Um trocadilho com uma música hip hop de cantores negros impediu um grupo de estudantes de um grêmio nos Estados Unidos a realizar um evento filantrópico na American University , em Washington D.C. A atividade esportiva iria se chamar “Bad (minton) and Boujee”, uma brincadeira com a canção “Bad and Boujee”, do trio de hip hop Migos. A universidade, porém, se recusou a aprovar a iniciativa se o nome não fosse alterado. O problema? Os alunos estariam fazendo “apropriação cultural”, ou seja, utilizando algo próprio de uma cultura sem o direito de fazer isso.
A decisão causou polêmica entre os estudantes – não seria a apropriação da apropriação? A música em questão trata de negros que são “novos-ricos” e suas mulheres “materialistas”. “Boujee” é a fala informal de “bourgeois”, que significa burguês. O termo tem origem primeiro no latim e depois no francês – popularizada com o sentido de “classe média que sustenta o capitalismo” pelos textos de Karl Marx. Nas ruas dos Estados Unidos, a palavra “girializada” passou a ser sinônimo de pobres que ascendem socialmente, principalmente os negros.
Rocco Cimino, de 20 anos, presidente do grêmio Sigma Alpha Mu, conta que o título “Bad (minton) and Boujee” foi criado em uma reunião com outros estudantes, quando alguém teve a ideia de fazer um torneio de badminton para arrecadar fundos para uma instituição beneficente. Como a música “Bad and Boujee”, de 2016, rendeu vários memes na internet e encabeçou rankings de audiência, os alunos acreditaram que seria um bom marketing para o evento. Mas o tiro saiu pela culatra e a iniciativa acabou sendo cancelada.
“A universidade demorou demais para responder aos nossos e-mails, e o último que enviamos ficou parado lá uma semana sem resposta”, disse a Sigma Alpha Mu numa postagem do Facebook na terça-feira, anunciando a decisão. “Por isso, nós não tivemos tempo de arrecadar fundos ou organizar o evento enquanto a sua confirmação ficasse nesse limbo e subsequentemente decidimos cancelá-lo”.
Após desenvolver a ideia do torneio de badminton, o grêmio enviou um pedido para reservar uma área no campus, como é de praxe, segundo Cimino. Após anunciar o torneio, porém, Cimino recebeu um e-mail no dia 30 de março do diretor assistente de clubes estudantis, Colin Gerker, no qual ele dizia que suspeitava que “o nome do evento atrairia críticas pelo uso da palavra ‘boujee’”.
“Eu sei que é um termo coloquial e foi popularizado pelo Migos, mas já tivemos grupos no passado que foram criticados por apropriação cultural em situações como essa”, escreveu Gerker no e-mail.
“Honestamente, eu achei que isso era bem típico da universidade mesmo”, disse Cimino, quando lhe perguntaram sobre sua reação ao e-mail. Então, ele comunicou aos outros estudantes que precisavam pensar em outro nome. Mas, segundo Cimino, os representantes do grêmio decidiram tentar “dialogar” com a universidade. A American University é uma faculdade particular que conta com cerca de 13 mil alunos. A maior parte dos estudantes do Sigma Alpha Um é branca e judia, mas há pessoas de outras raças e religiões.
Cimino respondeu ao diretor, no dia 2 de abril, contando que havia compartilhado a sugestão de mudança de nome com os outros líderes do grêmio que ficaram “perplexos”. Ele tentou defender o nome dizendo que foi “inspirado” pelo Migos e que era um trocadilho com badminton. Ele citou ainda a definição do site Urban Dictionary para a palavra “boujee” e disse que o nome do evento era uma tentativa de “fazer com que o esporte badminton fosse mais interessante e intrigante para os universitários, para que tivéssemos mais gente comparecendo e fazendo doações, que seriam direcionadas a uma organização de caridade que ajuda veteranos de guerra a tratar de sua saúde mental”. O evento em si, diz ele, não teria nada de “burguês”.
“No geral, nós não conseguimos ver como é que uma única palavra, que significa algo como ‘de classe alta’ é capaz de desqualificar o evento inteiro, quando o próprio título é em si uma comemoração do ‘Sonho Americano’ e da capacidade de três jovens de uma das áreas mais difíceis do país o conquistarem”, escreveu Cimino. “Nós também não entendemos como que haveria uma ‘cultura’ associada ao ‘boujee’ e, mesmo que houvesse, o evento não tem a menor relação com o nome”.
Gerker respondeu no dia 11 de abril dizendo que havia recebido “múltiplas” reclamações quanto ao título do evento em si. Em resposta, Cimino pediu para ver uma cópia de uma dessas reclamações por escrito e disse que o evento em si não teria nada a ver com uma tal “cultura ‘boujee’”.
“Além do mais, a gente não entende nem como é que haveria uma cultura própria à ‘burguesia’”, disse ele. “Todos os casos de apropriação cultural relatados que eu encontro on-line estão ligados a etnias. A burguesia é um status econômico que, em tese, qualquer um pode atingir ou aspirar. Chamar isso de cultura iria contra todo o argumento da apropriação cultural, não?”
Justificativa
Num e-mail ao Washington Post, Camille Lepre, vice-presidente assistente de comunicação da American University, disse que alguns alunos ficaram preocupados com o nome do evento, mas afirmou que a universidade não tinha nenhuma política que forçasse os alunos a alterá-lo. A situação não acompanhou “o processo normal” da universidade “para lidar com organizações estudantis”, disse ela, e a American estava se esforçando para resolver a situação. “A natureza e título de certos eventos poderiam ter um impacto negativo e consequências imprevistas no campus e, apesar de a universidade não proibi-los de acontecer, a nossa Secretaria de Convivência no campus procura trabalhar com o grupo estudantil, educá-lo sobre o possível impacto sobre os seus colegas, discutir algumas opções e permitir que eles decidam como irão prosseguir”, ela escreveu por e-mail. “Isso faz parte da experiência estudantil”.
Segundo ela, os diretores da American deveriam ter dito aos representantes da Sigma Alpha Mu que a decisão de como proceder nessa questão dependia deles.
“Nós não acertamos inicialmente, mas estamos nos esforçando para chegarmos a um resultado aceitável para o grêmio”, escreveu ela no e-mail. “Um funcionário sênior entrou em contato com o grêmio para esclarecer o papel de assessoria da universidade e o direito do grupo de tomar as suas próprias decisões e prosseguir com o evento. O grêmio e esse funcionário terão uma reunião para discutirem melhor essa questão pessoalmente”.
O dinheiro arrecadado com o torneio de badminton deveria ir para a Armor Down, uma organização que visa a ajudar os veteranos do exército a lidar com transtornos de saúde mental. O grêmio começou agora a arrecadar dinheiro on-line para a caridade e já conseguiu juntar mais de US$1000 desde a terça-feira da semana passada.
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