Quando o assunto é reforma educacional, geralmente há dois lados: o daqueles que querem melhorar o atual sistema de educação compulsória de massa por meio de tentativa e erro e o daqueles que querem construir algo completamente novo e diferente. Obviamente, o cofundador da Apple, Steve Jobs, estava no lado do “pense diferente”, defendendo a liberdade de escolha e vouchers educacionais, enquanto Bill Gates, da Microsoft, dava apoio ao Currículo Único Estadual e outras reformas paulatinas dentro do modelo convencional de educação de massa.
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Os esforços da Fundação Gates
A Bill and Melinda Gates Foundation investiu centenas de milhões de dólares na educação fundamental nos últimos vinte anos, incluindo um aporte de US$ 280 milhões para o Currículo Único, que pessoas de todo o espectro político passaram a desprezar por sua padronização do ensino e intervenção governamental. Ainda nesta semana, a Fundação Gates anunciou que daria mais US$ 10 milhões para treinamentos dados aos professores sobre o currículo de “alta qualidade”. A instituição de caridade está prestes a alcançar seu objetivo de doar quase US$ 2 bilhões à educação fundamental até 2022.
Esses enormes esforços filantrópicos, juntamente com os quase US$ 700 bilhões por ano que os contribuintes norte-americanos gastam na educação fundamental de massa, quer dizer que os norte-americanos gastam mais em educação do que qualquer outro país, mas com resultados para lá de decepcionantes. O enfraquecimento lento da educação padrão talvez não esteja sendo muito bom.
Jobs percebia a necessidade de ruptura
Steve Jobs percebia isso. Ele entendia que uma verdadeira transformação educacional exigiria romper com todo o modelo de educação de massa. Assim como fez com seus revolucionários produtos Apple, Jobs imaginou um sistema educacional inovador, experimental e individualizado. Numa entrevista de 1995 para o Smithsonian Institution, Jobs reafirmou seu apoiou aos vouchers e à educação empreendedora:
Acredito mesmo que, se o país desse a cada pai um voucher de quatrocentos dólares a ser gasto numa escola autorizada qualquer, muitas coisas aconteceriam. Primeiro, as escolas começariam a se exibir para atrair alunos. Depois, acho que veríamos várias escolas sendo fundadas... Você poderia ter pessoas de vinte e cinco anos recém-saídas da faculdade, cheias de idealismo e de energia para fundarem uma escola, em vez de entrarem para uma empresa no Vale do Silício. Acredito que elas se sairiam bem melhor do que qualquer uma de nossas escolas públicas. Em terceiro lugar, outra coisa que você veria é um aumento na qualidade no ensino, assim como se vê no livre mercado. Algumas das escolas fechariam as portas. Muitas escolas públicas fechariam as portas. Não há dúvida disso. Seria sofrido nos primeiros anos... Mas acho que é muito menos sofrido do que ver as crianças passando pelo sistema como ele é hoje.
Para Jobs, os vouchers eram apenas uma peça no revolucionário quebra-cabeça da educação. Ele percebia que uma abordagem paulatina da reforma do modelo existente de educação de massa não funciona por causa das estruturas de poder e das tendências burocráticas inerentes ao ensino convencional. Na mesma entrevista ao Smithsonian, Jobs disse:
Gostaria que as pessoas que dão aula aos meus filhos fossem boas o suficiente para conseguir um emprego na empresa para a qual trabalho, ganhando centenas de milhares de dólares por ano. Por que elas deveriam trabalhar numa escola por trinta e cinco ou quarenta mil dólares por ano se são capazes de arranjar um emprego aqui ganhando cem mil dólares por ano? Isso é um teste de inteligência? O problema, claro, são os sindicatos. Os sindicatos são a pior coisa que já aconteceu para a educação, porque não são meritocráticos. Ele transforma a educação numa burocracia, e foi exatamente isso o que aconteceu. Os professores não podem lecionar e os diretores não podem administrar o lugar e ninguém pode ser demitido. É horrível.
Duas experiências diferentes, duas visões de mundo diferentes
As diretrizes educacionais diferentes apoiadas por Gates e Jobs talvez se devam, em parte, às experiências dos dois na infância. Gates frequentava uma escola privada de tempo integral, a Lakeside School, em Seattle, Washington, e disse em 2005: “A Lakeside foi uma das melhores coisas que já me aconteceu”.
Jobs, por outro lado, tinha uma reação muito menos favorável quanto à sua educação pública. Ele contou:
A escola foi muito dura para mim no começo. Minha mãe me ensinou a ler antes de eu entrar para a escola e, assim, quando cheguei lá eu só queria fazer duas coisas. Queria ler livros, porque amava ler, e queria sair e caçar borboletas. Você sabe, coisas que uma criança de cinco anos gosta de fazer. Mas lá me deparei com uma autoridade bem diferente da que conhecia, e não gostei nem um pouco. E eles quase me prejudicaram. Eles chegaram perto de tirar de mim qualquer tipo de curiosidade.
Apesar de os dois magnatas da tecnologia terem abandonado a faculdade para fundar empresas extremamente bem-sucedidas, as opiniões deles sobre as políticas educacionais do ensino fundamental refletem muitas das diferenças que vieram a simbolizar duas respectivas empresas. O lema visionário da Apple, “Pense diferente”, desafia o status quo, enquanto o lema da Microsoft, “Empoderando todos nós” talvez apenas capte a próxima mudança estética num caminho já trilhado.
* Kerry McDonald é formada em economia pela Bowdoin e tem mestrado em política educacional por Harvard. Ela mora em Cambridge, Massachusetts, com seu marido e quatro filhos que nunca foram para a escola. É autora do livro “Unschooled: Raising Curious, Well-Educated Children Outside the Conventional Classroom”.
Tradução de Paulo Polzonoff Jr.
©2019 Foundation for Economic Education. Publicado com permissão. Original em inglês.
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