| Foto: Ilustração: Gilberto Yamamoto/Gazeta do Povo

Entrevista

João Carlos Gomes, reitor da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) e presidente da Associação Brasileiras de Reitores das Universidades Estaduais e Municipais Brasileiras (Abruem).

O que é e até onde vai a autonomia universitária no Brasil?

O melhor conceito e mais simples de definir autonomia é a capacidade que a instituição tem de fazer opções e tomar decisões. Para a universidade, a autonomia acadêmica, orçamentária, financeira e administrativa é fundamental. Esta última, é dada por intermédio da destinação de recursos atrelados a um porcentual de impostos da receita do Estado. No entanto, ela não deve ser confundida com soberania. As universidades se submetem às leis estaduais e federais e aos órgãos de controle, como o TCE e o TCU.

Por que esses aspectos da autonomia são importantes à universidade e à comunidade acadêmica?

Com a autonomia, aumenta a corresponsabilidade de todos os segmentos da universidade. O Conselho Universitário decide onde deve gastar os recursos de acordo com as prioridades estabelecidas em um plano de desenvolvimento institucional. A contratação de professores, o investimento em infraestrutura , os ajustes no custeio, os programas especiais -- como a internacionalização -- devem prever flexibilização para que a universidade possa mudar o foco da aplicação de recursos durante o ano em função do andamento e da prioridade dos projetos, como acontece nas melhores, mais qualificadas e produtivas universidades em todo o mundo.

São comuns conflitos entre interesses do governo e a autonomia da universidade ?Infelizmente, há uma cultura entre os governantes brasileiros, de forma geral, que os leva a entender que os recursos financeiros aplicadas nas universidades são gastos, e não investimentos. No entanto, se fizermos uma análise de todos os países que tiveram crescimento econômico e social nas ultimas décadas, notaremos que houve a participação efetiva das universidades. O que os políticos precisam compreender é que as nossas universidades públicas devem ser tratadas como política de Estado e não como política de governo.

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Embora sejam vinculadas à estrutura do governo, é garantido por lei às universidades a necessária autonomia para atingir a excelência nos três pilares que regem seu funcionamento – ensino, pesquisa e extensão. Sem a devida independência, as instituições de ensino superior ficariam reféns das mudanças políticas trazidas pelas eleições a cada quatro anos. Casos recentes, no entanto, vêm levantando questionamentos sobre o respeito a esse princípio no país.

Desde que o governo federal, em julho, deu sinais de que pretendia mudar o currículo de Medicina, estudantes e entidades profissionais têm ido às ruas denunciar o que consideram uma imposição. O acréscimo de dois anos na formação acadêmica e a obrigatoriedade dos recém-formados de trabalharem no Sistema Único de Saúde (SUS) foram rechaçados por representantes da categoria e passou-se a exigir do governo mais diálogo com a comunidade acadêmica antes de qualquer mudança.

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Outra situação de interferência externa na grade curricular ocorreu na área do Direito. No fim do mês passado, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) propôs ao Ministério da Educação a inclusão do estágio de seis meses em comunidades carentes, como favelas, dentro da grade do curso. Em participações pelo site do Vida na Universidade, alunos chamaram a proposta de "modismo" e reclamaram do que consideram uma intromissão da OAB.

Para a diretora do Setor de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Claudete Reggiani, as recentes proposta do governo para os cursos de Medicina são até interessantes, mas foram muito mal apresentadas. "Eles poderiam ter perguntado se vale a pena aumentar para oito anos a formação. Não o fizeram e agora todos dizem que não vale." Ela acrescenta ainda que o modo como a proposta chegou ao conhecimento da categoria gerou muita informação equivocada.

Já o pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), professor Waldemiro Gremski, afirma que os exemplos ilustram a distância entre o conceito de autonomia expressa pela Constituição e a realidade. Ele classifica o caso da interferência nos cursos de Medicina como uma agressão. "Todas essas mudanças que querem aprovar deviam ser previamente discutidas com as universidades e passado por conselhos", diz.

Numa comparação com o que ocorre no exterior, Gremski lamenta que o Brasil esteja tão distante do que ocorre, por exemplo, nos Estados Unidos. "Eles têm o melhor sistema universitário do mundo e o controle do Estado sobre as universidades é mínimo. As instituições têm muito mais liberdade para criar", diz.

No PR, caso Unespar gerou discórdia entre universidades e governo,

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Em maio, a escolha do governo por Paranavaí, no Noroeste do estado, para receber a sede da Universidade Estadual do Paraná (Unespar) deu início a uma série de manifestações por parte de professores, alunos e funcionários da instituição. Eles alegam que o governo feriu o princípio da autonomia ao ignorar a decisão do Conselho Universitário, tomada em 2011, de estabelecer a sede em Curitiba.

Apesar das passeatas no centro da capital e dos protestos diante da Assembleia Legislativa, os deputados estaduais aprovaram em 4 de junho a instalação da Reitoria em Paranavaí. Na ocasião das passeatas, críticos à decisão alegaram tratar-se de uma escolha meramente política, que não levou em conta argumentos de ordem prática, como a facilidade de acesso e a localização geográfica das oito faculdades que compõem a Unespar.

Contudo, entre os argumentos do governo para justificar a decisão, foi citada a oportunidade de desenvolver a região Noroeste do estado, além das vantagens oferecidas pela prefeitura de Paranavaí, que ofereceu infraestrutura e manutenção para que a sede fosse estabelecida lá. (JDL)