“Homeschooling deveria ao menos ser uma opção”, diz Donelly.| Foto: Hugo Harada Gazeta do Povo

Permitido em quase 63 países, o homeschooling é uma modalidade de ensino com cada vez mais adeptos. Voltada ao autodidatismo, nela, pais ou tutores assumem a responsabilidade pela educação dos filhos em idade escolar ao invés de enviá-los ao sistema educacional padrão. 

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Com mais de 2 milhões de praticantes  nos Estados Unidos, o modelo de educação domiciliar tem ganhado força no Brasil nos últimos anos. De acordo com a Aned (Associação Nacional de Educação Domiciliar), no Brasil, aproximadamente 5 mil famílias adotam o homeschooling. Isso significa cerca de 10 mil crianças e adolescentes ensinados a domicílio.

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Além disso, a procura pela modalidade cresceu 965% entre 2010 e 2016; os motivos são vários e vão desde a insatisfação com o ensino oferecido nas escolas públicas, o alto custo do ensino particular tradicional, até o anseio por maior segurança física e psicológica das crianças. 

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No início de 2019, o governo prometeu regulamentar a prática, através de Medida Provisória, nos 100 primeiros dias de mandato de Jair Bolsonaro. O texto da proposta deve ser divulgado nesta sexta-feira (15).

Para esclarecer as principais dúvidas sobre o modelo, a Gazeta do Povo entrevistou Mike Donelly, advogado e Diretor Internacional da Home School Legal Defense Association, entidade que defende o ensino domiciliar mundialmente. Confira: 

A educação domiciliar é melhor do que a tradicional? 

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Acredito que sim, quando você avalia por meio de diferentes critérios. Quando você mede critérios como índices acadêmicos e conquistas no âmbito social, é possível dizer que alunos que estudaram em casa têm melhor desempenho do que os que estudaram em escolas regulares. Mas essa é uma decisão dos pais. Eles que deveriam decidir como seus filhos são educados. O que acredito é que o homeschooling deveria ao menos ser uma opção: se os pais desejam escolher o melhor tipo de educação para seus filhos, eles deveriam ter essa opção. 

Crianças ensinadas em casa têm problemas de socialização? 

Existem duas perguntas para se fazer diante dessa questão: o que é socialização e qual a melhor forma de promovê-la? A socialização é o processo pelo qual pessoas aprendem a lidar umas com as outras, que aprendem a viver em sociedade e fazer parte dela. Esse processo acontece independente de onde a pessoa esteja. As pessoas pensam que as crianças “homeschoolers” ficam em casa o tempo todo e isso não é verdade. O que você vê na realidade é que as crianças imersas na educação domiciliar são bem socializadas. 

Para se dar bem na sociedade, você deve ter autoconfiança e não ficar se comparando com os outros, mas é isso que acontece nas escolas. Quando você coloca várias crianças em grandes salas surgem problemas de socialização. Estamos felizes com a forma de socialização que está vindo de nossas escolas? Essa é a melhor forma de preparar crianças para aprender? Colocar em uma sala de quatro paredes e aprisioná-las lá durante todo o dia só interagindo com pessoas da sua idade e um adulto? É assim que se aprende a viver em sociedade? Eu diria que essa é uma maneira muito pobre de se definir socialização. 

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Como garantir que os pais estão de fato ensinando seus filhos? 

Creio que qualquer pessoa que opte pela educação domiciliar está levando a sério a educação do seu filho, desde que ela não esteja usando isso como desculpa para levar a criança a uma situação de trabalho infantil. A educação não deve ser negligenciada. E como saber se ela está sendo ou não? Existem formas do governo averiguar isso. Acredito que o governo só deve intervir em casos onde há abuso ou atividade criminosa. Pais que impedem seus filhos de aprender para forçá-los a trabalhar não estão fazendo educação domiciliar, elas estão infringindo a lei e deveriam ser responsabilizadas. 

Como o homeschooling poderia funcionar em países com baixos índices educacionais? 

O homeschooling pode funcionar em qualquer lugar. Na verdade, acredito que até mesmo pais que não são alfabetizados podem educar seus filhos em casa, desde que eles tenham acesso a alguns materiais. Uma pesquisa feita na Índia mostra que as crianças só precisam de encorajamento e acesso à informação para aprender. Na situação em questão, foi colocado um computador em um das vilas mais pobres da Índia e as crianças da vila aprenderam sozinhas como usar o computador e como ler em inglês. Com suporte, encorajamento e acesso à alguns materiais, qualquer um pode aprender. 

Quais são as vantagens da educação domiciliar? 

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É possível dar maior atenção por terem menos crianças por professor/tutor e, por isso, é possível atender necessidades específicas. Além disso, é possível ter um programa de estudos personalizado para cada criança, considerando que cada pessoa é diferente e aprende de maneira diferente. O ambiente do lar é quase sempre mais seguro e muito mais calmo do que a escola pública, o que contribui para sua concentração. Crianças com necessidades especiais, sejam físicas, emocionais ou psicológicas, muitas vezes não se encaixam no sistema escolar, já que ele não oferece o que eles precisam. 

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A opção pelo ensino domiciliar é um direito dos pais? 

Um dos direitos mais fundamentais é que os pais possam determinar como educar seus filhos, é isso que diz o artigo 26 da Declaração Universal dos Direitos Humanos. É isso que todos os documentos internacionais de direitos humanos dizem, que os pais têm o direito de ensinar conforme suas convicções. Então dizer que essa forma de educação não é permitida é, sim, uma violação aos direitos humanos. 

Se os pais podem educar seus filhos, porque investir na formação de professores? 

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Bem, se você tem escolas governamentais, você precisa de professores. Uma pergunta justa é: por que investir em escolas públicas? Não sou contra a escola pública, o que critico é as pessoas serem obrigadas a optarem somente por esse tipo de educação. Nós complicamos a educação. Não creio que se tenha que ter um diploma para ser professor; pesquisas mostram que não há correlação entre o processo de aprendizagem e o preparo do professor. Não há nada de errado em estudar educação, mas será que isso deveria ser um requisito para ser professor? Quantas crianças estão felizes nas escolas? Elas sentem que estão aprendendo? Muitas crianças diriam que não, que elas estão lá porque tem que estar. Existem muitas pessoas sem certificado que seriam excelentes professores, mas o sistema criou barreiras para impedi-las de ensinarem. 

Qualquer um pode ensinar em casa? 

O ensino domiciliar é para todo mundo, mas não é para qualquer um. Qualquer um que deseja fazê-lo deveria poder, mas nem todo mundo está disposto a fazer esse sacrifício. As pessoas precisam decidir por si mesmas se elas querem isso ou não.