O príncipe saudita, Mohammed bin Salman, fez uma visita bem divulgada ao Instituto de Tecnologia de Massachusetts e Harvard em março de 2018, promovendo parcerias multimilionárias entre o governo saudita e essas universidades de elite.
Viajando na comitiva do príncipe herdeiro estava Maher Abdulaziz Mutreb, um oficial diplomático que parecia estar agindo como guarda-costas. Seis meses depois, Mutreb coordenaria o assassinato do cidadão saudita e colunista do Washington Post Jamal Khashoggi no consulado saudita em Istambul.
As autoridades sauditas queriam levar Khashoggi de volta à Arábia Saudita. No entanto, Mutreb disse à sua equipe que, se Khashoggi resistir, “vamos matá-lo aqui e nos livrar do corpo”, de acordo com registros obtidos pela inteligência turca. Em seguida, cerca de 15 agentes sauditas executaram Khashoggi e desmembraram seu cadáver com uma serra circular.
Mutreb “se envolveu com membros da comunidade do MIT” durante a visita do príncipe herdeiro, disse o reitor Richard Lester ao New York Times, em junho de 2019. Lester disse que foi “uma visita indesejável e perturbadora em nosso espaço, embora evidente apenas em retrospectiva”.
Este é apenas um exemplo das situações comprometedoras em que as universidades americanas se encontram quando fazem parceria com nações estrangeiras. Embora os governos de aliados como Inglaterra, Alemanha e Itália doem diretamente para faculdades dos EUA, cerca de um terço dos fundos estrangeiros declarados vêm de nações que abusam dos direitos humanos em grande escala.
US$ 6,6 bilhões
Após uma série de investigações do Departamento de Educação dos EUA, várias universidades relataram ter recebido US$ 6,6 bilhões nos últimos anos de países como Catar, China, Arábia Saudita e Emirados Árabes. O Departamento de Educação disse que “acredita que este valor é uma fração do total verdadeiro” e que esses fundos podem ser considerados um “risco para a segurança nacional”.
As universidades que recebem doações de governos estrangeiros estão entre as instituições educacionais de elite dos EUA e incluem Harvard, Stanford, Northwestern, Texas A&M, Cornell e MIT, entre outras. De acordo com os registros do Departamento de Educação, revisados pelo Projeto Clarion, entre 2012 e 2019 Harvard divulgou doações de US$ 79.272.834 da China, US$ 7.077.754 do Catar e US$ 30.637.202 da Arábia Saudita. O MIT divulgou US$ 83.358.344 em doações da Rússia, US$ 31.472.548 da China e US$ 83.100.000 da Arábia Saudita.
Mas essas quantias representam apenas a ponta do iceberg das contribuições reais porque as universidades tentaram ocultar uma quantidade substancial dessas doações, como disse Ryan Mauro, diretor da Rede de Inteligência Clarion, em uma entrevista ao National Review. Por exemplo, a Cornell University divulgou as doações somente depois que o Departamento de Educação começou uma investigação sobre os problemas, e a universidade disse não saber por que os fundos não foram informados.
“Em muitos desses casos, especialmente quando se trata da China, eles simplesmente não querem que as informações sejam divulgadas. Eles querem obter o dinheiro da China comunista, criar um programa que aumente suas mensalidades, fazer com que os alunos se inscrevam e, então, agem”, disse Mauro. “É, realmente, muito dinheiro de graça e é difícil para uma empresa recusar um negócio como esse.”
Os disfarces e objetivos das transferências
Muito do financiamento de atores estrangeiros pode ser impossível de rastrear se as universidades não reportarem as doações. As regras atuais exigem que as universidades informem o Departamento de Educação sobre qualquer doação superior a US$ 250.000 de um governo estrangeiro, mas os países podem contornar essa regra encaminhando dinheiro para instituições de caridade ou organizações sem fins lucrativos, essencialmente disfarçando os fundos como uma doação privada. As universidades não precisam divulgar doações de governos estrangeiros de menos de US$ 250.000.
“O que é realmente perturbador para mim é um pai de um aluno ou um aluno se inscrever em uma aula, [onde] eles não são notificados sobre o produto que estão comprando”, disse Mauro. “Se você comprar um suplemento em uma loja, existem rótulos de advertência. Não há rótulos de advertência quando você se inscreve em um curso no campus da faculdade sobre quem está financiando aquele professor e como isso pode estar influenciando a educação que você está comprando”.
Os propósitos dessas doações podem variar de projeto para projeto. No caso da China, os objetivos são espionagem, roubo de propriedade intelectual e propaganda ideológica para estudantes de famílias de elite americanas. As tentativas mais conhecidas da China de projetar propaganda nos campi dos EUA são os Institutos Confúcio, que aparentemente buscam divulgar o conhecimento da língua e da cultura chinesas, mas que o FBI identificou como "soft power".
