O Brasil produz muitos artigos acadêmicos, mas com impacto global pequeno. E o problema não é apenas falta de dinheiro, tendo em conta que, desde 2003, houve um considerável aumento do orçamento do Ministério da Educação e do GERD (Gross Domestic Expenditure on Research and Development), o que corresponde ao percentual do Produto Interno Bruto (PIB) em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D).
A conclusão é do Analista de Ciência e Tecnologia da Fundação Capes, Luis Fabiano Farias Borges, que participou de um seminário na Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB), na última terça-feira (28). O evento foi organizado pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da UnB para discutir o impacto da produção científica na área de ciências humanas.
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Dois indicadores foram utilizados para medir a relevância das pesquisas brasileiras: o Scimago Journal Ranking (SJR), que mede a influência dos periódicos pelas citações recebidas, entre outros parâmetros, comparando as revistas brasileiras com seus colegas de diferentes países; e o Leiden Ranking, que classifica as principais universidades do mundo em relação à sua produção científica.
O SJR parte da seguinte premissa: se uma pesquisa é eficiente e aporta alguma contribuição inédita para a sociedade, ela acaba sendo citada por outros pesquisadores da comunidade científica. Se um artigo discorre sobre assuntos já conhecidos ou que não entrem em diálogo com outros pesquisadores, e não traz novidades para melhorar a vida em sociedade, ela deveria ser repensada. O indicador utilizado para avaliar isso é o CPP, citações por artigo (citations per paper).
Tendo-se em conta o SJR de 2016, o Brasil ocupa a 14º posição em quantidade de artigos científicos publicados – 72 mil publicações. Em número de citações, porém, os números são baixos. Na área de Biologia e Agricultura, por exemplo, de 44 países, o Brasil ficou em 39º lugar entre 44 países. Em Matemática, 31º entre 42 países; em Física e Astronomia, 32º entre 51 países.
Nas áreas de humanas, comparado a países que publicaram ao menos 100 papers, o Brasil ficou em quantidade de citações em: 43º lugar em Sociologia, entre 46 países; 20º lugar em Linguística, entre 22 países; 37º lugar em História, entre 42 países; 42º lugar em Antropologia, entre 45 países; e 53º lugar em Educação, entre 54 países.
Essa distância entre a quantidade de produção e o baixo impacto das pesquisas não aparece nos países que produzem mais artigos científicos que o Brasil, à exceção de Rússia e Índia. Nações como Estados Unidos, China e Reino Unido, mostraram não só uma quantidade alta de publicações, como também uma CPP elevada.
“O Brasil tem que buscar não só aumentar sua produção quantitativa, mas principalmente ter maior CPP, o que, necessariamente, traz mais impacto na produção científica não só internamente como no mundo todo e existem estratégias para isso. O grande problema é você ter uma quantidade expressiva que acaba sendo desconsiderada pela comunidade”, afirmou Borges.
Os rankings internacionais têm mostrado a deficiência do Brasil em várias áreas do conhecimento, não apenas em humanidades. No Leiden Ranking de 2017, as universidades novamente aparecem entre as que mais publicam, mas ao avaliar o impacto, os números também são ruins.
A USP, no quadriênio de 2014-2017, é instituição brasileira que tem a maior quantidade de publicações indexadas no Web of Science, em 8º lugar mundial entre 963 instituições, mas está na colocação 775 em proporção de artigos entre os 10% mais citados no mundo, os chamados “%Top-10”.
Entre os possíveis caminhos para melhorar o baixo impacto do Brasil na produção científica, o analista da Capes apontou o aumento da colaboração internacional que eleva a visibilidade e a mudança de como se avalia no Brasil o que é uma pesquisa de qualidade.
Conhecimento visível
Se a questão é tornar a publicação mais conhecida, como aumentar a exposição nas redes de investigação? Para o professor da UnB e membro do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE/UnB), Remi Castioni, uma alternativa é o modelo de engajamento para potencializar a divulgação do material produzido, a partir da experiência da Universidade de Barcelona, na Espanha.
O roteiro baseia-se no uso intensivo das redes de conhecimento, como Google Scholar, ResearchGate e Linkedin, para alavancar a divulgação dos trabalhos com atividades periódicas que permitem, por exemplo, o encontro de possíveis parceiros de trabalho.
Ao analisar a relação ‘produção X impacto’ durante o seminário, o professor a classificou como “desigual” e afirmou que há uma série de ações a serem conduzidas pelo sistema universitário para reverter esse quadro. “A pesquisa em educação tem que servir para melhorar os problemas da área. Então, é necessário que aquilo que nós produzimos na universidade tenha conexão com os grandes problemas do dia a dia da sala de aula. A universidade, na realidade, está de costas para a educação básica”, disse.
Na opinião de Castioni, os problemas enfrentados diariamente nas milhares de escolas espalhadas pelo Brasil precisam ser objeto de reflexão na formação dos professores. E mais, é necessário que sejam cuidados por meio de ciência de dados. “Hoje temos uma infraestrutura de formação de profissionais na área de licenciatura notadamente no setor público. Isso demonstra que temos condições significativas de ajudar a melhorar os indicadores da educação básica”, finalizou.
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