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Militância

Reitores indicados por Bolsonaro enfrentam resistência nas universidades

Alunos em "votação" pela destituição do reitor da UFFS, escolhido por Bolsonaro. (Foto: Reprodução / Facebook)

Pela primeira vez desde a promulgação das regras atuais para eleições de reitores nas universidades federais, há 23 anos, a presidência da república vem indicando para o cargo candidatos que não estão entre os mais votados pela comunidade acadêmica. Para cada um desses casos, a reação vem sendo bastante agressiva.

A escolha dos reitores segue as determinações da Lei 9.192, de 21 de dezembro de 1995: a comunidade acadêmica submete uma lista com três nomes, formada a partir da votação do colegiado eleitoral, composto por pelo menos 70% de professores. O presidente escolhe qualquer um dos três nomes.

Na prática, o que costuma acontecer, desde os anos 90, é que o colégio eleitoral simplesmente ratifica uma eleição interna, em que funcionários, professores e alunos participam com um terço cada – o que contraria a legislação. Por fim, a universidade envia a lista, pela ordem dos mais votados, e o presidente indica o primeiro nome. No governo Bolsonaro, não é mais assim. E a reação da militância tem sido bastante agressiva.

Santa Catarina

Na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), de Chapecó, a situação é tensa. A reitoria foi ocupada no dia 30 de agosto, depois da nomeação do reitor Marcelo Recktenvald, que ficou em terceiro colocado na votação interna da instituição, com 21,4% dos votos. Nesta segunda-feira, dia 30 de setembro, o Conselho Universitário votou a favor de um pedido de destituição do reitor, enviado para a presidência da República.

Na reunião do Conselho, a solicitação de destituição foi aprovada por 35 votos a 12. Na avaliação do reitor, não foi o suficiente para que o pedido seja encaminhado para Brasília. “Eram necessários 36 votos para a aprovação dessa matéria”, Marcelo Recktenvald afirmou, em uma entrevista coletiva concedida na tarde desta terça-feira, dia 1º. “O entendimento do Conselho, de que só deveriam ser computados os votos válidos, não tem amparo no regimento. Essa discussão está encerrada”.

Para o reitor, as discussões técnicas estão sendo tumultuadas por movimentações políticas avessas ao objetivo da universidade. “Não se pode fragilizar a imagem da universidade por conta de uma manifestação de cunho político. Muitas vezes os conselheiros se manifestam como sindicalistas. Precisamos que a universidade se pacifique para que possamos trabalhar”.

Os manifestantes e o conselho pedem a nomeação do primeiro colocado na consulta interna, Anderson André Genro Alves Ribeiro. O reitor nomeado entrou com um pedido de reintegração de posse da reitoria e conseguiu ocupar seu gabinete no dia 20 de setembro. Até então, precisou despachar a partir de um gabinete provisório dentro da Procuradoria Federal de Chapecó. Em mais de uma ocasião, se viu cercado por manifestantes e precisou de escolta policial para garantir sua integridade física.

Corredor polonês e Future-se

“A gente sabe qual é o movimento ideológico que está por trás da resistência. Nessa turma, ninguém solta a mão de ninguém”, afirma o reitor, em entrevista à Gazeta do Povo. “A primeira dificuldade foi respirar aqui dentro, eu não conseguia ocupar meu espaço, o gabinete estava tomado. Também passei pelo meio de um corredor polonês, enquanto ainda havia ocupação. Passei no meio, sem confrontar ninguém. Depois consegui entrar, mas já lidando com um pedido de destituição”.

Segundo o reitor nomeado, a resistência vem de uma minoria.

“Hoje as maiores resistências estão dentro do Conselho Universitário e por estudantes influenciados por alguns professores, sendo que muitos deles perderam cargos. Eu não fiz nenhum tipo de negociata de cargos com ninguém, tenho mais tranquilidade na consciência para indicar as pessoas mais adequadas para o cargo”.

Marcelo Recktenvald diz que seu maior objetivo é assegurar a rotina da instituição. “Tudo o que eu desejo é que nós executemos o orçamento, nomeemos as equipes, consigamos dar prosseguimento para as ações de ensino, pesquisa e extensão, que é o objetivo de existir de uma universidade”. Para ele, parte da modernização da universidade vai passar pela adesão ao programa Future-se, do governo federal. “O Future-se tem o potencial de fortalecer a pesquisa no Brasil, num nível muito maior do que já se observou até hoje no país”.

Ceará

Na Universidade Federal do Ceará (UFC), a tensão inicial está controlada. Ali, o governo federal indicou o nome do diretor da Faculdade de Direito, José Cândido Albuquerque. Na votação popular, ele recebeu 610 dos 11.997 votos. O mais votado, o até então vice-reitor Custódio de Almeida, recebeu 7.772 votos. A nomeação de José Cândido Albuquerque provocou uma reação imediata: militantes invadiram os jardins da reitoria pedindo a indicação de Custódio de Almeida. O reitor indicado pelo governo tomou posse no dia 20 de agosto. E precisou mover uma ação de reintegração de posse, dias depois, para conseguir entrar no edifício.

“A comunidade recebeu minha indicação com muita naturalidade”, afirma o reitor. “Apenas um pequeno grupo, vinculado a partidos políticos, é que criou algumas dificuldades. O grupo que fez oposição era pequeno. Hoje essa questão está superada”. José Cândido Albuquerque diz que pretende manter o diálogo com os opositores.

“Estamos buscando o melhor caminho para uma nova UFC. Queremos avançar na pesquisa, na inovação, no empreendedorismo. Temos que reformular a universidade, temos uma estrutura administrativa da década de 70, que não sofreu o impacto da digitalização”.

Rio de Janeiro

Além de Minas Gerais e Ceará, o governo federal não aceitou a lista tríplice oferecida pela Universidade Federal Grande Dourados (UFGD) e nomeou uma reitora interina. Também escolheu candidatos menos votados na consulta interna em outras três instituições, as federais do Triângulo Mineiro (UFTM). do Recôncavo da Bahia (UFRB) e dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM).

Houve também o caso da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio), que apresentou ao governo federal, em primeiro lugar da lista tríplice, o nome do vice-reitor Ricardo Silva Cardoso, que não havia participado da eleições internas da instituição.

Já no Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio de Janeiro (CEFET-RJ), as manifestações de alunos aconteceram a partir do dia 28 de agosto, quando o Ministério da Educação decidiu por nomear um interventor, o doutor em física Maurício Aires Vieira, ex-vice-reitor da Universidade Federal do Pampa (Unipampa).

Ele assumiu de forma temporária enquanto o ministério investiga denúncias de que o diretor-geral eleito, Maurício Saldanha Motta, teria utilizado a estrutura da instituição para pedir votos para a comunidade acadêmica. A denúncia partiu de um dos candidatos derrotados, Sérgio Roberto de Araújo.

“A denúncia está sendo investigada por uma sindicância interna do Ministério da Educação, que tem 60 dias para apurar. Eu apenas estou aqui em caráter pró-tempore, até que se defina se o diretor eleito retoma o cargo ou se uma nova eleição deverá ser realizada”, afirma Maurício Aires Vieira. “Um pequeno grupo de alunos me acusou de intervenção. Mas é uma minoria. O Conselho Universitário me recebeu bem.”

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