O prefeito do município de Luís Domingues (MA), Gilberto Braga (PSDB), afirmou em entrevista gravada para o Estadão, que o pastor Arilton Moura teria pedido R$ 15 mil antecipados para dar andamento às demandas da prefeitura junto ao Ministério da Educação (MEC) e mais um quilo de ouro. Moura não é servidor da pasta, mas supostamente teria poder de influência sobre o ministro Milton Ribeiro, que também é pastor. O ministro, procurado, até agora não se pronunciou sobre esta nova acusação.
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“Ele [Moura] disse que tinha que ver a nossa demanda, de R$ 10 milhões ou mais, tinha que dar R$ 15 mil para ele só protocolar [o pedido no MEC]. E, na hora que o dinheiro já estivesse empenhado, era para dar um tanto, um 'x'. Para mim, como a minha região era área de mineração, ele pediu 1 quilo de ouro”, afirmou Braga ao Estadão.
A conversa com Arilton teria ocorrido em abril do ano passado, durante um almoço no restaurante Tia Zélia, em Brasília, após uma reunião com Ribeiro. O encontro, fora da agenda oficial do ministro, teria sido solicitado pelos próprio Arilton Moura e pelo pastor Gilmar Santos, presidente da Convenção Nacional de Igrejas e Ministros das Assembleias de Deus no Brasil. Segundo disse Braga, o número de uma conta corrente dos pastores era repassada aos prefeitos para o depósito da "taxa" de R$ 15 mil.
Braga afirmou ainda que os pastores não faziam nada escondido. “Ele (Arilton) falou, era um papo muito aberto. O negócio estava tão normal lá que ele não pediu segredo, ele falou no meio de todo mundo. Inclusive, tinha outros prefeitos do Pará. Ele disse: ‘Olha, para esse daqui eu já mandei tantos milhões, para outro, tantos milhões’”, disse. Ao Estadão, o prefeito afirmou não ter pago a taxa e não ter recebido os recursos que solicitou no MEC.
Outras acusações e reações no Congresso
Nesta terça-feira (22), após a publicação de reportagem da Folha de S. Paulo, na noite desta segunda-feira (21), com um áudio do ministro da Educação, Milton Ribeiro, que sugere favorecimentos na distribuição de recursos da pasta - a pedido do presidente da República Jair Bolsonaro -, houve forte reação de parlamentares da Câmara dos Deputados e do Senado, tanto de aliados quanto de opositores do governo Bolsonaro. O ministro negou todas as acusações relacionadas a um possível favorecimento a pedido dos dois pastores e divulgou uma nota de esclarecimento (leia abaixo).
Em Brasília, parlamentares das duas casas legislativas acionaram diferentes órgãos do poder público contra o comandante do MEC e contra o presidente da República. O senador Alessandro Vieira (PSDB-SE), os deputados federais Tabata Amaral (PSB-SP), Felipe Rigoni (União Brasil-ES), Kim Kataguiri (União-SP) e Túlio Gadêlha (PDT-PE) e o secretário municipal de Educação do Rio de Janeiro, Renan Ferreirinha (PSD-RJ), entraram com representações na Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o ministro. Os parlamentares pedem que Ribeiro seja investigado por suspeita de cometimento de improbidade administrativa e tráfico de influência devido ao suposto favorecimento em sua administração.
Além deles, o senador Fabiano Contarato (PT-ES) encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) uma notícia-crime contra Ribeiro. Ele também pediu a investigação de outros membros do MEC por suspeita de envolvimento nos supostos favorecimentos de recursos públicos. O parlamentar atribuiu ao chefe da pasta da Educação as práticas de advocacia administrativa e prevaricação.
Já a bancada do PSOL na Câmara protocolou uma representação no Tribunal de Contas da União (TCU) e no Ministério Público Federal (MPF) contra Jair Bolsonaro, Milton Ribeiro e os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura.
Ministro nega acusações
O ministro ainda não se pronunciou sobre a entrevista do prefeito Gilberto Braga, mas ontem negou as acusações de favorecimento na distribuição de recursos. O ministro, no entanto, não comentou o que quis dizer na gravação divulgada pela Folha sobre “atender primeiro os amigos do pastor Gilmar”, nem negou a veracidade do áudio. Confira a nota do ministro:
“Nota de Esclarecimento do Ministro da Educação
Diferentemente do que foi veiculado, a alocação de recursos federais ocorre seguindo a legislação orçamentária, bem como os critérios técnicos do Fundo Nacional do Desenvolvimento da Educação (FNDE).
Não há nenhuma possibilidade de o ministro determinar alocação de recursos para favorecer ou desfavorecer qualquer município ou estado.
Registro ainda que o Presidente da República não pediu atendimento preferencial a ninguém, solicitou apenas que pudesse receber todos que nos procurassem, inclusive as pessoas citadas na reportagem. Da mesma forma, recebo pleitos intermediados por parlamentares, governadores, prefeitos, universidades, associações públicas e privadas. Todos os pedidos são encaminhados para avaliação das respectivas áreas técnicas, de acordo com legislação e baseada nos princípios da legalidade e impessoalidade.
Desde fevereiro de 2021, foram atendidos in loco 1.837 municípios em todas as regiões do País, em reuniões eminentemente técnicas organizadas por parlamentares e gestores locais, registradas na agenda pública do Ministério, estabelecendo relação direta entre o MEC e os entes federados. Os atendimentos técnicos, conduzidos por servidores da autarquia, permitem esclarecimento dos procedimentos para planejamento e acesso aos recursos disponibilizados via FNDE, por meio do Plano de Ações Articuladas (PAR 4).
Seguindo os princípios de transparência, integridade e governança, obedecendo orientação dos Órgãos de Controle Federais (CGU e TCU), esta gestão apresentou o Painel de Investimentos, buscando o aperfeiçoamento da gestão dos recursos públicos, pois muitos prefeitos ainda desconhecem sua carteira de projetos e quais recursos estão disponíveis em suas contas. O Painel está disponível a qualquer cidadão que deseja acompanhar os recursos de seu município.
Independente de minha formação religiosa, que é de conhecimento de todos, reafirmo meu compromisso com a laicidade do Estado, compromisso esse firmado por ocasião do meu discurso de posse à frente do Ministério da Educação. Ressalto que não há qualquer hipótese e nenhuma previsão orçamentária que possibilite a alocação de recursos para igrejas de qualquer denominação religiosa.
Por fim, reafirmo o meu compromisso republicano de exercer as atribuições desta Pasta em prol do Interesse Público e do futuro da Educação do Brasil.
Milton Ribeiro”.