A cobrança associada à divulgação de indicadores provoca reclamações no magistério. Professora por formação e integrante do sindicato dos Servidores Municipais de Ponta Grossa, Katia Fioravante conta que a maioria dos colegas reclama de uma cobrança excessiva por resultados. "Sempre dizem que o nível exigido é muito acima do que realmente é trabalhado na escola", afirma.
De acordo com o professor Nélio Bizzo, algumas queixas são infundadas. "Os pedagogos geralmente são contrários a qualquer avaliação, até mesmo a provas comuns. Eu acho que eles exageram em seus argumentos, e acredito que um índice ruim é melhor do que um simples palpite. Temos muitos palpiteiros teorizando a educação no Brasil. É de se perguntar como é possível saber tanto sobre a educação brasileira se há tão poucos indicadores. É hora de as bolas de cristal cederem seus lugares a tabelas de desempenho", defende.
Uma professora que não quis ser identificada diz que a pressão que os docentes sofrem é muito grande. "Em muitas reuniões, falam que precisamos levantar os índices, mas não indicam como podemos fazer isso", diz.
Ela relata que uma equipe da secretaria, em tese, auxilia as escolas no processo de avaliação, mas esse grupo visitaria a escola apenas a cada quatro meses, sem tempo suficiente para conseguir realizar um trabalho significativo. A mesma professora afirma que a divulgação do primeiro Ideb, em 2006, foi muito mal-recebida pelos docentes. "No início foi uma hecatombe, mas agora já desmistificou. Ainda achamos que essas provas não observam a realidade da escola e cobram conteúdos diferentes daqueles que realmente são trabalhados em sala de aula", declara.
Cartilha
E quando a cobrança por resultados condiciona o ensino? É o que estaria acontecendo claramente em São Paulo, aponta a professora Maria Márcia Sigrist Malavasi, coordenadora de Pedagogia na Universidade de Campinas (Unicamp). Todo o conteúdo repassado aos alunos está em uma cartilha. E todos os anos é feita uma prova estadual, chamada Saresp, em que são cobrados os tópicos da cartilha. De acordo as notas dos alunos, o professor recebe (ou não) um bônus no salário. "O resultado disso é que dois meses antes do Saresp começa o Sarespinho, um simulado em que os professores treinam os alunos para a prova", relata.
Maria Márcia reforça que não há mal algum quando o professor faz testes com os alunos para explicar a dinâmica da prova, no sentido de mostrar como deve ser preenchido o gabarito ou como assinalar um X na questão correta. "Mas treinar o aluno em conteúdo é grave", salienta. Para ela, esse sistema não está preocupado com a formação do estudante e sim com um resultado, que será artificial. "Se ele foi condicionado para a prova não é possível apontar o que ele realmente sabe", destaca.
"É como ficar vários dias sem comer gordura somente antes de fazer um exame de colesterol. É uma atitude que falseia os dados", exemplifica o professor Carlos Alberto Faraco, da UFPR. Para ele, quando há uma preparação excessiva para uma prova, o sentido da avaliação é invertido e ela passa a ter um fim em si mesma. As mudanças anunciadas para este ano no Enem e a aceitação do resultado para ingresso em universidades podem tanto forçar melhorias no ensino médio como engessar a educação, se ela for voltada apenas para a prova. "Os cursinhos preparatórios para o vestibular podem virar cursinhos para o Enem", enfatiza a professora Helena Côrtes.