Pergunte a qualquer professor e certamente ele poderá listar os estudantes que considerou difíceis, talvez até se lembre deles como ‘alunos-problema’. Ao sair da graduação e assumir sua própria turma é comum que um educador faça a constatação: uma classe formada por alunos perfeitos é uma ilusão. A sala de aula do imaginário ideal, onde todos ficam quietos na carteira durante a aula expositiva, conversam apenas nos momentos de intervalo ou do trabalho em grupo, acatam as ordens e entregam todas as tarefas bem-feitas, rapidamente desaparece no ar já nos primeiros dias de aula. Então cabe ao professor trabalhar as próprias expectativas e se reinventar para seguir seu foco: a aprendizagem de seus alunos, por mais complexos que possam parecer.
Essa experiência na docência é tão comum e pouco discutida, que acabou virando o tema da dissertação de mestrado da professora de Pedagogia Diana Tatit, mestre em Educação pela Universidade de São Paulo (USP) e que já se prepara para aprofundar o tema no doutorado. “Na minha primeira experiência como professora havia um aluno difícil, agressivo, na faixa dos 8 anos. Eu era inexperiente e tentava pensar em formas de lidar com ele. Depois que mudei para uma escola maior vi que não era um problema daquele menino, em particular. Mas um desafio comum de todos os educadores”, conta a pesquisadora.
É só entrar em uma sala de professores para se deparar com reclamações sobre alunos difíceis. Isso nem sempre reflete a dificuldade de um aluno em se comportar, mas da escola em entender que é preciso lidar com a heterogeneidade do público, segundo Diana. “A escola tem a expectativa de que vai receber o aluno ideal e tende a padronizar a todos que atende. O estudante que não corresponde a esse padrão gera desconforto e é chamado de ‘aluno que demanda’, mas poucos discutem o que exatamente ele demanda, que são estratégias diferentes. Mas os professores veem a dificuldade em lidar como falha do aluno, não do profissional, porque o problema muitas vezes está na formação que não mostra outras formas de intervenção além da tradicional que não serve mais”, explica.
De acordo com a psicóloga Elaine Henning, que tem recebido em consultório cada vez mais crianças e adolescentes encaminhados pelas escolas, só o atendimento psicoterapêutico não é suficiente. “Quando o professor é um problema, o aluno vai ser um problema. Isso ocorre quando o professor não tem criatividade ou desejo de fazer uma abordagem diferente para que aquele aluno vá para frente”, afirma.
A quantidade de alunos-problema passa de 10% nas salas de aula, de acordo com 60% dos professores ouvidos pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O dado é da Pesquisa Internacional sobre Ensino e Aprendizagem, que ouviu mais de 15 mil professores e diretores de 33 países. O Brasil foi o que mostrou maior índice de alunos tidos como problemas por seus professores. Já Dinamarca, Noruega e Japão são os que menos têm reclamações sobre o comportamento dos estudantes, todos de turmas do ensino fundamental e médio.
Pais precisam se antecipar e ajudar a escola
Um aluno que não obedece, reclama da aula, zomba do colega ou não acompanha o conteúdo é o que mais preocupa os professores. Na maior parte das vezes, mais do que um problema do estudante, essas atitudes sinalizam que a escola ou os pais estão falhando.
“Essas dificuldades em sala de aula mostram um conjunto de fatores problemáticos de fundo, ou com o professor, que não foi bem preparado para ensinar, ou com os pais que não dão conta de educar o filho”, diz a psicóloga Gabriele Ledereir, mestranda em Psicologia Clínica.
Segundo ela, por vezes a lacuna está em pais que não acompanham as crianças e deixam os filhos muito tempo sozinhas. “As crianças ficam horas na tevê ou no computador, sem um modelo ideal de comportamento”, analisa.
Às vezes, pais e professores querem resolver a situação com medicamentos, o que não é a melhor solução, porque não atinge o problema real . “Estudos internacionais denunciam a prática da escola de querer um diagnóstico rápido para medicar crianças e assim resolver os problemas escolares”, alerta a pedagoga Diana Tatit.
Para a professora de Psicologia da Unicentro Ana Priscila Batista, doutora em Educação, a abordagem personalizada é o melhor caminho para todos.
“É muito importante que professores fiquem atentos às particularidades de cada aluno, tentando compreender o que influencia esses comportamentos”, diz. “Quando há esforço e melhor interação entre o professor e o aluno, baseada na cordialidade, qualidade na comunicação, envolvimento, supervisão, monitoria, exigência de desempenho, dentre outras, todos os envolvidos saem ganhando”, afirma.