Impasse
Parte do varejo se opõe ao trabalho por medo de prejudicar importações
A explicação sobre o porquê de as diretrizes brasileiras para o tamanho de roupas estarem demorando tanto tempo para sair do papel é complexa e reflete as mudanças no cenário do vestuário. Há tempos o varejo aproveita o câmbio favorável para importar cada vez mais peças e insumos. Estimativa de 2012 da Associação Brasileira de Vestuário (Abravest) representante da indústria apontou que eram 20% das compras das lojas eram de artigos importados.
"[As normas] criariam barreira técnica para importação. Por isso o varejo não quer. Hoje a alfândega não barra peças porque não tem o que conferir", diz Roberto Chadad, presidente da entidade. Segundo ele, a pressão tem de partir também de consumidores.
"Não é prioridade"
A indústria reconhece que não tem priorizado a discussão. "O assunto é importante, mas não é prioridade", diz Silvio Napoli, diretor da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), citando temas considerados mais urgentes, como a reivindicação de regime tributário diferenciado.
A Abit defende que as normas devem continuar facultativas, porque uma fiscalização seria "inconstitucional". Para Napoli, a indústria tem formas menos polêmicas de frear importações, como buscar limites para a toxicidade de produtos estrangeiros. Extraoficialmente, o ramo teme as obrigações extras que regras poderiam trazer.
A associação que representa o varejo (Abvtex) informou que apoia e participa da criação das normas, mas não opinou sobre o impacto para as importações. Segundo a ABNT, parte do varejo em especial, grandes magazines se preocupa com o assunto porque quer evitar as perdas que os provadores ocasionam e para investir no e-commerce.
Entrevista
"O consumidor acha que é assim mesmo, mas não é"
O produtor e cineasta paranaense Paulo Pélico, 58 anos, queria transformar em documentário o "jeitinho brasileiro". Acabou pesquisando sobre como a população lida com a falta de medidas de referência nacionais em diversas indústrias e viu que só isso daria um filme. Lançado no início de 2013, Fora de Figurino mostra como a falta de medida se reflete na sociedade da classe média que se acostumou a reformar roupas caras aos pedreiros que usam bonés para encaixar capacetes de segurança feitos para alemães.
Como o filme passou a tratar da falta de medidas?
O ponto de partida era abordar o jeitinho brasileiro e eu precisava de uma história que exemplificasse isso. Então encontrei esse "bate-cabeça": faz 20 anos que o Brasil tenta achar uma tabela de medidas de referência e tropeça nas dificuldades de um país que não pensa nada em longo prazo.
Alguém ganha com isso?
Todo mundo perde, só o governo ganha menos trabalho. Em 2010, acompanhamos uma aprovação de R$ 5 milhões pelo governo federal para o levantamento antropométrico [das medidas dos corpos dos brasileiros]. Mas as reuniões sobre o assunto eram com representantes de 20 setores, todos pensando apenas nos seus problemas. Não houve consenso e a verba foi transferida para outro ministério. Foram dois anos de discussão perdidos.
Quem poderia resolver essa questão?
Nos falta cultura de exigir. O consumidor acha que é assim mesmo e não é: na Europa e nos EUA, as lojas atendem a todos os clientes. Mas o protagonismo deveria ser do poder público, porque é um problema para a balança comercial do setor de vestuário.
O voluntário responde um questionário e entra em uma câmara escura para ter o contorno corporal mapeado. Em 60 segundos, o body scanner registra, em centímetros, cem medidas do corpo ali presente. Esse ritual, que precisa ser feito com 200 moradores de Curitiba até hoje, vai compor um estudo que tentará ajudar a reduzir um problema discutido há 20 anos no país: a falta de referências de tamanho para o consumidor que compra roupas. A ação, do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) do Rio de Janeiro, vem sendo feito em diversas regiões do país desde 2011.
Utilidade
A ideia é que o levantamento com 10 mil voluntários, que deve ficar pronto em dezembro, seja usado por diversas indústrias, da automobilística à moveleira. Mas é no setor de vestuário que pode haver mais avanços. O estudo do Senai será um primeiro passo para que sejam criadas normas de referência que substituam as tabelas estrangeiras usadas pela indústria há décadas.
A falta de referência prejudica o consumidor, que até hoje não consegue ter certeza de que veste 38 ou 42, e tem de usar jeans com medidas americanas e lingeries feitas para francesas. O problema já rendeu até filme.
"É um trabalho de formiguinha. Estamos partindo do zero", resume Flávio Sabrá, gerente de inovação do Centro de Tecnologia da Indústria Química e Têxtil do Senai-RJ. Nesses anos, os pesquisadores enfrentaram obstáculos que atrasaram a conclusão de equipamentos parados em alfândegas estaduais a falta de voluntários. Nos seis dias em Curitiba, por exemplo, a estimativa é de que pouco mais da metade da meta de medições seja cumprida. Em Maringá, próximo alvo dos pesquisadores, o objetivo é medir pelo menos 140 pessoas.
Adesão
A Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) lidera a criação de normas técnicas, levando o tema à indústria e ao varejo. A adesão, no entanto, é voluntária. Os setores hoje precisam seguir outras duas regras: a que trata de etiquetas e a portaria 166, de 2011, sobre informações essenciais que devem ser prestadas ao consumidor, ambas do Inmetro. O órgão fiscalizador, porém, não comenta o debate.
A ABNT já lançou normas para os vestuários masculino e infantil (a CB17), que se baseou em parte no levantamento do Senai. A para bebês e pré-adolescentes é de 2009; a para homens, de 2013. Em meados de 2015 devem ser lançadas normas para corpos femininos e plus size (acima do tamanho 52, em média).
Voluntários
Hoje é o último dia para se voluntariar para o estudo do Senai-RJ em Curitiba. É preciso comparecer entre 13h30 e 21 horas na sala 100 do Campus da Indústria (na Fiep, no bairro Jardim Botânico). O levantamento dura 15 minutos e exige o uso de roupa especial descartável. Em Maringá, o estudo ocorrerá entre os dias 26 e 29.
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