Proposta é falta do que fazer, diz filóloga
A polêmica sobre a reforma ortográfica em análise no Senado não deverá ser pequena. Para a doutora em Filologia Românica e professora do Programa de Pós-Graduação em Linguística Aplicada da Unisinos, Dorotea Kersch, a proposta é um "absurdo, a legítima falta de ter o que fazer".
"Não existe língua fácil ou língua difícil. Cada língua tem sua história e suas especificidades. Não é simplificando a ortografia que resolvemos os graves problemas de leitura e escrita de nossos alunos, que são escancarados a cada avaliação sistemática. Quem sabe os senadores se preocupam com coisas que realmente impactam o ensino, como salário de professores, ou uma política de ensino de língua adequada às diferentes realidades do Brasil", rebate.
Muitos obstáculos
Conforme o senador Cyro Miranda,presidente da comissão que estuda a reforma ortográfica, o objetivo é ter a versão final do projeto pronta até maio de 2015 para que seja colocada em votação e possa entrar em vigor no início de 2016. Até lá (e se chegar lá), o processo é longo, e não são poucos os obstáculos.
No caminho, ainda estão a resistência que mudanças radicais provocam, a morosidade com que o assunto é levado no Brasil (o último acordo ortográfico proposto foi discutido na década 1970, assinado em 1990 e aplicado a partir de 2008) e a necessidade de se convencer todos os países a aprovarem a nova forma de se escrever português.
"Mudansa"
Conheça as novas regras que devem ser propostas pela Comissão de Educação do Senado:
Fim do H no início da palavra:
Homem - Omem
Hotel - Otel
Hoje - Oje
Humor - Umor
G fica som de "gue":
Guerra - Gerra
Guitarra - Gitarra
CH substituído por X:
Chá - Xá
Flecha - Flexa
S com som de Z vira Z:
Asa - Aza
Brasília - Brazília
Base - Baze
X com som de Z vira Z:
Exame - Ezame
Executar - Ezecutar
C antes de E e I vira S:
Censura - Sensura
Cedo - Sedo
Cidade - Sidade
SS vira S:
Gesso - Geso
Fossa - Fosa
SC antes de E e I vira S:
Nascer - Naser
XC com som de S vira S:
Exceto - Eseto
Excêntrico - Esêntrico
Mal deu tempo para entender o que o último acordo ortográfico fez com o acento de voo, com o hífen de antissocial e com o trema de cinquenta, e uma nova proposta, ainda mais radical, já está em elaboração pela Comissão de Educação do Senado. A partir de 2016, se entrar em vigor o projeto que pretende fasilitar o ensino e a aprendizajem da língua portugeza, vosê poderá ser obrigado a escrever asim.
As (mais recentes) novas regras para o português devem ser apresentadas pelo grupo técnico da Comissão de Educação até 12 de setembro. Elas podem alterar as mudanças que tinham obrigatoriedade prevista para o fim de 2012, foram prorrogadas por quatro anos, e que, até agora, quase ninguém aprendeu direito. Além de reduzir o número de regras e exceções na língua, o objetivo da comissão é expandir o debate com a comunidade, especialistas e países que falam o português.
"O projeto estava entrando em vigor sem ter sido discutido no Brasil. A Academia Brasileira de Letras (ABL) estava fazendo uma reforma sozinha, de um jeito muito conservador. Então pedimos o adiamento do prazo de obrigatoriedade e montamos uma comissão para propor novas regras, simplificar a ortografia e, principalmente, padronizar a gramática com outros países", afirma o presidente da comissão, senador Cyro Miranda (PSDB-GO).
Como senador não palpita sobre a presença ou a ausência de "cê-cedilha, hagá ou ceagá", dois especialistas foram chamados para coordenar o grupo técnico: os professores de português Pasquale Cipro Neto e Ernani Pimentel, responsável pelo site simplificandoaortografia.com que fomenta um movimento para "substituir o decorar pelo entender" e reúne pitacos de quem se interessar pelo assunto.
"Por enquanto estamos juntando sugestões. Pretendemos redigir o conjunto de regras e apresentar entre 10 e 12 de setembro, no Simpósio Internacional Linguístico-Ortográfico da Língua Portuguesa, em Brasília. Esse projeto será levado ao Senado, que irá realizar uma audiência pública para ouvir todos que quiserem contribuir", diz Pimentel.
Acordo de 2008 já havia feito alterações
O último acordo ortográfico da língua portuguesa, que entrou em vigor em 2008, acabou com o trema, alterou 0,5% das palavras utilizadas no Brasil (1,6% da grafia usada em Portugal) e incorporou as letras "k", "w" e "y" ao alfabeto.
O acento agudo desapareceu nos ditongos abertos "ei" e "oi" em palavras como "idéia" e jibóia" e nas palavras paroxítonas com "i" e "u" tônicos, quando precedidos de ditongo em palavras como "feiúra".
Sem acento
O acento circunflexo deixou de ser usado em palavras com duplo "o", como "enjôo", e na conjugação verbal com duplo "e", como vêem e lêem.
O temido hífen desapareceu em palavras em que o segundo elemento comece com "r" e "s", como "anti-rábico" e "anti-semita" cuja grafia passou a ser "antirrábico" e "antissemita". O hífen foi mantido quando o prefixo termina em "r", como "inter-racial".
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