Estação Antártica Comandante Ferraz, prestes a ser inaugurada.| Foto: Divulgação/MCTI

Desde a adesão, em 1975, ao Tratado de Antártida, pela primeira vez o Brasil corre sério risco de perder liderança na América Latina em pesquisas no Polo Sul e o direito a voto nas deliberações de uso do continente antártico. 

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O motivo é a falta de liberação de dinheiro por parte do governo para manter estudos em andamento, além de iniciar novas pesquisas. Uma das exigências para adesão ao Tratado de Antártida é a “substancial atividade de pesquisa científica”, o que levou, em 1982, à criação do Programa Antártico Brasileiro (Proantar).

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“Levamos 15 anos para adquirir a liderança latino-americana na pesquisa antártica. Se pararmos nossos investimentos – mínimos, em média cerca de R$ 4 milhões a R$ 5 milhões por ano – em dois ou três anos perderemos a liderança”, lamenta Jefferson Simões, vice-presidente do Scientific Committee on Antarctic Research (SCAR, sigla em inglês). 

Retrocesso

As pesquisas brasileiras na Antártida estão sem edital de recursos de financiamentos de projetos, desde 2013. Foram ofertados, no último deles, R$ 14 milhões para 19 projetos. Porém, a verba foi liberada com três anos de atraso e o valor se mostrou defasado, acabando em pouco tempo.

Ainda de acordo com Jefferson Simões, o dinheiro serve basicamente para pagar insumos, manutenção de laboratórios, taxas de publicações, diárias de pesquisadores, bolsas de mestrandos, doutorandos e de pós-doutorado, e passagens aéreas até o Sul do Chile, na cidade de Punta Arenas – o Proantar realiza o translado via FAB ou Marinha a partir da cidade chilena. 

“Os recursos deveriam ter durado até 2016. Infelizmente, devido à crise econômica, os cortes nos afetaram muito. Muitas pesquisas foram reduzidas ao mínimo, dispensamos bolsistas e estamos quase parando estudos laboratoriais”, diz Simões. 

A pesquisa sem dinheiro 

As pesquisas brasileiras na Antártica contemplam os mais variados temas de prospecção de micro-organismos, biotecnologias, oceânicos e atmosféricos que afetam diretamente o Brasil. 

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Um dos estudos é a da equipe do pesquisador Luiz Henrique Rosa, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Ela analisa a diversidade de micro-organismos antárticos como fonte de substâncias de interesse da biotecnologia para diversas funções, como a fabricação de novos antibióticos contra doenças tropicais negligenciadas (dengue, zika, leishmaniose, doença de chagas). 

“Perdemos a oportunidade de realizar experimentos na Antártica e nos laboratórios no Brasil com mais qualidade e assim perdemos oportunidades de boas publicações e consolidação do Brasil como líder em pesquisas antárticas. Também estamos parados quanto à questão do uso biotecnológico dos organismos antárticos, o que atrasa a obtenção de bioprodutos capazes de movimentar a economia brasileira. Ainda enfrentamos problemas quanto ao monitoramento do clima da Antártida, o qual tem grande impacto na agricultura do Brasil”, relata Rosa. 

Outro problema que atinge os projetos é a redução de capital humano para desempenhar funções no continente. Isso gera um voluntariado forçado e uso do dinheiro do próprio bolso da pessoa que se dispõe em auxiliar nos estudos. 

“Começamos por dispensar alguns bolsistas, pois as cotas das bolsas encerram e a única coisa que podemos oferecer para os alunos de graduação (e alguns de pós-graduação) é que permaneçam como voluntários”, diz Jefferson Simões, que também é professor titular da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). 

Todo esse cenário ocorre às vésperas da inauguração prevista para início de 2019 da nova Estação Antártica Comandante Ferraz. A reconstrução da base, vítima de um incêndio em 2012, custou cerca de US$ 100 milhões. 

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“Se não sair o edital novo, o Proantar entrará em colapso. Ou seja, teremos uma casa vazia. A estação não servirá para nada”, prevê Simões. 

Ministério prevê edital 

Segundo o Ministério da Ciência, Tecnologia e Informação (MCTI), existe uma expectativa de lançar um edital de R$ 18 milhões para pesquisas até 2022. 

“Do total, R$ 7,1 milhões são do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) e R$ 2,9 milhões do orçamento da pasta. O Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) vai destinar R$ 1,5 milhão, enquanto a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) vai aportar R$ 5,7 milhões. A chamada pública também receberá R$ 900 mil em emendas parlamentares”, detalha o MCTI em nota enviada à Gazeta do Povo

Apesar da previsão, os cientistas não trabalham com a certeza de que as pesquisas terão andamento em razão da possibilidade de demora dos recursos, permanecendo as chances de 2019 iniciar sem pesquisadores brasileiros em solo antártico.

“Se não for confirmado o novo edital de pesquisa, ou se for confirmado e não houver o repasse dos recursos para os projetos aprovados, a parte científica do Proantar entrará em colapso e não ocorrerá a participação de cientista na Antártica no verão de 2019/2020”, conclui Simões.

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