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Reunião do Conselho Nacional de Educação (CNE). Foto: Antonio Cruz | Agência Brasil.
Reunião do Conselho Nacional de Educação (CNE). Foto: Antonio Cruz | Agência Brasil.| Foto: Antonio Cruz/ Agência Brasil

Quem é responsável pela educação brasileira? A resposta mais óbvia é esta: o Ministério da Educação, em missão compartilhada com governos estaduais e prefeituras. Mas existe outro ator, menos conhecido, que exerce um papel central na formação de políticas públicas nessa área: o Conselho Nacional de Educação (CNE).

Composto por 24 pessoas, o colegiado foi estabelecido por lei em 1995, e sucedeu órgãos anteriores com nomes e objetivos semelhantes. As funções do CNE são “normativas, deliberativas e de assessoramento ao ministro”.  Na prática, as principais missões do conselho têm sido a elaboração do Plano Nacional de Educação (que define as metas para o setor) e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) – que estabelece o currículo mínimo obrigatório em cada série.

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O órgão esteve em evidência recentemente, durante a elaboração da BNCC do ensino fundamental, concluída em 2018. Na ocasião, houve uma controvérsia envolvendo a presença de termos como “identidade de gênero” no texto. Na redação final, após protestos de parlamentares e de entidades como a Associação Escola Sem Partido, a expressão acabou retirada. Mas, para alguns, a decisão foi insuficiente porque deixou a porta aberta para que estados e municípios tornem esse conteúdo obrigatório.

Também foi o CNE quem, em 2017, aprovou a norma obrigando as escolas a aceitarem o chamado “nome social” de estudantes que se identificam como transgêneros. O Ministério da Educação apenas referendou a medida.

A atuação do conselho nessas e em outras pautas motiva críticas de grupos conservadores, alguns dos quais acusam o CNE de agir sempre em favor de bandeiras da esquerda. Seria o Conselho Nacional de Educação uma espécie de soviete? A resposta mais simples é não.

O CNE é dividido em duas câmaras: a de Ensino Básico e a de Ensino Superior. As câmaras se reúnem uma vez por mês, e o Conselho como um todo tem uma reunião a cada dois meses. O órgão é formado por indicação do presidente da República, mas, por lei, pelo menos metade das vagas precisa ser preenchida após “consulta a entidades da sociedade civil” que tenham relação com a educação. O costume tem sido o de preencher todas as 24 vagas com nomes indicados por essas entidades.

Na última consulta, feita no ano passado, o governo considerou indicações feitas por 45 entidades – seis a mais do que na seleção anterior, ainda sob a gestão de Dilma Rousseff. Na lista de Temer havia um retrato plural da educação brasileira, incluindo representantes dos estudantes, das empresas do ramo educacional, de sindicatos de professores e, sobretudo, de organizações representativas de pesquisadores, como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a Academia Brasileira de Ciências e a Academia Nacional de Medicina. Diferentemente da gestão de Dilma, a lista também abarcou a Associação Brasileira de Instituições Educacionais Evangélicas e a Associação Nacional de Educação Católica do Brasil.

A maioria dos membros do órgão têm carreira acadêmica sólida, sem ligação com a militância partidária. É verdade que, nos anos da gestão petista, havia um peso maior da ideologia nas escolhas. Ao assumir o cargo, por exemplo, Michel Temer vetou quatro nomeações que tinham acabado de ser feitas por Dilma. Entre elas, a das sindicalistas Maria Izabel Azevedo Noronha e Lúcia Cavalli Neder, e a do professor aposentado Antonio Ibañez Ruiz, ligado ao PT. O emedebista manteve outros oito nomes, de caráter mais técnico. Felizmente, o CNE nunca se transformou em um mero espaço para loteamento partidário, como outras entidades do tipo.

Também não é verdade que o órgão seja formado predominantemente por estudiosos da Pedagogia e de outras áreas das Ciências Humanas. Há um número expressivo de integrantes com carreira nas ciências exatas. Dentre eles estão Francisco César de Sá Barreto, doutor em Física pela Universidade de Pittsburgh, Mozart Neves Ramos, Pós-Doutorado em Química pela Politécnica de Milão, Tania Leme de Almeida, doutora em Engenharia Civil-Hidráulica pela USP, Antonio de Araújo Freitas Junior, que tem pós-doutorado em Engenharia pela Universidade do Michigan, e Mauro Luiz Rebelo, pós-doutor em Matemática pela Universidade de Stanford.

Isso não quer dizer, entretanto, que o Conselho não tenha problemas.

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Um deles é a lentidão na tomada de decisões. A natureza colegiada do órgão, somada às múltiplas visões representadas, criam um ambiente onde os debates são protelados por meses ou anos devido à falta de consenso. O Plano Nacional de Educação (PNE) em vigor foi aprovado em 2014, com quatro anos de atraso. “Acredito que as decisões do CNE demoram mais do que o necessário, num país em que a educação está correndo atrás de um prejuízo de décadas e cada dia conta”, aponta Andrea Ramal, doutora em Educação Pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio.

Outro problema é o fato de o órgão ter influência demais para uma entidade que não é formada por voto popular. Embora não defenda o fim do CNE, o coordenador do Escola Sem Partido, Miguel Nagib, acredita que temas como a BNCC deveriam passar pelo crivo de um ente que tenha sido eleito pelo voto popular, como o Congresso. “É uma decisão muito importante para não ser tomada pelo próprio povo e não pelos seus representantes”, afirma.

A opinião de Jean Marie Lambert, professor aposentado da PUC Goiás e estudioso do tema, é semelhante.  Lambert argumenta que o Conselho frequentemente atua pautado por organismos estrangeiros, como o Unicef. “A BNCC jamais passaria pelo Congresso no formato que foi aprovado pelo Conselho. O CNE é um aparato administrativo, não de legisladores. Não se pode homologar tudo o que eles fazem”, afirma.

É provável, também, que uma eventual tendência à esquerda dentro do Conselho não seja fruto de uma estratégia do governo, mas apenas o resultado de uma tendência que surge ainda na academia, seja por causa da doutrinação, seja porque pessoas de esquerda eventualmente se sintam mais propensas a seguir carreira na área de Educação.

Miguel Nagib acredita nessa tese. “O establishment educacional no Brasil é de esquerda. Como os membros do Conselho são extraídos do sistema educacional como um tudo – são professores, educadores, é inevitável que eles tenham esse viés”, avalia. Militares e religiosos, que tendem a discordar de pautas tidas como mais à esquerda, não têm tido espaço no conselho – o que tende a mudar no novo governo.

O atual presidente do CNE, Luiz Roberto Curi, assegura que a formação atual do Conselho tem atuado em parceria com o MEC: “Há uma extensa pauta de colaboração entre CNE e MEC, especialmente referentes a temas como alfabetização, a implantação da BNCC, a avaliação e formação de professores”, diz.

A próxima mudança na composição do CNE acontecerá em 2020.

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