Inventores, naturalmente, querem proteger suas criações, mas o melhor caminho para fazer isso não é tão evidente. A publicação de uma pesquisa em periódicos científicos garante reconhecimento ao autor, e, sob risco de vexame acadêmico, dificilmente outro pesquisador se atreveria a copiar a ideia sem citar a referência. Por outro lado, empresas não seguem a lógica da academia. Se uma pesquisa publicada for potencialmente lucrativa, e não tiver patente, nada a impede de aproveitá-la em seus próprios negócios, e até patenteá-la como sendo sua.
Na prática, não há impedimentos para publicar e patentear, mas nesse tema a ordem das escolhas afeta profundamente o resultado. Além disso, os números mostram que a opção mais frequente não é a de fazer ambos.
Segundo dados da editora de revistas científicas internacionais Elsevier, enquanto o volume de publicações de pesquisadores brasileiros girava em torno de 49,6 mil artigos em 2011, o número de pedidos de patente válidos em todo o mundo é bem mais modesto. Dados de 2012 da Organização Mundial de Propriedade Intelectual mostram que naquele ano o país fez 6,6 mil pedidos. Comparando rankings, o Brasil é o 13º em publicações científicas, mas cai para 28º o quando se trata de pedidos de patente.
Crítica
Na opinião do reitor da PUCPR, Waldemiro Gremski, a preferência pela publicação, sem patenteamento, é contraproducente para o pesquisador e para o país. "O cientista comete dois erros quando faz ciência com recursos públicos e não pede registro de patente. O primeiro é o de tirar do Brasil uma descoberta que provavelmente será patenteada por algum laboratório estrangeiro, e o segundo é abrir mão de recursos que certamente financiariam a continuidade da pesquisa por anos".
Uma história comumente lembrada em ambientes acadêmicos para destacar a importância da patente é a origem do fármaco Captopril, usado para tratar hipertensão. A substância é produzida a partir do veneno de Jararaca e diversas revistas médicas mencionam o professor da USP Sérgio Henrique Ferreira como inventor. Na década de 60, no entanto, ele publicou a íntegra de seu estudo em revistas internacionais, sem se preocupar com o potencial econômico de sua criação. Poucos anos depois, um laboratório norte-americano patenteou a técnica para obter o princípio ativo e passou a vender o remédio em todo o mundo com um nome comercial.
Tempo de espera por patentes assusta inventores
O professor Alexandre Pohl, do departamento de Eletrônica da UTFPR, é, desde 2008, detentor de dois pedidos de patente que estão em análise no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi). Embora seja defensor do patenteamento, ele compreende porque muitos colegas optam apenas pela publicação. Falta de conhecimento sobre o processo e demora na concessão da patente seriam as principais justificativas para a preferência.
Segundo Pohl, enquanto as etapas para a produção de artigos científicos são dominadas por praticamente todos os pesquisadores, redigir um pedido de patente não é algo que se aprenda nos cursos universitários. "Quando você vai fazer um depósito de patente, por questões jurídicas tem de lidar com uma série de termos que não são usuais para alguém da academia, e a elaboração desse texto é decisiva para que seu pedido seja acatado ou rejeitado", diz. A insegurança para cumprir as exigências faz muitos desistirem na etapa inicial.
No entanto, mesmo aqueles que dominam as técnicas para escrever um pedido reclamam da demora na análise. Segundo Pohl, em países desenvolvidos o processo termina em cerca de dois anos. No Brasil, o prazo pode chegar a oito anos. Para inovações tecnológicas, por exemplo, esse tempo faz com que a invenção corra o risco de se tornar obsoleta, antes mesmo de a patente sair. Toda essa espera antes de publicar é um sacrifício impensável para muitos inventores.
Meio termo
O professor Fernando Deschamps, do mestrado em Engenharia da Produção da PUCPR, encontrou uma forma de publicar antes do patenteamento, sem correr o risco de ter a ideia copiada. Em 2009 ele fez um depósito de patente referente a um dispositivo que coleta dados em máquinas de chão de fábrica, como tornos e fresas.
A invenção é o próprio dispositivo, mas no texto publicado meses antes do pedido de patente ele falou das melhorias de desempenho proporcionadas pelo dispositivo, sem mencionar detalhes da arquitetura do aparelho. "Percebemos que podíamos gerar um produto a partir do dispositivo, então resolvemos dar encaminhamento ao depósito de patente e não revelamos sua configuração quando publicamos."
Deschamps ainda não sabe se obterá ou não a patente pedida, mas a estratégia usada deixou evidente a autoria do dispositivo perante a comunidade acadêmica, ao mesmo tempo em que manteve segura a informação essencial para garantir direitos sobre o invento. (JDL)