Até a divulgação do decreto 9725/2019 de 12 de março, o governo federal gerenciava aproximadamente 100 mil cargos de comissão e em funções de confiança. Esse número vai cair consideravelmente nos próximos meses, na medida em que for colocado em prática o texto que determina o enxugamento de 21 mil postos. Deste total, 13.700 cargos estão em universidades federais. As instituições agora se preparam para fazer esses cortes. Mas quais cargos foram cortados, e que economia eles representam?
O enxugamento da folha salarial é pequeno, na verdade. O fim dos 21 mil postos vai representar uma economia de R$ 195 milhões, o equivalente a 11% do orçamento anual da Universidade de Brasília, que é da ordem de R$ 1,75 bilhão – o orçamento total do Ministério da Educação (MEC) está na casa dos R$ 100 bilhões. Em relação ao orçamento total da União para 2019, de R$ 3,38 trilhões, será uma economia de apenas 0,00006%.
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O valor exato da economia com o corte dos 13.700 postos das universidades públicas ainda não foi calculado, mas o MEC informa que, dos postos a serem cortados, 2 mil ainda não haviam sido ocupados, porque estavam previstos para cinco universidades federais que ainda estão em fase de instalação. Os demais funcionam como gratificações para profissionais que assumem postos de chefia e coordenação. Os valores de cada posto variavam de R$ 61,67 a R$ 270,83 mensais.
Momento de expectativa
Procuradas, cinco universidades federais informaram que estão aguardando orientação de Brasília. “A administração superior da Universidade Federal do Ceará não poderá se pronunciar no momento sobre o assunto, pois ainda está avaliando a situação decorrente do referido decreto presidencial”, informa a assessoria de imprensa da instituição. “A Universidade Federal do Paraná informa que, segundo a Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas, não foi afetada pelo Decreto Presidencial nº 9.725 até o momento”.
A Universidade de Brasília e a Universidade Federal da Bahia prestaram informação parecida: “As universidades ainda aguardam a comunicação oficial, do Ministério da Educação e do Ministério da Economia, das alterações específicas no quadro de cada instituição, para avaliar possíveis impactos”, respondeu a UFBA. Já a Universidade Federal do Rio Grande do Sul informa que, por enquanto, não foi afetada: “Na universidade, os cargos em comissão e funções de confiança estão ocupados nos termos da legislação, bem como, mais especificamente, todos os coordenadores de cursos de graduação e de pós-graduação têm designação formal estabelecida por gratificação específica. Assim, neste momento, o decreto não atinge o funcionamento da universidade”.
Maior impacto vão sentir as federais em instalação. A Universidade Federal de Jataí, cuja criação foi definida por lei de março de 2018, como um desmembramento da Universidade Federal de Goiás, informa que o corte atinge 49 das 266 funções gratificadas previstas para a universidade. Em nota, a assessoria de imprensa critica o corte: “Atualmente administração da chamada Regional Jataí da UFG conta com um total de 70 funções gratificadas e 2 cargos de direção, sendo que a maior parte das funções gratificadas atende às coordenações de cursos de graduação e pós-graduação”.
A nota prossegue: “Nesse sentido, a estrutura atual não atende as necessidades para a criação da reitoria e o corte dos cargos previstos na lei de criação (e ainda não liberados) compromete a implantação da instituição, pois as funções gratificadas são uma necessidade para amparar os servidores que assumem cargos de chefia”.
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Ajustes
Já a Universidade Federal de Rondonópolis, que será resultado do desmembramento da Universidade Federal de Mato Grosso, perdeu 57 funções, das 257 previstas na lei de março de 2018 que determinava a instalação da instituição. A assessoria de imprensa informa que agora será necessário realizar ajustes. A comissão de implantação da UFR realizou a primeira reunião de trabalho nesta semana no campus de Cuiabá. A proposta é discutir uma estrutura administrativa que atenda as demandas específicas da nova universidade.”
A Universidade Federal do Agreste de Pernambuco, resultado de uma divisão da Universidade Federal Rural de Pernambuco, vai sofrer 107 cortes de futuras funções, o que representa 26% do total. “Existe um impacto grande na estrutura da nova universidade, no entanto nada que impeça seu funcionamento”, informa o professor Airon Melo, diretor geral e acadêmico da então Unidade Acadêmica de Garanhuns (UAG), unidade da qual se originou a Universidade Federal do Agreste de Pernambuco. “Porém existem outros pontos que deixam dúvidas”, diz ele, indicando que existem pontos no decreto que podem também afetar a nova instituição.
Mas o que significam esses cortes em funções gratificadas? Se a economia vai ser baixa, qual a motivação para eliminar esses postos? “Essas gratificações são pagas principalmente para coordenadores de curso, como eu. O profissional recebe um pequeno acréscimo provisório, não incorporado ao salário, simplesmente porque trabalha a mais”, afirma Fernando Cássio, professor de políticas educacionais da Universidade Federal do ABC, no campus de Santo André, na Grande São Paulo. “Nas universidades, os professores, fazem ensino, pesquisa e extensão. Quando assumem, além disso, atividades administrativas, eles recebem uma gratificação”.
Indicações políticas
O trabalho, informa o professor, consiste em lidar com burocracia interna da instituição. “Um coordenador faz planejamento, resolve problema de matrícula, monitora projetos pedagógicos. Não está claro como as instituições vão lidar com o fim desses cargos gratificados, se esses postos serão ocupados por voluntários que não vão mais receber por isso. O fato é que é um trabalho que vai precisar ser feito”.
Em nota, o presidente do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES), Antonio Gonçalves, se posicionou contra o corte. “A avaliação é de que, sem dúvida, isso é um processo de ataque à universidade e de desmonte do Estado. O que está por trás disso é um ataque aos serviços e aos servidores públicos e, em especial à universidade. Está claro que o foco prioritário deste governo é desmontar as universidades públicas”.
Para Ebnézer Nogueira, professor da Universidade de Brasília e ex-presidente da associação de docentes da instituição, a redução de postos representa uma economia pequena, de fato, mas pode evitar o uso político dos postos. “Muitas vezes, essas vagas eram utilizadas para favorecer professores que queriam mudar de cidade, e para isso precisavam ser nomeados para postos em universidades de outros lugares. Esses cargos não existiam há dez anos e não vão fazer nenhuma falta”.
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