decisão que estabelecia que as instituições de ensino superior do país retornassem às aulas presenciais a partir de janeiro. Houve recusa por parte de muitos grupos e o MEC acabou cedendo. A mais recente decisão nesse sentido estabelece o retorno para março de 2021 e permite ensino remoto em caráter "excepcional".

Fundeb: a prioridade na Educação em 2020

Durante pandemia, a necessidade de uma PEC que tornaria o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) permanente foi um dos principais temas discutidos. O fundo acabaria em dezembro de 2020 caso o Congresso Nacional não o tornasse parte da própria Constituição Federal. O Ministério da Educação foi criticado por ter se omitido das discussões e debates acerca do tema.

A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 15/15, que trata da renovação do fundo, foi aprovada com "folga" na Câmara dos Deputados em 22 de julho. Aproximadamente um mês depois, o Senado também o aprovou.

Câmara e Senado votaram o Projeto de Lei 4.372/2020, que regulamenta o repasse de recursos Fundeb. O texto voltará à Câmara. Se não tivesse sido aprovada, a proposta poderia ser extinta.

Enem

O adiamento do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) também foi tema de ampla discussão no Brasil em 2020. Desde o início da pandemia no país, em março, estudantes e educadores cobravam o governo para se posicionar com relação à aplicação do teste. O MEC, por outro lado, alertava para as consequências indesejadas com o adiamento, como o atraso nos calendários do Sistema de Seleção Unificada (Sisu), do Prouni, e do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies).

Inicialmente, as provas do Enem impresso estavam marcadas para 1º e 8 de novembro e, para a versão digital, nos dias 22 e 29 de novembro de 2020. Mas, "atento às demandas da sociedade", Inep e MEC "decidiram pelo adiamento da aplicação dos exames". A prova impressa será realizada em 17 e 24 de janeiro e, em formato digital, nos dias 31 de janeiro e 7 de fevereiro de 2021.

O número de infectados e mortes pelo coronavírus aumenta no país, mas o Inep afirma que mantém a realização da prova, até segunda ordem.

Literacia, Graphogame e Capitação 4.0

Pelo menos três ações de grande porte foram lançadas pelo MEC neste ano. Em setembro, o governo anunciou uma parceria entre a pasta de Educação e o Ministério da Cidadania que levará às famílias beneficiárias do programa Criança Feliz, cujo alvo prioritário são beneficiários do Bolsa Família e do BPC2, kits de literacia. O objetivo é estimular o envolvimento familiar na aprendizagem e contribuir para a melhoria do processo da alfabetização. Cerca de 394 mil famílias devem ser contempladas em 2,5 mil municípios brasileiros.

Outubro foi o mês em que a pasta anunciou o "Capacitação 4.0", parceria do MEC com a Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai). Alunos dos institutos federais e universidades públicas serão capacitados para desenvolver projetos que atendam às necessidades do setor produtivo brasileiro, principalmente, nas áreas de tecnologia e inovação.

Em novembro, a Sealf anunciou mais uma ação decorrente da Política Nacional de Alfabetização: o jogo Graphogame, material digital de aprendizagem que dá ênfase ao conhecimento alfabético e à consciência fonológica. Ele é resultado de uma iniciativa científica internacional. O MEC espera que esse seja um instrumento de auxílio à literacia familiar, mas, em especial, uma ferramenta para os professores utilizarem nas escolas. O aplicativo será disponível em versão offline. Questionado sobre como a ação alcançará famílias socioeconomicamente vulneráveis, o MEC não informou qual será a estratégia.

Histórias inspiradoras em Educação

Além das polêmicas e das dificuldades provocadas pela pandemia, histórias inspiradoras marcaram a Educação no ano de 2020.

Como, por exemplo, o caso envolvendo a professora Joyce Barcelos Barbosa. Desde o início da pandemia, todas as segundas-feiras, das 8h30 às 12h30, ela percorreu 70 quilômetros para atender a Edilson Gomes Monteiro, aluno de 15 anos, surdo, e que ficaria totalmente desamparado não fosse a iniciativa da professora. Na casa de Edilson, área rural de Bananal do Sul, Santa Catarina, não há telefone ou internet.

“Enfrentar a lama e os 70 quilômetros de ida e volta até a casa do Edilson não é fácil, mas todo esforço vale a pena no momento em que eu o vejo sentado embaixo da árvore com um sorriso me esperando”, contou a professora à equipe do Sempre Família.

No Rio de Janeiro, a iniciativa da professora Maura Silva, também contada pelo Sempre Família, chamou a atenção. A saudade de abraçar os alunos a fez confeccionar kits de proteção individual para entregar a quase 60 estudantes em suas residências. “Já estava me fazendo muito mal esse distanciamento de não poder olhar todo dia, abraçar todo dia, e ficar com eles todos os dias”, contou à reportagem, em agosto. Ela leciona aos alunos do terceiro ano do ensino fundamental, na Escola Municipal Frei Vicente do Salvador, em Padre Miguel, Zona Oeste do Rio.

Máscaras, luvas, capas e trilha sonora de carro de som: foi assim, seguindo rigorosamente as recomendações de proteção das autoridades sanitárias e com o aval das famílias, que Maura pôde dar o primeiro abraço nos alunos em meses, desde a pandemia teve início. Os estudantes também foram presenteados com sacolas de doces e outras lembrancinhas. Os encontros foram realizados no portão das residências.

Ainda no contexto da pandemia: após ter conhecimento de que seus alunos, residentes da área rural de Garuva, em Santa Catarina, não tinham internet para receber ou enviar atividades escolares, nem mesmo para ter informações a respeito dos “kits de merenda” que a escola estava a oferecer, Cleusa Regina Vargas, de 60 anos, decidiu percorrer 40 quilômetros pela lateral da BR-101 até a casa de seus alunos.

Inicialmente, sem poder contar com qualquer tipo de ajuda de custa do estado ou da escola, a docente fez o percurso sozinha e a pé, para levar atividades e cestas aos alunos.

Desafios para 2021

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