Após concluir sua formação em Física, o professor Ricardo Ribeiro do Amaral teve um “choque de realidade” durante as primeiras experiências dentro da sala de aula: a falta de uma metodologia atraente desempenhada pelos educadores refletia diretamente no desempenho e na interação dos estudantes com o conteúdo.
Durante os três primeiros anos como professor do Colégio de Aplicação da Universidade Federal de Pernambuco, Ricardo procurou “métodos alternativos” para atrair os alunos entre o 9° ano do Ensino Fundamental e o 2° ano do Ensino Médio.
“Em 2005 encontrei o RPG. Vi sites que demonstravam o jogo aplicado na Geografia e na História e achei a proposta interessante. Percebi que havia potencial para o ensino de Física e comecei a me aprofundar mais no assunto”, afirma.
A sigla vem do inglês e significa “Role-Playing Game”, um jogo em que os participantes assumem papéis de personagens históricos ou fictícios, criando narrativas e enredos de forma coletiva, guiados por um “mestre” que lê as instruções e funções de cada um dos jogadores.
O papel de “mestre” é desempenhado por Ricardo, que há treze anos utiliza entre 4 e 6 horas-aula durante a semana para vivenciar a experiência com os estudantes.
“Eles são divididos em grupos e cada equipe representa um personagem na narrativa. À medida que a narrativa vai sendo desenvolvida, vou inserindo alguns desafios em que os estudantes precisem refletir e interagir com conhecimentos científicos para solucioná-los no decorrer do jogo”, conta.
No jogo “Colonizadores do Brasil”, Ricardo simula situações em que seus personagens estão perdidos em uma floresta, exatamente como os primeiros colonizadores das terras brasileiras. “Posso indagá-los como poderiam se orientar na mata, ou quem sabe como construir uma bússola rudimentar”, explica.
“É tudo muito cooperativo, eles precisam trabalhar em equipe. Então saber ouvir e saber falar, a cooperação e a ética são bem trabalhadas. O RPG também fortalece o espírito de grupo, uma vez que todos ganham ou todos perdem”, completa.
Em relação ao aprendizado de Física, o professor afirma que a atividade possibilita apresentar situações em que os alunos podem perceber a aplicação dos conceitos físicos no dia a dia dos seus personagens.
Além disso, surge a motivação para o estudo da Física, uma vez que saber ou não como o fenômeno estudado se desenvolve vai interferirá no sucesso ou não da equipe frente aos objetivos desejados na aventura. De modo geral, a relação entre professor e aluno também melhora após a conclusão do jogo.
O professor de Sociologia Rafael Carneiro Vasquez também é adepto da prática dentro da sala de aula. Autor de uma tese sobre as potencialidades do game na educação escolar, ele tem utilizado as partidas de RPG tanto em instituições públicas quanto privadas, com atividades extracurriculares e optativas.
“Na quinta série, estudamos o Império Romano e, antes das aulas expositivas sobre o assunto, usei uma narrativa falando de Roma e de sua sociedade; os alunos desempenharam papéis de personagens da cidade italiana e assim que chegamos ao livro ele já tinham realizado alguma reflexão e um olhar sobre o conteúdo”, explica Rafael.
“O RPG também é útil no sentido de trabalhar com os alunos a convivência, a comunicação e o diálogo, fazendo com que eles vejam a escola não apenas como um lugar de cobrança e de estresse, mas também um espaço de interação e lazer”, acrescenta.
Pesquisadores da Universidade de Adger, na Noruega, também acreditam na funcionalidade educacional do RPG. Segundo pesquisa da instituição, o jogo se mostrou “altamente motivacional” para que os jovens estudantes aplicassem na escola os conhecimentos adquiridos a partir do jogo.
O levantamento reuniu oitenta e três alunos das classes do 9° ano do Ensino Fundamental de uma escola pública norueguesa. Esses estudantes foram divididos em três grupos, sendo dois deles expostos às atividades e o outro apenas aos métodos tradicionais de ensino.
O “mestre” da atividade norueguesa pediu a cada estudante que desenvolvesse um personagem que, inicialmente, não possuísse nenhuma habilidade ou força, mas a partir de conquistas acadêmicas em disciplinas como História e Matemática, os alunos poderiam fazer com que seus personagens ficassem mais habilidosos, realizando tarefas gradualmente mais difíceis.
Segundo Ruen Andersen, responsável pela pesquisa, o estudo comprovou que “o uso de jogos de papel educativos aumenta a atitude e o uso de colaboração na escola”, melhorando a absorção do conteúdo e facilitando a convivência entre alunos e professores.
E o pesquisador ainda complementa: o terceiro grupo estudado, que ficou de fora das atividades, “ficou curioso sobre as práticas” e pediu para que seus professores também implantassem esse método dentro de sala.