Quando a artesã e professora Laís Ferelli da Cruz ouviu o filho de 14 anos e um amigo dele rindo no banco de trás do carro com um livro aberto nas mãos, passou a prestar atenção no que os garotos estavam conversando. "No momento em que um deles falou que ia levar um martelo para a escola, eu questionei do que se tratava", conta Laís. Os estudantes liam uma obra que ensinava todas as "brincadeiras" que podem ser feitas na escola, trazendo lista de apelidos para colocar nos colegas e dicas para sacanear professores e diretores. Revoltada, Laís devolveu o exemplar para a livraria e fez uma reclamação ao Ministério da Educação (MEC) e à editora responsável pelo material. "É um livro que faz apologia ao crime, ensinado a montar bombas para colocar na sala de aula ou na cadeira da professora e a passar trotes no 190 da polícia", exemplifica.Autor do livro em questão, Como se tornar o pior aluno da escola, o repórter do programa CQC (Custe o Que Custar), da emissora Band, Danilo Gentili, diz que se trata simplesmente de um material de humor. "Meu objetivo é vender livro. Então trabalhei e escrevi esse. Se o objetivo dos pais e da escola é que seus alunos não sejam expulsos e tenham comportamento exemplar, eles que trabalhem pra isso", diz. Depois de receber reclamações sobre a obra, o Ministério Público obrigou a editora a colocar um selo na capa, dizendo que se tratava de uma leitura inadequada para menores de 18 anos. Para o autor, isso só ajudou no marketing da obra.
Conteúdos inapropriados enchem prateleiras em livrarias e bancas de revistas, e são encontrados com facilidade por qualquer um na internet. Por isso especialistas aconselham os pais a estarem atentos ao que o filho lê e a conversarem a respeito dos interesses do adolescente. "Eles devem conversar sobre a leitura, e não mostrar preconceitos. São oportunidades para discutir questões de valor e para compartilhar as próprias experiências", afirma o psicólogo Rubens Marcondes Weber.
O fato de o jovem estar se interessando pela leitura deve ser considerado positivo, avalia a pedagoga Elisa Dalla Bona, professora de Pedagogia da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Se a revista ou o livro trouxerem conteúdos considerados inadequados, é fundamental conversar a respeito. "Se um adolescente é proibido pelos pais de ler algum livro, vai acabar lendo escondido. A proibição é o pior caminho. Em vez de se indignar, é melhor conversar e tentar entender o motivo de o filho ter se interessado por aquela leitura. Os livros são ótimos para falar de assuntos que as famílias têm dificuldade de abordar, como o racismo e o homossexualismo", diz.
A psicóloga e doutora em Educação Helga Loos lembra que não é possível manter os filhos o tempo todo afastados de tudo o que se considera nocivo. "Não podemos mantê-los em redomas", afirma. Em relação ao livro que "ensina" alunos a se tornarem os piores na escola, Helga dá um conselho: "Podemos levar os adolescentes a encarar obras como esta de forma crítica, procurando descobrir o que faz com que a criança ou o jovem venha a apreciar ou reproduzir coisas que são, em princípio, execráveis", diz.
A figura do valentão que intimida os colegas, porém, não é o único problema que precisa da atenção dos adultos. "O aluno que faz mais barulho e apronta merece ser observado e até punido, mas o que está oprimido, quietinho, precisa ser apoiado e ouvido. Muitas vezes aquele adolescente que está em silêncio e reprimido pelo grupo é o que vai ter a resposta mais violenta em algum momento", diz Weber.
* Colaborou Anna Carolina Azevedo, especial para a Gazeta do Povo.