Além do dinheiro arrecadado pelas universidades, muitos professores nunca divulgam o financiamento chinês que recebem diretamente. Mais recentemente, Song Guo Zheng, 58, ex-professor de medicina interna da Ohio State University, se declarou culpado de ocultar financiamento do governo chinês em pedidos de bolsas de pesquisa do governo dos EUA. Zheng usou “US $ 4,1 milhões em doações do National Institutes of Health para desenvolver a expertise chinesa nas áreas de reumatologia e imunologia”, de acordo com um comunicado à imprensa do Departamento de Justiça. Publicamente, o estado de Ohio divulgou US$ 2.396.592 em doações do governo chinês para a universidade de 2012 a 2019.
Os estados árabes têm motivações ligeiramente diferentes, visando construir parcerias estratégicas com os EUA, em parte por meio de educação e pesquisa. Isso é especialmente verdadeiro para o Catar, que esconde sua estratégia de financiar o Hamas e o Hezbollah, e aliar-se ao Irã, por meio de parceria com os militares dos EUA, principalmente na operação da base aérea de Al Udeid. O Catar também tentou aprofundar seu relacionamento com os EUA estabelecendo a “Education City” na capital Doha, que abriga os campi de seis importantes universidades americanas, entre elas a Northwestern e a Georgetown.
O Catar deu à Northwestern University pelo menos US$ 343 milhões de 2012 a 2019. Em 2013, a filial da Northwestern no Catar assinou um memorando de entendimento com a Al Jazeera, porta-voz do governo do Catar para a mídia. O memorando declara explicitamente que a Northwestern no Catar “conduzirá consultas com a liderança da Al Jazeera com base em seus interesses de pesquisa do corpo docente e experiência na indústria de mídia americana, à medida que a rede de notícias avança com seu planejamento para a Al Jazeera America”. A universidade atualmente apregoa a oportunidade para os alunos publicarem artigos na própria Al Jazeera.
É estranho, para dizer o mínimo, que uma universidade americana esteja anunciando que a produção jornalística de seus alunos está no meio de comunicação favorito dos governantes do Catar. Uma carta de setembro do Departamento de Justiça referiu-se à Al Jazeera Plus, uma divisão de mídia digital da empresa, como "um agente de publicidade nos Estados Unidos em nome do governo do Catar".
Perturbadoramente, o relatório do Departamento de Educação descobriu também que a Fundação Catar - uma instituição de caridade ligada ao estado - restringiu a liberdade de um professor americano de conduzir pesquisas com outros estados árabes do Golfo. O professor anônimo pediu esclarecimentos sobre os protocolos que regem a capacidade de sua universidade de firmar contratos de pesquisa nuclear com governos estrangeiros. A própria universidade planejava dar treinamento nuclear aos Emirados Árabes Unidos e à Arábia Saudita; no entanto, o professor foi orientado a consultar a Fundação Catar antes de embarcar em acordos de pesquisa com esses países. (Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, além de Bahrein e Egito, instituíram um bloqueio ao Catar em 2017 após uma série de incidentes diplomáticos, então parece que o professor anônimo e sua universidade correram o risco de se meter naquele conflito).
Embora os EUA tenham laços oficiais ainda mais estreitos com a Arábia Saudita e os Emirados Árabes, esses países também tentam projetar influência por meio de iniciativas educacionais. A Universidade de Nova York tem seu próprio campus em Abu Dhabi, cujo "currículo básico" visa "nutrir a consciência cívica fundamental para a cidadania global e liderança, desenvolvendo suas habilidades para lidar com as complexas dimensões conceituais e éticas das questões globais." Entre essas “questões globais” pode estar que o próprio campus foi construído por trabalhadores migrantes do sul da Ásia, alguns dos quais ganhavam cerca de US$ 400 por mês enquanto viviam em dormitórios compartilhados com dez ou mais pessoas por quarto. A NYU informou ter recebido US$ 80.739.559 dos EUA, de 2012 a 2019.
Tentativas de controle
Houve várias tentativas no Congresso de aumentar a transparência da universidade em relação às fontes de financiamento estrangeiro. Em junho deste ano, um grupo bipartidário de senadores apresentou o Safeguarding American Innovation Act (SAIT), que reduz o limite para relatar doações estrangeiras para universidades de US$ 250.000 para US$ 50.000 e fortalece os requisitos de visto para impedir o acesso de estrangeiros a tecnologias estratégicas. A legislação foi escrita pelos senadores Rob Portman (R., Ohio) e Tom Carper (D., Del.), e recebeu mais de uma dúzia de copatrocinadores.
O SAIT ainda não foi aprovado pelo Congresso, no entanto, porque o projeto foi adiado pela discussão sobre o pacote de auxílios em decorrência do coronavírus, e o Senado e a Câmara estão atualmente em um impasse nas negociações sobre essa iniciativa. Grupos que representam universidades americanas também fizeram lobby contra a nova legislação, dizendo que as restrições a estudantes estrangeiros poderiam impedir a inovação em pesquisa.
“Algumas de nossas universidades não são apenas ingênuas”, disse o senador Portman em junho. Quando se trata de fontes estrangeiras de financiamento, “algumas vezes, elas querem simplesmente olhar para o outro lado”.
© 2020 National Review. Publicado com permissão. Original em inglês.
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